MACABRA ARMA ASSASSINA

Não obstante as muitas campanhas educativas do trânsito, sinto-me compelida a emprestar minha cota-participação na busca de maior entendimento, maior conscientização sobre o trânsito, tanto dos condutores dessa arma assassina chamada veículo, quanto dos seus usuários e pedestres que por ela passam.

As estatísticas apontam crescente índice de atropelamentos, colisões, abalroamentos e choques com objetos fixos (árvore, postes etc) no trânsito das grandes cidades, resultando muitas vítimas fatais e ou de lesões corporais, até de natureza gravíssima, com sequelas irreversíveis.

A falta de respeito às normas de trânsito, distribuídas por todas as malhas viárias, é uma constante para a ocorrência dos muitos acidentes. Nem mesmo o slogan: “Perca um minuto na vida, mas não perca a vida num minuto” é capaz de levar ao grande contingente armado a consciência de que a sua arma (o carro) é por demais perigosa e sem complacência pode matá-lo.

Tendo trabalhado, em cadeira de rodas, numa delegacia que apura as responsabilidades penais no trânsito, representava um paradoxo para a maioria que perguntava sempre: — foi acidente?

Com essa experiência, tenho a dizer que o trânsito tanto mata como causa deficiências permanentes mais do que todos os revólveres dos bandidos, todas as doenças e calamidades públicas juntos. Atribuo como causa principal a falta de cultura popular sobre essa macabra arma assassina chamada veículo.

Se todos a entendessem como tal, acredito que o ser humano seria mais preservado em sua integridade física, evitando vidas de tantas batalhas sob o jugo de deficiências irreversíveis ou a dolorosa partida prematura de entes queridos, deixando outros à mercê da própria sorte, aumentando os problemas sociais.

O brasileiro, geralmente, quer auferir vantagem em tudo. É um marco do seu estilo de vida. Especificamente no trânsito, se não tem guarda, avança o sinal, entra na contramão, faz conversões proibidas, exercitando à vontade a imprudência, cujo ônus chega, por vezes, a ser pago com a própria vida e a de outrem. Daí a sábia frase: “É preciso dirigir para si e para os outros”. É a chamada direção defensiva, tecnicamente falando.

Estarrece-me ver e sentir que o crime do automóvel está sendo compartilhado de pai para filho menor de idade. Faltam consciência, valores éticos e probidade. Nem sequer as normas fundamentais de conduta axiológica estão sendo repassadas aos próprios filhos que, à direção do carro, brincam com vidas, sentimentos, vendo em cada pedestre uma baliza para o aprendizado; em cada veículo, um escudo para pancadas, deixando as marcas sangrentas pelas rodovias, ruas, vielas e praças, fulcrados sempre no desrespeito às normas de trânsito, placas, dísticos e semáforos. E, ainda, sob a guarda corajosa do pátrio poder. Os famigerados rachas, os cavalos-de-pau,largamente divulgado pela mídia, deveriam ser severamente apenados. Abomino tal conduta e a classifico de crime doloso: tentativa de homicídio. Risco assumido.

As leis existem para serem respeitadas. Somos uma Nação organizada, tutelada. Até as normas consuetudinárias dentro da relação familiar deveriam merecer respeito. Por isso os pais jamais podem abdicar da missão educadora, respaldando-se sempre no exemplo, com a execução e a mostra do certo, pois as palavras comovem e passam, enquanto os exemplos se arrastam, permanecem, erigindo ou destruindo.

Quantas vidas são ceifadas, e quantas outras são condenadas a verdadeiros martírios: vegetando, arrastando-se em cadeiras de rodas, muletas ou tateando em trevas pela perda traumatológica dos olhos em sinistros de trânsito. É um verdadeiro colapso na trajetória da vida humana.

Tudo isso é o retrato fiel da ineficácia educativa, legada por ação ou omissão nos lares, na comunidade e na esfera governamental, pois educar é transmitir o gosto pela vida; é tentar descobrir os valores positivos e exteriorizá-los para uma vida feliz.

Vivemos numa sociedade rica de meios, mas pobre de vida. É preciso doar-se! O homem moderno, nessa corrida pelo TER, não aprendeu a viver, a amar transcendentalmente pelo menos aos que o cercam. Ele não sabe viver a experiência de ser ferido.

E é por isso que presenciamos uma avalanche de concutores loucos no trânsito a exigirem respeito às suas barbaridades e transgressões, blasfemando palavrões e fazendo gestos obscenos. Não devemos responder a tais impropérios. É bom que sejamos diferentes! Isso nos devolve o sentimento de dignidade, além de estarmos plantando uma fagulha de amor que, por certo, multiplicar-se-á.

Costumo dizer que “errados princípios, dificultosos fins”. Por isso ao possuidor da arma assassina tenho a dizer o seguinte: ame-se em primeiro lugar! Respeite a sua vida e a vida do seu próximo! Previna-se! Jamais dirija embriagado! Seja honesto consigo mesmo, respeitando a sinalização, as normas de trânsito, mesmo sem a presença do guarda. Cuide do seu carro, pois ele poderá ser a própria arma que matará você.

Genaura Tormin - escritora, autora dos livros Pássaro Sem Asas, Apenas Uma Flor, Nesgas de Saudade e Borboleteando,

é ex-delegada de Trânsito de Goiânia, hoje,

Analista Judiciário do TRT/GO

Genaura Tormin
Enviado por Genaura Tormin em 27/09/2010
Reeditado em 27/09/2010
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