REVERÊNCIAS AOS ANTEPASSADOS

Dois de novembro é o dia em que os cristãos dedicam carinho especial aos seus parentes que já deixaram este mundo. Os túmulos, onde foram enterrados os corpos dos falecidos são limpos e enfeitados com flores e velas, mesmo quando o falecimento aconteceu há tanto tempo que a chance de ter sobrado algum osso é bastante remota. Porém, vale a intenção.

A religiosidade judaico/cristã considera que a verdadeira vida começa com a morte do corpo, porém a medicina e a farmacologia estão aí para provar que ninguém tem pressa em ir para a “verdadeira vida”. A mesma tradição religiosa não faz muitas exigências quanto ao destino do corpo após a morte. Se um “enterro cristão” for substituído pela cremação do corpo não se comete nenhum pecado. A própria Igreja Católica, desde o século XIX faz a cremação dos ossos em sepulturas de desconhecidos em seus cemitérios.

Um dia todos vão morrer, mas não se conhece alguém que goste da idéia. A morte é um mistério. Se, para os cristãos, é o início da verdadeira vida, na crença de muitos é fim geral. Há ainda aqueles quem consideram o corpo carnal apenas como um uniforme de trabalho para o desempenho de uma determinada tarefa. Para esses, a morte do corpo seria apenas uma troca de uniforme e um preparo para iniciar outra tarefa, com outro uniforme. Assim, a própria morte faz parte da grande Vida.

Independente de qualquer crença, todos reverenciam seus entes queridos que já foram. Algumas religiões na índia e na Indonésia, acreditam que a alma não consegue separar-se do corpo enquanto este não for cremado. Como muitas outras religiões orientais, com adeptos no ocidente, acreditam que o espírito demora algum tempo para se conscientizar da morte do corpo. As cinzas são espalhadas no ar, no rio ou no mar, para que o falecido fique desorientado e não encontre e importune aos que ainda estão vivos em suas casas. O custo da cremação lá também é muito alto, por isso, muitas vezes, os corpos são enterrados e somente quando houver dinheiro são desenterrados para serem então cremados. O México, embora se tenha tornado cristão, ainda mantém costumes de seus primeiros habitantes que choram a morte por uma hora e a festejam pelas 24 seguintes.

O medo dos mortos já alimentou ficcionistas de todas as matizes. Milhares de livros, revistas e filmes alimentam o tétrico e o bizarro para chegar ao pânico. Quase sempre criados com a raiz nalguma crença ou crendice, estes contos exploram o terror e não orientam em nenhum sentido. O desencontro dos ensinamentos religiosos sobre o sentido da morte ajuda a nutrir as especulações amedrontadores.

A respeitosa reverência aos antepassados, que tem seu clímax no dia dos finados, é o registro das coisas boas que ficam quando o corpo se vai. É a presença na lembrança de quem não está mais fisicamente presente. Muitas vezes é mais que a saudade pura e simples: É o reconhecimento de que os antepassados nos ensinaram muito. Essas obras que sobram quando o corpo morre, talvez sirvam para explicar um pouco a imortalidade da alma.

Luiz Lauschner – Escritor e empresário

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Luiz Lauschner
Enviado por Luiz Lauschner em 04/11/2011
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