COTAS

“Nós não temos nada contra esta questão das cotas, mas acho que elas devem ser destinadas para o estudante comprovadamente carente. Por um lado, a escola - seja ela particular ou pública - deve ter o seu próprio sistema de avaliação para escolher os alunos. Por outro, o estudante não deve chegar à universidade apenas por ser negro", afirma José Walter Pereira dos Santos, secretário executivo da ANUP (Associação Nacional das Universidades Particulares).

Nem apenas por ser branco. Nem apenas por ser rico. Escolhi a citação acima justamente por ser a fala de um responsável por órgão relacionado ao ensino particular. Há alguns anos, um professor, proprietário de poderosa instituição de ensino privado, em Aracaju, fez uma declaração não menos que cruel, desumana e nada educada.

Disse o circunspecto senhor ao repórter de um canal de televisão, a respeito da questão da inadimplência: COLOCA FILHOS NA ESCOLA PARTICULAR QUEM PODE. PARA OS POBRES HÁ A ESCOLA PÚBLICA.

Esqueceu-se o arremedo de educador das magras épocas em Sergipe, quando a escola particular começava a engatinhar, funcionando em residências adaptadas para a função escolar. As salas de aula eram os quartos do imóvel. Recebia auxílio do Estado e do Município, livros, professores e mais e mais. Coisas de pobres! Eu tenho memória. Nesse período, pobres, ricos e milionários estudavam no Atheneu. Mas só estudava lá quem demonstrasse por a mais b ser competente. Jovens reprovados no exame de seleção do mais tradicional colégio de Sergipe tinham por destino os estabelecimentos de ensino particular, pois esses faziam questão de não fazer questão de exames. A cor da pele era a cor do dinheiro. Havia até apelidos para as escolas, como por exemplo, “Papai pagou, filhinho passou”.

Pessoal esquecido esse, até me faz novamente lembrar da cacetada formidável que deu Lula nos espanhóis quando cerceavam recentemente a entrada de brasileiros na Espanha, dizendo algo assim: VOCÊS ESTÃO ESQUECIDOS DOS SEUS POBRES QUE RECEBEMOS AQUI?

Depois, passando e passando os anos, o que fui observando foi uma orquestrada mudança de atitude, uma espécie de conchavo macabro que minou pela base a escola pública sucateando-a. Sim, culpa e culpa, toda a culpa do Estado, do Poder. Quem tem dinheiro e é rico é o povo, injustamente chamado de pobre e de carente. Nós somos ricos, podres de ricos. A diferença é que nossa riqueza é alvo da cobiça e da força manipuladora das mentes e das almas. E nem venha me dizer q a gente não sabe votar, não sabe isto e não sabe aquilo.

Sabemos e não podemos porque sobre nós se abate o Mal instituído e sacramentado. E é usando a palavra e engendrando artimanhas que isto se consegue. Como um lobo consegue a sua presa, como uma raposa também.

Agora, quando a ciência diz e prova que não há raça, este conceito ganha vida e cor em cotas raciais. O conceito de cota é bom, mas esta especificação não o é. Não estou sendo incoerente, ainda não terminei a minha argumentação, portanto não conclua precipitadamente.

Naquele interregno, quando a destruição da escola pública se fazia, começou também a se “entender” que colocar uma criança em uma escola da rede privada mudaria sua personalidade e, que se essa criança nunca aprendia na pública, por milagre aprenderia na outra.

Ora, quem entende o mínimo de educação, de psicologia, de psicopedagogia, de didática e de pedagogia, sabe que tal milagre é impossível. Por tal lógica ilógica alunos matriculados em escolas particulares seriam cem por cento, perfeitos. Quem é tão idiota a ponto de nisto acreditar? Seres humanos são imperfeitos, independentemente de onde estejam alistados ou matriculados.

Criou-se um modelo de vestibular, manietado, viciado, cuja chave do tesouro se encontrava em uma rede de ensino que não era a pública. E o que se vê são crianças sendo domesticadas, mentalmente estragadas, participando de sabadinhos e sabadões, testinhos e testões, falsinhos e falsões. Ainda bem que Jean Piaget está morto e não acompanha essa miséria e nem tem que saber que famílias acreditam e incentivam seus filhos a tal situação. Pobres jovens sofrendo noites de insônia e terror, roendo unhas, tomando tranquilizantes, trêmulos, neurotizados. Contanto que sejam todos doutores, mesmo que fiquem também desempregados.

Fico intrigada com o pouco aproveitamento das ideias de Freinet, Anísio Teixeira, Paulo Freire, Henri Wallon, Nóvoa, Edgar Morin, Bernard Chalot e tantos importantes pensadores da Educação.

Enquanto isto acontece na zona nobre da sociedade, do lado pobre, seja qual for a cor da pele, os jovens não entram de forma alguma nas Universidades Federais. E colocam sempre a culpa, principalmente nos professores.

Alguns desses jovens desassistidos procuram a escola paga e ficam inadimplentes e sofrem e choram. E os abençoados fazendo Medicina e Direito, preferencialmente, assistidos pelo dinheiro público. Isto é, o pobre paga para quem tem dinheiro de sobra estudar. É justo?

Tem rico farto e rico mão de figa. E como “Deus não dá em ninguém de cacete”, algo novo está acontecendo. Coisas deste velho mundo. Agora, os pais abastados começam a falar mal da instituição superior pública porque tem greve, porque isto e porque aquilo. Por outro lado, os jovens bonitos e endinheirados querem estudar em faculdades elegantes, cheias de opções de lazer, quase como hotéis de luxo. E fazem beicinho para os não muito confortáveis prédios públicos. Tudo isto é bom. Do caos nascerá a ordem, como já se quis demonstrar.

Dessa forma, e muito superficialmente, chego aqui dizendo que deixem a universidade pública para o pobre, seja ele da cor que for. A escola é dele. É do outro também, enfim todos pagam impostos. Mas a preferência é de quem está em condições sociais precárias, conforme disse Walter no início de sua declaração. Os outros podem pagar duas vezes. Só para deixar claro, se Walter é a favor ou contra, tanto faz.

REFERÊNCIA

http://www.universia.com.br/gestor/materia.jsp?materia=3939