ARREPENDIMENTO. CORRA QUE AINDA DÁ TEMPO.

Ele acontece. Mais cedo ou mais tarde, a qualquer hora e em qualquer momento, não importa. Basta um gesto e muitas vezes nada e lá se vai um motivo. O arrependimento.

O arrependimento é aquela coisinha latejante, dolorida, que aparece quando percebemos que, de todas as opções que havia, escolhemos justamente a errada. Desde os primórdios tempos, o homem tem buscado nos astros, na física e na atmosfera e em qualquer coisa com aparente solução que o ajude a prever o futuro, como uma forma de evitar acontecimentos e facilitar as decisões mais difíceis, quer seja para atuar nas guerras, nas decisões políticas, nas ações imediatas e urgentes, até mesmo na decisão da própria carreira, quando se percebe que independentemente da inteligência e raciocínio, o erro estará sempre presente na condição de ser humano que somos e isso jamais admitiremos facilmente, uma vez que a impossibilidade de acertar tudo o tempo todo, alimenta uma ansiedade que é bem a nossa cara.

Fazemos escolhas, tomamos decisões, optamos entre vários caminhos e desse jeito a vida vai se definindo. Basta uma única decisão e de repente tudo muda, sem direitos a fazer “tests drives”. Começamos na arte de enganos e equívocos muito cedo e desde então a vida nos obriga a tomar uma decisão, no qual nossa juventude imatura se privilegia por não fazer planejamentos prévios e analises de riscos antecipados. Embora nos sintamos na condição de tomar decisões independentes, feito gente adulta que sabe o que está fazendo, nem sempre aceitamos a capacidade de cometer burradas com a destreza de quem faria isso de olhos fechados. Já que não se pode voltar no tempo para apagá-las, o jeito é acreditar na possibilidade de corrigi-las em algum momento.

Arrepender-se é lavar a alma da culpa, dando permissão à consciência para se libertar. A própria consciência nos mostra e sinaliza quando alguma medida precisa ser tomada, do contrário não seria fácil carregar o peso sobre os ombros do erro cometido, como uma escalada torturante. O arrependimento sempre nos acompanhará, desde a infância até o último segundo de vida, a diferença é que quando jovem, os erros são justificados pela falta de experiência e quando adultos somos condenados pela falta de atenção e à medida que o tempo nos torna consciente do que fizemos de errado, a culpa pode se tornar muito maior que o simples ato de se arrepender, por isso é tão importante entender cada processo para não potencializar e se penalizar demais. O lado bom do arrependimento é a analise critica que nos resta depois que algo de ruim acontece e no que teremos que fazer para converter o erro em acerto. Toda ação imediata se resumirá em tomar decisões que ajude a virar o jogo, antes que a emenda não surta mais efeito e não haja outra maneira de consertar o problema.

A palavra arrependimento impulsiona uma mudança de atitude contrária ou oposta àquela anterior. O conceito de arrependimento na teologia cristã está relacionado à idéia de pecado. Segundo o conceito, o ser humano arrepende-se de seu pecado quando toma consciência do que praticou, reconhece a sua condição de pecador e deseja não cometer o mesmo erro, porém o pesar por si só é capaz de abrir um buraco na alma tão grande que aparentemente nos cega diante das soluções mais óbvias, por isso o arrependimento se torna um bem intransferível, por nos sinalizar o que precisa ser feito enquanto há tempo, ajudando a sanar um tipo de dor que não se alivia com remédios, capaz de esconder-se na ausência de lágrimas. Quem sente a culpa, sabe o peso que carrega e o alivio que o perdão é capaz de dar, como um refrigério que atinge o fundo da alma, dando uma nova chance ou quem sabe uma oportunidade de recomeçar do zero, ainda que recomeçar do zero não exista, uma vez que a experiência não lhe permitirá a inocência de principiantes.

