Criatividade Sem Autoritarismo

O homem que pensa cria, e luta por neutralizar seus baixos instintos. Paz e felicidade são asseguradas através do estímulo à criatividade que é tolhido nos jovens e nas crianças pelo autoritarismo, resquício medieval de inquisidores cruéis que se reproduzem como pragas na sociedade moderna e contra os quais se deve lutar, empenhando-se na busca da verdade como resposta à covardia e ao medo disseminado pelos impostores. Como muito bem dizia Russel, a moralidade nada tem a ver com regras ditadas por qualquer autoridade.

Se Deus é a Natureza e o Universo, e o homem parte de tudo, ele é um Deus em formação que através do conhecimento de si, um dos principais objetivos da vida inteligente, poderá transformar-se em Homem através da evolução. Desta forma, Deus não é assunto de adoração, veneração ou crença, senão de conhecimento.

A imortalidade encontra respaldo na ciência desde que um pensamento criado por uma pessoa possa sobreviver à sua morte. A História está repleta de exemplos, a criação sobrevivendo ao criador. Biologicamente, isso está arquicomprovado. Deus cuida da espécie, o indivíduo deve cuidar de si.

O cérebro morre com o corpo, mas os pensamentos podem sobreviver. A palavra tem um corpo, uma alma e um espírito, como bem ponderou o pensador González Pecotche. O corpo, a palavra escrita, a alma, a pronunciada, e o espírito a impronunciada, sua essência que pode se imortalizar.

Deus não escreve livros, e sim homens, naturezas, o Universo. Este é o Verbo Divino. Homens escrevem livros, e a linguagem humana provem daquela – a ancestral - pois visa nomear uma escritura maior.E de onde provêm as diversas línguas criadas pelos homens?

A linguagem - as palavras que deveriam ser utilizadas para nomear o Verbo e para que os homens se unissem neste trabalho - passou a ser instrumento de dissensão. Então surgiram as línguas, os afastamentos, a linguagem decaída, a babélica.Se a palavra escrita é o corpo físico do pensamento, para se chegar a ele – que é invisível, incorpóreo –, poderemos fazê-lo através dela.

Se o corpo físico do homem, o visível, o palpável, guarda em suas profundezas a inteligência, a sensibilidade e a essência invisível e intocada, ele - o espírito - assemelha-se ao pensamento, à essência invisível da palavra.

“O essencial é invisível aos olhos”, escreveu o inspirado piloto francês.

Assim, o espírito, como o pensamento – invisíveis e essenciais que são –, como os sentimentos, os sonhos e as recordações, deveriam merecer de nós uma atenção maior.

E como ocupar-se mais de si ? Como conhecer-se melhor?

A tarefa não é fácil, mas não impossível; começando por deixar de ocupar-se tanto dos outros e do que nos cerca, cultivando um olhar reflexivo e auto-observador. Somos especialistas na observação do que acontece ao redor, mas ausentes de nós. Não chegamos a aproveitar as lições do que nos cerca para aperfeiçoar-nos, que é o que mais deveria nos interessar.

Não somos muito diferentes de um pensamento que pode ser bom ou mau, que necessita reproduzir-se para sobreviver como espécie; que pode evoluir nos curtos anos de vida física.

Deus quer que o ser humano use a inteligência e o coração para aproximar-se da Verdade que se confunde com o aperfeiçoamento. Ele não é o pai vingativo que atemoriza os filhos e se regozija com guerras fratricidas que os insensatos, os impostores e os ditadores dizem fazer em Seu nome.

Lutar pela liberdade própria e social, procurando respirar as verdades imanentes à Natureza, e as que brotam da inteligência e do coração, é a sensata e eloqüente postura do aprendiz que, apesar de reconhecer as suas limitações, não se conforma com a imobilidade e a submissão.

Assim, para que não sejamos letra morta num livro inútil e sem vida, deveremos aprender a escrever a nossa história com letras visíveis e invisíveis, como autores e atores, ao invés de espectadores passivos a assistir aos dramas vividos por tantos que sofrem por não pensar, por falar línguas diversas, por estar sempre a se desentender.

E talvez possamos recuperar a linguagem perdida que na infância da humanidade sabíamos tão bem pronunciar.

Nagib Anderáos Neto

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