Oposição e Situação

Os extremistas não admitem oposição. Talvez seja este o motivo pelo qual os regimes totalitários estejam sempre fadados ao fracasso. Ao não permitir a oposição, ao sufocar as vozes daqueles que tenham algum reparo a apresentar, perdem a grande oportunidade de analisar a sua conduta e os próprios critérios, fazer a autocrítica necessária para quem compreende que pode estar errado e necessite de sugestões de outras pessoas que possam vislumbrar equívocos que eles não vêem.

Assim é como os opositores são afastados e silenciados pelos extremistas, e foge-se do exercício democrático pelo temor à crítica e a rigidez mental.

Esta tendência nefasta existe em todas as partes: governos, empresas e instituições de toda a espécie onde dirigentes inflexíveis em suas posturas, ao calar a oposição, calam a sua reflexão e anulam a possibilidade de mudança de rumo.

A oposição é, muitas vezes, cruel em seus critérios, rígida e preconceituosa; mas é ela que permite a livre expressão do pensamento.

O inflexível vê no opositor um inimigo e trata-o como tal. Este preconceito tem separado os homens em grupos, associações e partidos que se enfrentam com violência ao invés de somar esforços, buscar soluções para os problemas que se sucedem.

O opositor mantém-nos despertos e nos faz pensar na possibilidade de estarmos errados. Esse reconhecimento é o primeiro passo para a evolução pessoal em qualquer âmbito das atividades humanas. O opositor nos faz pensar, o que é muito bom para a nossa inteligência que respira nesta atividade.

A mudança de governo é sempre dolorosa. Os dirigentes apegam-se ao cargo e ao poder transitórios, acomodam-se ao fascínio da posição, agarrando-se a ela como o náufrago ao salva-vidas. Assim é como a política passou a ser a arte de chegar ao poder e permanecer nele indefinidamente, vitaliciamente. A ambição, que tristemente norteia a vida da maior parte das pessoas, está sempre a apontar para a riqueza e o poder.

Observando quem assume o poder, o espetáculo não é menos triste. Quem chega julga-se muito melhor que os que o precederam. Sua “personalidade” interrompe os projetos que vinham caminhando para iniciar uma nova fase com outros planos que sua inteligência formulará.

Nos dois casos, a raiz da questão é a mesma: a pessoa é governada pela personalidade, a máscara interior que quer sempre diminuir os outros para projetar a sua figura.

A solução da questão resume-se na necessidade da mudança do governo interior e pessoal. Será necessário destronar o tirano das aparências e do engano, o ser pessoal, vaidoso e desumano que cada um carrega dentro de si; ele deve ser substituído pelo espiritual e humano que jaz adormecido no interior de cada um. É uma questão de disposição e desprendimento, caso a máscara não haja aderido definitivamente à epiderme psicológica.

A “personalidade” é o fruto do cultivo das aparências do ser humano; a somatória dos dotes com os quais pretende apresentar-se às outras pessoas alçando-se a uma fictícia estatura pessoal inflada pela vaidade e ambição.

Esta máscara - com a qual se pretende atravessar a vida aparentando ser o que não se é - deve ser arrancada, ainda que dolorosamente, para ascender aos caminhos do aperfeiçoamento individual.

A personalidade deve ser substituída pela individualidade, o cultivo de qualidades pessoais . A tarefa não é simples, pois requer valentia e desprendimento; morte e renascimento. Esta é a maior das artes que possa um ser humano realizar: a criação de um novo ser surgido das cinzas do velho homem pessoal, vaidoso e egoísta, como o pássaro mitológico e imortal.

A personalidade é uma frágil bengala com a qual se pretende atravessar a vida fingindo uma suficiência que o observador mais perspicaz identifica como falsa; a máscara da dissimulação e das aparências, da falsa humildade e da mansidão, que revela muitas vezes a fera escondida sob as vestes de um cordeiro.

A lógica deste mito é perfeitamente compreensível nos seres para os quais nada existe além da realidade do mundo físico.

Para os que sentem a necessidade de transcender esse limitado estado de compreensão, visão restrita do entendimento, o mito passa a deixar de ter sentido, dando lugar à aspiração de substituir a personalidade pela individualidade, pelo cultivo das qualidades superiores do ser humano.

A renovação com continuidade, no que a Natureza é pródiga em exemplos, deverá ser para o homem a possibilidade de realização consciente através do conhecimento de cada passo dado naquela direção.

Nagib Anderáos Neto