Todos nós, em algum momento da vida já fomos levados ao arrependimento, causado por um pensamento, por uma palavra ou por um gesto, não importa. Se existe a culpa é porque existe a falha. Não quero usar aqui a palavra ‘pecado’ para que não caiamos nos preceitos religiosos que podem ser infinitos, mas sim compreendermos a nossa própria estrutura como tomadores de decisões certas ou erradas, sempre lembrando que nada nesse mundo são cem por cento absolutos.

Do mesmo jeito que carregamos o sentimento da culpa, que pode aumentar ainda mais o tamanho do engano, temos também o talento por executarmos julgamentos, assim como a condensação por algo que superficialmente conhecemos. Esse gesto sai quase que de imediato, podendo levar ao culpado a obrigação de carregar seu pesar ainda mais longe. É quase inevitável. Isto ocorre porque somos os únicos seres vivos capazes de conviver e de carregar a culpa, devido à consciência que nos torna diferentes dos outros animais, assim como saudade, lembrança, o ressentimento, o arrependimento e a nossa maldade em flagelar os outros.

Quando cometemos uma falha ou dizemos uma palavra que não deveria ter sido dita e nos tornamos conscientes disso, o arrependimento vem logo que de imediato, apontando que precisamos regressar para rever nossas atitudes. Assim como o sentimento da culpa é latente e inevitável, reconhecer que errou é uma atitude gloriosa. Infelizmente, o que muita gente faz é considerar o arrependimento, como algo pessoal e totalmente subjetivo, cabendo a si mesmo admiti-lo ou não. Ou seja, o sujeito se liberta da culpa, simplesmente por considerar que o erro não seja grave ou que simplesmente não exista, evitando sujar a própria consciência. Assumir o erro e corrigi-lo, não só demonstra a confiança em si mesmo, por entender que tudo na vida tem um começo, meio e fim e que o final não precisa ser algo doloroso, assim como nos ajuda a compreender a importância de analisar todas as conseqüências, evitando que o veneno da culpa que nos mate lentamente.

A culpa nos deixa cabisbaixo, desesperançosos, tristonhos. Afeta a nossa auto-estima, a imagem que temos de nós mesmos, alimenta a vergonha e obstrui o nosso senso de direção. Os dias se tornam cansativos, pesarosos, atingindo as nossas expectativas e o nosso crédito com os outros, enquanto o arrependimento sinaliza de que ainda existe uma alternativa a ser tentado, voltar onde tropeçamos, mesmo sem poder voltar ao passado, pode ser uma decisão importante e quanto mais cedo, ela acontecer, melhor será. Admitir um erro é se permitir acertos. É como dar vida nova as coisas que pareciam velhas e desgastadas. De sã consciência, ninguém comete enganos, por isso trocar a culpa por uma nova chance é bem mais sensato do que ficar remoendo o passado que nem sempre permite rasuras.

Casar agora ou esperar um pouco mais? Optar por uma pós-graduação após a formatura ou aguarda o ano seguinte? Muda ou não muda de emprego? A tomada de decisão ou de indecisão está sujeito ao arrependimento. Não se pode prever o final de tudo, por isso o receio e a cautela sempre beiram as decisões importantes, assim como a angústia, a depressão e o isolamento quando alguma coisa sai diferente do que havia no papel. O jeito é arriscar, é tentar, é ver de perto como as coisas são para depois decidir pelo melhor, embora nem sempre o melhor para nós, seja o melhor para o momento. Há instantes em que recuar é estratégico para se chegar mais longe. Nesse caso é bom manter o foco no objetivo e não dar atenção a ansiedade que tende a pôr pressa, onde se pede prudência e nesse caso, os duvidosos tendem a assumir seu lado positivo.

