Sérgio Martins Pandolfo*
 
        No recente e ainda pungente episódio da matança em massa de cidadãos inocentes ocorrido na então pacata e até romântica Oslo, capital da provecta Noruega, fica patente algo que se constata, mas sobre o que pouco ou nada se fala: a intolerância, a rejeição a estrangeiros ou, simplesmente a xenofobia, máxime contra negros e latinos, ademais da velha, milenar e nunca assaz combatida intolerância contra muçulmanos, que remonta à Antiguidade.
       Claro! Durante algum tempo esperou-se fosse o atentado reivindicado por alguma célula terrorista muçulmana, mas logo se ficou sabendo que o autor dessa hediondez era mesmo um norueguês, e mais, um lídimo descendente dos vikings, como orgulhosamente aludiu e exalçou em seu manifesto postado na internet: “20083, uma declaração de independência europeia”. Ah! Então tratava- se de um louco, estava claro, como inclusive quer a todo custo seu advogado convencer as autoridades! Mas os exames médicos especializados levados a cabo até aqui mostram que o jovem louro, esbelto, de olhos azuis e vikingdescendente disso não tem nada, é tão somente um assassino movido pelo ranço do afrorracismo e da xenofobia, o que ficou cristalinamente visível com suas considerações sobre o Brasil: “um país de segundo mundo e ‘disfuncional’, com um baixo nível de coesão social, deteriorado por uma mistura de raças, o que se mostrou uma ‘catástrofe’ para o país”, além de inúmeras outras furibundas inquinações. O texto também declara “guerra de sangue” contra os imigrantes muçulmanos e os marxistas.
       Anders Behring Breivik, o monstro de Oslo, 32 anos, preparou, ele próprio, sua bomba feita a partir de fertilizantes, que foi jogada pelo terrorista norueguês contra uma sede do governo e na ilha de Utoya, distante 40 km da capital, seguindo plano longa e minudentemente elaborado por ele próprio e, ao que parece, agindo sozinho, que deixou um saldo macabro de 77 mortos no massacre. E esse assassino monstruoso planejava outros ataques verdadeiramente diabólicos. Dizia-se um “cruzado” contra a invasão muçulmana na Europa. Está aí, a nosso ver, a raiz pivotante desse espantoso massacre. “Cada louco é louco à sua maneira”, explica Freud. A xenofobia cresce e se acentua na Europa. Fomos os estrangeiros mais rejeitados nos aeroportos de lá, máxime da Espanha, conquanto seja o Brasil o preferido para refúgio de europeus atingidos pela grave crise econômica que se abate sobre o Velho Continente e os que mais emigram são justamente espanhóis.
       A origem dos preconceitos raciais se perde nas brumas dos séculos, mas nos tempos mais recentes, o racismo adquiriu relevância teórica, “científica”, com a obra de José Arthur Gobineau: “Ensaio sobre a desigualdade da raça humana” (1853-5), considerada a bíblia do racismo atual, na qual afirmava a superioridade total da raça branca sobre as outras, e a dos arianos, reconhecidos como os louros de descendência germânica, sobre os demais brancos. Foi o inspirador da corrente racista europeia do final do  Oitocentos. E todos sabemos bem o que resultou disso... o desvario hitleriano!
     Gobineau era a rigor um farsante e hoje seria condenado por falsidade ideológica. De família comum, de poucas posses, criaria para si uma falsa genealogia  que o guindou a membro de uma família aristocrática, passando a se fazer conhecer pelo título nobiliárquico postiço de "Conde de Gobineau", celebrizando-se como ideólogo principal do racismo e da eugenia. Enviado por Napoleão III ao Brasil (1869) em missão diplomática, nunca escondeu sua antipatia para com o País, conquanto se fizesse amigo de D. Pedro II, que não anuía tais abjetas idéias. Marcado pela presença de “raças” que cria inferiores, para ele o Brasil não tinha futuro se não fora “branquear” a população com o incentivo à "importação" de "raças" europeias, que julgava superiores.
       Hoje se tem como certo exatamente o oposto: a mistura “racial” é não só salutar como necessária, para livrar as populações de inafastável consanguinidade ao longo do tempo e fazer ressaltar nos advindos desses cruzamentos, as excelências de cada variedade rácica Precisamos urgentemente banir esta praga – o racismo! – do mundo. Para tal é necessário desarmar os espíritos e contar com o empenho verdadeiro (e não somente “de boca”) dos cidadãos, compromisso político real das nações e honestidade de propósitos.

Nota: A foto no alto da página é do Conde de Gobineau, ideólogo do racismo e da eugenia na Europa
-------------------------------------
*Médico e escritor.  ABRAMES/SOBRAMES
E-mails: sergio.serpan@gmail.com  -  serpan@amazon.com.br
Site: www.sergiopandolfo.com
 
Sérgio Pandolfo
Enviado por Sérgio Pandolfo em 04/08/2011
Reeditado em 04/08/2011
Código do texto: T3139532
Classificação de conteúdo: seguro