Portador do vírus HIV.

Passara muitos anos procurando a mulher ideal e não encontrara.

Uma falava demais, outra de menos...

Algumas não partilhavam seus ideais...

Outras não sabiam respeitar sua individualidade... E assim vivia, pulando de romance em romance sem encontrar o amor de sua vida.

Até que conhecera Flávia, bonita, cheia de vida, bem humorada. As idéias se combinavam, o dialogo fluía espontâneo. Parecia que a conhecia há séculos, era sem duvida a mulher ideal.

Namoraram por três anos e tudo parecia perfeito, eram felizes. Acalentava o sonho de casamento, família grande, com muitas crianças brincando no lar. Crianças, Ah! Como gostava de crianças, queria muitos filhos...

Porém, numa bela manhã de domingo, Flávia lhe chama e com lágrimas nos olhos lhe diz:

- Arnaldo, amo demais você, nos damos bem e estamos fazendo planos para o casamento, porém, quero lhe falar sobre algo, um assunto delicado e que ocultei de ti por medo de sofrer tua rejeição, no entanto, gostaria que me perdoasse e que se pudesse, continuasse a me amar.

Arnaldo, um tanto aflito com os dizeres da amada, suplicou que ela lhe contasse.

E foi ai que Flávia lhe deu a notícia:

- Sou portadora do vírus HIV. Acabei por contrair o vírus em uma transfusão de sangue...

Arnaldo, aturdido com o que acabara de escutar, sentiu que tudo a sua volta girava e desmaiou. Ao acordar, olhou para Flávia que lhe acariciava, nada disse e foi-se embora, deixando a amada a lhe chamar em vão.

Passaram-se dois meses de que recebera a notícia e não tentara procurar Flávia, queria esquecê-la, riscá-la de sua vida. Como casar-se e ter filhos com alguém portador do vírus HIV? Como ter uma vida íntima saudável com alguém que lhe oferecia riscos? Não, definitivamente isso não fazia parte de seus planos!

No entanto, seu coração ainda batia por Flávia e por mais que não quisesse, sempre pensava nela, era com carinho que recordava-se dos bons momentos que viveram juntos. Ah, quanta felicidade experimentou ao lado dela. Lembrou-se dos bate papos agradáveis, das tardes de sábado que passeavam de mãos dadas, dos domingos que gostosamente observavam o por do sol... Sim, se não fosse por tão grave motivo seriam muito, mas muito felizes!

Mas o preconceito não deixava que ele a procurasse, e assim, ambos mesmo se amando, sofriam a dor imposta pela discriminação de Arnaldo.

Até que certa vez, ele adormeceu e sonhou com sua mãe – que havia falecido há alguns anos – a lhe aconselhar:

- Filho, não deixes que o orgulho e o preconceito torturem dois corações apaixonados. O que é essa dificuldade diante da felicidade que lhes espera? Por acaso o fato de Flávia ser portadora do Vírus HIV a diminui em alguma coisa? Por acaso ela deixou de te amar? Não foi ela sempre companheira carinhosa e atenciosa? E lhe afirmo sem medo de errar, se a situação fosse inversa, ela jamais lhe abandonaria.

Arnaldo acordou com aquelas palavras a ecoar em seus ouvidos, parecia mesmo que havia encontrado-se com a querida mãezinha. Pensou um pouco, abriu as janelas, viu que o sol continuava a brilhar e foi ao encontro de Flávia.

Creio ser ocioso afirmar que ela lhe esperava de braços abertos. Passados alguns meses, casaram-se.

Hoje, 2006, faz 10 anos que estão casados... A casa cheia de crianças correndo e brincando como sempre quisera Arnaldo. Flávia pode ter filhos normalmente, porém, Arnaldo é estéril, o que os levou a adotar quatro crianças. Estão felizes, Flávia voltou a estudar, e está prestes a se formar em Filosofia, é mãe dedicada, esposa amorosa, e leva uma vida normal.

O preconceito machuca demais. No caso do vírus HIV, a cobrança é ainda maior, porque não raro, associa-se o portador do vírus a pessoas viciadas e com a vida totalmente desregrada.

A marginalização que sofre quem é portador do vírus HIV e também sua proliferação, têm apenas uma morada:

A ignorância! A ignorância vem sendo ao longo dos séculos mola propulsora de preconceitos e desatinos.

Preconceitos por parte de quem não sabe (ou finge que não), as formas de contágio do vírus e por isso marginaliza quem o contraiu.

Desatinos por parte de quem desrespeita a vida, se envolve com o vício e desregramento, e acaba por colocar a integridade dos seus em jogo devido a sua total irresponsabilidade.

Neste tópico do desatino há que se abrir um outro ponto de discussão: Muitas mulheres são infectadas com o vírus HIV pelo próprio marido que mantém relações extraconjugais. Em total desrespeito às suas esposas, trazem dor e espalham tristeza por toda a família por agirem com imprudência. Esta é uma questão delicada e que apenas a evolução moral das criaturas irá equacionar; enquanto homens sentirem-se no direito de enganar suas companheiras de caminhada, alimentando uma sociedade machista, teremos muitas esposas sofrendo o desatino de seus maridos.

Falou-se de AIDS e automaticamente olha-se à pessoa com certa distância, por isso, muitos portadores do HIV preferem ocultar o dilema que enfrentam. Sentem medo de perderem amigos, de ficarem sozinhos, de sofrerem discriminação.

Não desabafam e vivem em clima de completa tensão, com total receio de que venham a descobrir que são portadores do vírus.

E essa postura certamente complica o tratamento, quando sentimo-nos rejeitados, inferiorizados, abrimos brechas em nosso sistema imunológico e dificultamos a ação dos medicamentos.

Por isso, o melhor remédio àquele que é portador (a) do vírus HIV é sem duvida o carinho e a compreensão , pois estes lhe farão sentir-se querido (a), amado (a) e conseqüentemente mais disposto (a) à enfrentar os embates que virão.

É bom lembrar ao leitor (a) que nem todas as pessoas soropositivas têm AIDS, o vírus pode ficar por muitos anos sem manifestar-se. O portador de HIV é uma criatura como outra qualquer, merece amor, respeito, carinho, atenção... Pode levar uma vida normal, ter amigos, estudar, namorar, enfim, viver em plenitude. Óbvio que tomando o devido cuidado, e agindo com prudência, para que não agrave sua situação e também não coloque em risco a integridade de seus afetos, todavia, essas observações cabem também a quem não é portador do vírus.

Por isso amigo (a) leitor (a), convido-lhe a pensar em sua atitude perante aqueles que são portadores do vírus HIV, refletindo em suas dificuldades, em seus receios, e, auxiliando a esclarecer todos quanto os malefícios que o preconceito pode trazer à um coração já fragilizado pelos problemas.

Pensemos nisso!

Wellington Balbo
Enviado por Wellington Balbo em 16/11/2006
Código do texto: T293122