Por que a hostilidade a Yoani Sánchez?

É totalmente compreensível a curiosidade da mídia e do público em qualquer país em torno da jornalista cubana Yoani Sánchez, que tece severas críticas ao regime castrista em seu blog “Geração Y”. Lançado em 2007, este espaço virtual já foi traduzido para 15 línguas e acessado por milhões de pessoas no mundo todo.

Sou avesso a idolatrias e criações de celebridades, seja em que área for. Por isso, acho exagerada qualquer manifestação que queira colocar Yoani Sánchez debaixo desse tipo de holofote. No entanto, soaram absolutamente esquisitas e despropositadas as manifestações de repúdio que a blogueira cubana recebeu em alguns locais por onde passou em sua recente visita ao Brasil, mesmo sendo favorável à liberdade de expressão.

Segurando cartazes com acusações de que Yoani é agente da CIA e traidora do regime cubano, jovens ligados a partidos de esquerda, como o PCdoB, PCR e PT, pareciam estar em pleno período da chamada guerra fria, quando o mundo era polarizado em nações capitalistas e socialistas. Em Feira de Santana, na Bahia, manifestantes agitaram notas falsas de dólar em frente à blogueira, que chegou a ter uma delas esfregada no rosto, além do cabelo puxado. Triste para não dizer patético.

Não dá para acreditar que em pleno terceiro milênio ainda haja estudantes secundaristas e universitários que se comportam como se estivessem na década de 1960 ou 1970. Eles são exatamente iguais a muitos que pude conhecer de perto quando estudei na UFBA (Universidade Federal da Bahia), na segunda metade da década de 1980, e na UFV (Universidade Federal de Viçosa-MG), na primeira metade da década de 1990. Vi algumas vezes estudantes ligados ao PT e ao PC do B machucados da cabeça aos pés depois de uma eleição pela direção da UNE (União Nacional dos Estudantes). Um verdadeiro contrassenso!

Nas décadas de 60 e 70 havia motivos para a polarização que existiu, até porque o Brasil e a América Latina viviam sob a tutela de ditaduras de direita, assim como Cuba, China, Coréia do Norte, Alemanha Oriental e a antiga União Soviética viviam sob a égide de ditaduras de esquerda. Todas as cortinas caíram no fim do século 20 e ficou tudo muito claro a respeito dos vícios, erros e discrepâncias tanto do capitalismo quanto do socialismo. Isoladamente, não deram certo, isto é fato.

Fidel Castro, em Cuba, perdeu o fio da meada da história, mesmo depois das suas grandes parceiras – a União Soviética e a Alemanha Oriental – terem se desmantelado econômica e ideologicamente. Obviamente, isso não tira o mérito de todos os projetos implantados pelo regime de Fidel após a sua revolução no fim da década de 1950, nem tira a responsabilidade dos Estados Unidos pelo embargo econômico que tanto prejudicou e prejudica o povo cubano.

Que governo ou governante neste mundo complexo, diverso e tumultuado pode se arvorar a ser o baluarte político ou administrativo? Estados Unidos, Alemanha, Rússia, China, França, Japão, Índia, Brasil, Cuba? Grande besteira tentar demonizar uns e santificar outros, amparando-se em argumentos ideológicos que nitidamente fracassaram. Em todos (sem exceção) os regimes políticos capitalistas e socialistas de todas as épocas vieram à tona escândalos de corrupção, tentativas de golpes e má administração.

Quanto aos estudantes que realizaram protestos contra Yoani Sánchez, por que não fizeram o mesmo quando Hugo Chavez esteve no Brasil? Ou será que eles consideram o “presidente vitalício” da Venezuela um exemplo de governante democrático, pautado em ideais libertários?

O governo do PT teve e está tendo os seus acertos, mas também está muito longe de ser isento de críticas negativas. Nunca me enquadrei e muito provavelmente não vou me enquadrar nessa divisão maniqueísta de esquerda e direita. Enxergar de cima é ter liberdade para pensar e decidir; é poder escolher o melhor caminho, principalmente com autocrítica e capacidade de reconhecer os próprios erros. “Demonizar” Yoani Sánchez e “santificar” o regime castrista é tão insensato quanto fazer o inverso.