DE COMUNISTA AO STATU QUO

Não desprezarei nem destratarei quem é comunista, só desejo dizer que a essa altura não mais me cabe sê-lo. Fui, e considero muito positiva minha atitude em afirmá-lo, e em afirmá-lo à época em seu nome e valor. Muito positivo tê-lo estudado e, em fase intermediária, tentado deslocar seu nome para um significado mais amplo, longe daquilo para que os seus atuais clérigos e inimigos tentam levá-lo em emboscada e enclausurá-lo. Porque em parte me parece que essa possível prepotência é algo necessariamente anexo à manifestação do pensamento, não deixo de afirmar sem mais ressalvas que essa prisão entrou em contradição com o avanço de meu pensamento... Digo mais: que em nome de um processo mais eficaz de filosofia, não abandono um sistema ao mesmo tempo que me surge uma idéia que lhe é contrária. Seguro a tempestade do cérebro e o ponho a investigar a possibilidade de coerência desse sistema. A partir de um momento isso é insustentável. As contradições se tornam muito fortes, e o apego pelo sistema dá lugar a uma vontade de estar acima, munido de uma idéia verdadeira. Em mim, uma volta desse ciclo se completou em relação ao comunismo. Habita-me agora um pavor por nomes. Se bem que é tentador ao invés de explanar o que pensa resumi-lo em uma palavra simples. É mesmo a palavra a inimiga da boa filosofia. Ora a rima é vista como solução, ora as palavras se tornam origem do que não existe... O amor pelo mote, pelas palavras e pelo sistema: isso incorre em equívocos quando o assunto é pensar e trocar idéias. Um, diante da contradição inerente a seu sistema acumulativo, redefine tacitamente a noção de indivíduo, que passa a ser a família ao longo dos séculos. Outro, tenta justificar sacrifícios em nome do benefício do Estado, da Nação, como se não fosse uma mera abstração, uma mera palavra. Ambos em detrimento do que é propriamente um indivíduo humano, consumidor e criador, e para cuja felicidade – eu tenho quase certeza – toda ideologia democrática deve se dirigir. Maneiras pensar sempre carregam sujeitos, e posso ser seus advogados agora. Dizendo que não é verdade que por trás de uma ideologia sempre há um interesse conspiratório. E sim que os autores são afetados por emoções, como todos; combinações do amor às palavras, do apego ao sistema e da vontade de ter uma idéia verdadeira. Assim eu, os liberais e os comunistas.

Andrié Silva
Enviado por Andrié Silva em 25/04/2010
Código do texto: T2219573