Direito Constitucional Brasileiro - Estágio Probatório X Estabilidade

Desde a promulgação da Emenda Constitucional nº 19 de 1998 tem perdurado discussões e contradições acerca de qual seria o real período de extensão do Estágio Probatório, o qual tem tido seu prazo de cumprimento comparado ao novo prazo constitucional atribuído para fins de aquisição da Estabilidade, e que conforme redação anterior à Emenda ora citada era de dois anos, passando para três, após a modificação do artigo 41 da Constituição Federal 1988.

Posicionamentos divergentes acerca do período de decurso do Estágio Probatório foram levantados ao longo do tempo por doutrinadores e operadores do direito, inclusive gerando parecer da Advocacia- Geral da União e jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça.

Tal discussão levantou questões no sentido de esclarecer qual seria realmente o prazo para cumprimento do estágio probatório (também chamado estágio de prova) 24 meses conforme a lei 8112/ 90, art.20 ou três anos conforme CF art. 41.

Pois bem, uma das maiores discussões encontradas gira em torno da dificuldade de diferenciação no que diz respeito aos dois institutos, que vêm sendo visualizados como sendo idênticos e, portanto, dando margens para a interpretação de extensão do novo prazo conferido à aquisição da estabilidade também ao estágio probatório, pois segundo alguns pensadores, se são idênticos, o novo prazo de cumprimento dado pelo art.41 da CF para a aquisição da estabilidade se também seria aplicada ao estágio de prova, obtendo este também um período de extensão igual a 3 (três) anos.

Na busca pelo esclarecimento desse ponto, da igualdade ou não dos institutos, podemos observar posicionamentos divergentes à comparação entre o período de prova e a estabilidade como, por exemplo, o do Superior Tribunal de Justiça que se posicionou pela distinção entre ambos os institutos, confirmando prazo constitucional à estabilidade e o prazo do RJU art.20 ao estágio probatório.

Sendo assim, obteve-se o entendimento de que a estabilidade tem prazo de 3 (três) anos e o estágio probatório, de 24 meses.

Já posicionamento proferido em parecer da AGU, mesmo entendendo da distinção entre os institutos, declara ser aplicável o prazo constitucional para obtenção da estabilidade ao estagio de prova, estendendo este último de 24 meses para três anos.

Neste sentido alguns doutrinadores têm posicionamento favorável ao parecer proferido pela AGU dentre eles o mestre HELY LOPES MEIRELLES que em seu livro Direito Administrativo Brasileiro pagina 420 § 60 º, declara:

“Estabilidade é a garantia constitucional de permanência no serviço público, outorgada ao servidor que, nomeado para cargo de provimento efetivo, em virtude de concurso público, tenha transposto o estágio probatório de três anos, após ser submetido à avaliação especial de desempenho por comissão instituída para essa finalidade (CF, art.41)” [grifo nosso].

Entretanto, vale observar que o posicionamento supracitado, apenas, menciona que o estagio probatório é de três anos, sem dar maiores pormenores, não deixando claro nosso ilustre doutrinador, qual fundamento o levou a sustentar um estagio probatório com este período de cumprimento.

Não bastasse, o parecer da AGU, em seu § 6º, admite que em outros processos sustentou-se o prazo de prova como sendo de 24 meses, não se podendo estender o estágio confirmatório sem lei, deixando margens à incerteza jurídica a cerca da diferenciação dos institutos comentados.

Por outro lado, o Superior Tribunal de Justiça tem se posicionado a favor da independência dos institutos, conforme acórdão esclarecendo que ambos os institutos são distintos, no que pese ser o estágio probatório um período de apuração, uma avaliação de aptidão e a estabilidade um direito constitucional de permanência no serviço público.

Para subsidiar melhor o pensamento do órgão superior e que - segundo penso eu - tem o melhor entendimento, algumas explicações são oportunas começando pela leitura do dispositivo seguinte, onde o Regime Jurídico Único dos servidores públicos civis declara in verbis:

Art. 20. Ao entrar em exercício, o servidor nomeado para cargo de provimento efetivo ficará sujeito a estágio probatório por período de 24 (vinte e quatro) meses, durante o qual a sua aptidão e capacidade serão objeto de avaliação para o desempenho do cargo, observados os seguintes fatores.

I - assiduidade;

II - disciplina;

III - capacidade de iniciativa;

IV - produtividade;

V -responsabilidade.

§ 2o O servidor não-aprovado no estágio probatório será exonerado ou, se estável, reconduzido ao cargo anteriormente ocupado, observado o disposto no parágrafo único do art. 29.

Seção V

Da Estabilidade

Art. 21. O servidor habilitado em concurso público e empossado em cargo de provimento efetivo adquirirá estabilidade no serviço público ao completar 2 (dois) anos de efetivo exercício. (prazo 3 anos - vide EMC nº 19)

Convém observar que:

1- A Lei nº 8112/90 traz os dois institutos dispostos em seções diferentes, fazendo distinção entre o estágio de prova, art. 20, e a estabilidade art. 21.