Há decisões que não esperam por nós, mas que o resultado muitas vezes sai melhor do que se tivéssemos planejado. A chegada de um filho, o encontro com pessoas interessantes em situações ocasionais, a oportunidade de um novo negócio, enfim. A vida se apresenta de diversas maneiras no nosso dia-a-dia, mostrando um jeito novo de fazer diferente, nos dando o livre arbítrio de decidir agora ou depois, nesse ou em outro, com ou sem aquele, pelo bom ou pelo mal. Podemos dizer que a melhor decisão seja aquela sinalizada pela sorte ou talvez pela atenção de ver que tudo que conspira para o bem sempre caminhará para frente, principalmente para quem olha tudo com sensatez, prudência e sabedoria.

Os arrependimentos são profundos quando perdemos oportunidades. Elas sim representam um golpe de sorte que não se deve subestimar. Os anjos estão dizendo amém enquanto você não desliga do seu programa preferido, perdendo um momento que poderia ser crucial, muitas vezes irrecuperável. Um emprego novo, um carro novo, uma viagem, a compra de uma casa, enfim, um bom negócio, que possa parecer único, cujas chances sejam remotas de voltar a acontecer, pode parecer um erro. Um romance novo, por exemplo, se você insiste sempre em sair de óculos escuros. A sorte está passando a sua frente e só você não vê. Senta do seu lado e você não enxerga. Toca nos seus ombros e você não percebe. Fala com você, mas você não ouve. Falta de atenção também causa arrependimentos.

Coisas que causam arrependimento, por exemplo, é não dizer a alguém o quanto você é feliz ao seu lado, o quanto sua vida mudou com a presença dela, o quanto você agradece a vida por suas coincidências. De dizer ao pai e a mãe o quanto você os ama, o quanto agradece por tudo que foi feito a você, por todas as oportunidades de lhe deram de ser alguém de bem, pelos valores que lhe passaram, pelo carinho e atenção que lhe deram. O tempo passa para todo mundo e será doloroso você querer dizer tudo isso, quando não houver ninguém para ouvi-lo. Para que os ouvidos ouçam o amor, o coração precisa estar batendo.

Não se podem perder essas chances, elas são únicas e com tempo limitado. A vida tem uma passagem breve e funciona em um tempo diferente do nosso. Arrepender-se por uma falha, por um erro, por uma palavra mal dita ou por um gesto mal feito, tem conserto. Basta ter a humildade de reconhecer-se humano, de errar, de saber perdoar. O mundo nos mostra uma infinidade de possibilidades de novo começo, mas perder a chance de dizer a alguém o quanto a ama é uma oportunidade perdida, daquelas que não se encontra mais, ainda que depois de mil cartas escritas à mão.

As oportunidades são grandes de fazer melhor as coisas que já fizemos. Todos os anos, os anos recomeçam, uma nova chance, uma nova data se regenera e todo mundo reconhece a possibilidade de mudança, de alteração, de novidade. Enquanto existir força de vontade, haverá pontes ligando pessoas, desculpas juntando braços e cabeça encontrando ombros. Não sabemos de tudo o tempo todo. Somos tão sujeito a falhas quanto à gravidade. Nossa vida só precisa de um instante tanto para nascer quanto para morrer e depois que se morre, nada se pode fazer, senão aguardar que do outro lado haja um lugar melhor e uma razão maior para continuarmos existindo.

Não se deixe corroer pelo sentimento de culpa que move a alma para dentro de um alçapão sem fundo. Abra seu peito para as coisas novas e as janelas para um novo dia. Mostre-se arrependido pelas coisas que fez sem razão, mas que reconhece que precisa mudar. Feche os olhos para a indiferença, para a solidão dos outros, para o egoísmo que nos cega facilmente. Ninguém vive sem ninguém. E antes de tudo aprenda a perdoar os outros e a si mesmo para que você experimente a ausência da culpa, porque culpa é quando todas as chances se esgotaram para sentir arrependimento, enquanto o arrependimento são braços abertos e o coração moído buscando o perdão.

Joel Thrinidad
Enviado por Joel Thrinidad em 29/12/2010
Reeditado em 29/12/2010
Código do texto: T2697686
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