2- O artigo modificado pela Emenda nº 19 foi o art. 21 e não o art. 20.

3- As sanções pelo não-cumprimento dos requisitos para ambos os casos também apresentam diferenças, observe-se que, caso o servidor não cumpra os requisitos do estágio de prova, será exonerado, porém, se já estável, somente ocorrera perda do cargo nos casos previstos no art.41 da Constituição Federal.

4- O período de cumprimento dos institutos também mostra sutil diferença, sendo a estabilidade computada em anos e o estágio probatório em meses, onde mês é o lapso de 30 dias e ano de 365 dias. Se somados os 24 meses obteremos 720 dias, dois anos obteremos 730. O que em se tratando de direito, faz uma grande diferença e, se não resta claro o estágio probatório com prazo de três anos, quanto mais 36 meses, como tem sido ensinado por alguns mestres a alunos freqüentadores de cursos preparatórios, agravando ainda mais a diferença em dias.

Ademais, a finalidade de cada um é atender aos objetivos divergentes, sendo o estágio probatório um dos requisitos para o alcance da estabilidade, com objetivos distribuídos em cinco incisos os quais buscam avaliar a aptidão do novo servidor ao exercício do cargo, onde no decurso do estágio de prova, deve a administração apurar a conveniência ou não de o servidor permanecer efetivado, caso tenha cumprido os requisitos do art 20, estará apto a continuar no exercício da função.

Já a estabilidade é um direito que visa garantir ao servidor maior segurança contra abusos da administração pública quando, por exemplo, da troca de governantes, ocasião em que há grande rotatividade de pessoal, além de contribuir com o bom funcionamento da mesma, garantindo uma maior organização do serviço público.

Outro contra-ponto encontra-se no sentido de que, enquanto a estabilidade está relacionada ao serviço público, o estagio probatório se relaciona ao cargo que se pretende exercer, pois, quando se fala em estabilidade, fala-se em estabilidade no serviço público e, em estágio probatório, no cargo em que se pretende efetivar.

Vale lembrar, ainda, que estágio probatório é um dos requisitos, não o único requisito, (conforme CF art.41) podendo este ser de qualquer duração, desde que ateste a capacidade de exercício ao cargo pretendido. Neste sentido, até mesmo o parecer apresentado admite, em seu § 7º, que em outras épocas do Direito Brasileiro, foi consagrado estágio de prova com período de duração diferente do prazo de latência para aquisição da estabilidade pública, não tornando infundada esta possibilidade.

Vejamos um exemplo: imaginemos um agente público aprovado pela primeira vez em concurso público, ao preencher os requisitos para provimento do cargo, o agente deverá cumprir três anos de efetivo serviço para obtenção da estabilidade, onde o estágio probatório será, apenas, um dos requisitos que devem ser cumpridos para obtenção da mesma; neste caso, não há dificuldade de aplicação da norma constitucional, entretanto, se tomarmos como exemplo um outro servidor que já trabalha no serviço público há mais de três anos não há de se falar em tempo de cumprimento para aquisição de estabilidade, pois o servidor já a possui; neste caso, será aplicada a regra do art. 20 § 2° que impõe o período de 24 meses de cumprimento do estágio de prova.

É de se notar que houve omissão por parte do órgão legiferante, em não deixar claro a diferença entre os objetos discutidos, pois não há dúvida quanto à distinção dos institutos.

Talvez a intenção da casa legislativa fosse, com a mudança constitucional, legislar no sentido de que o período de estágio probatório acompanhasse o período de tempo proposto para concessão da estabilidade, mas, infelizmente, isto não restou claro.

Também não se pode negar que, após a modificação do artigo 41 da CF, ficou a administração pública em situação difícil, pois, por não obter claramente o parâmetro que deveria aplicar ao estágio confirmatório, vem tentando, por meio de parecer, ajustar a situação discutida, porque esta não pode deixar de cumprir a lei, e, só pode fazer aquilo que a lei manda, o que reforça, ainda mais, o entendimento jurisprudencial.

A título de curiosidade gostaria de pontuar, ainda, uma observação: nota-se que o parecer dado pela AGU tem como data de pronunciamento o dia 22 de abril de 2004, quando primeiro se formou posicionamento a cerca da extensão do período de prova, e que a decisão do STJ é justamente contra o Advogado Geral da União, o que ocorreu em data superveniente (25 de agosto de 2004) com isso há de se concluir que a decisão do tribunal foi contra uma demanda justamente baseada no parecer da Advocacia da União.

Conclusão: Estágio probatório, s.m. é período.

Estabilidade, s.f, é direito.

- São dois institutos diferentes,

- com finalidades diferentes,

- dispostos em artigos diferentes; logo, não há dificuldade em aplicá-los separadamente, entretanto, a solução para diminuir todas as dúvidas, na aplicação dos dois institutos, é o pronunciamento da Suprema Corte, colocando, definitivamente, um posicionamento indiscutível a respeito desta questão.

Eduardo Franco Vilar

Edu vilar
Enviado por Edu vilar em 31/05/2011
Reeditado em 08/06/2011
Código do texto: T3005647