Quem Sou Eu?

Melhor que dar o peixe ou ensinar a pescar é ensinar a pensar. Mas antes de fazê-lo, será necessário aprender. Pensar é um ato de liberdade, um aprendizado espiritual que exige saber julgar-se, querer melhorar, sentir a necessidade de evoluir, realizar. E pensar no quê? Em Deus, em si mesmo e nos semelhantes, sugere González Pecotche, o pensador que dedicou sua vida ao culto da nobre função que as crenças e os preconceitos impedem realizar.

Deus se confunde com o homem, todos os homens, sem nenhum privilégio ou intermediário. Está presente no templo interior que existe no coração de todos e que se chama consciência, a que deveria reger os atos humanos, o Deus interior, a bela adormecida que ali jaz prostrada sob as sombras do ceticismo, da ignorância, das crenças e preconceitos.

O homem nasceu para pensar e não apenas para trabalhar, se divertir e se conformar com a entristecida vida rotineira dos que imaginam que a felicidade se resume na posse de coisas que perdem o seu valor quando conquistadas.

O principio do processo de liberação espiritual resume-se no reconhecimento das próprias limitações e na identificação dos preconceitos e crenças que aprisionam a inteligência nas masmorras da ignorância. E a maior ignorância é ignorar-se, não se ver, desconhecer-se. Mesmo o mais letrado e culto pode ser um ausente de si, de sua consciência.

Mais do que o axiomático ”conhece-te a ti mesmo” da ilustre personagem mencionada por Platão em seus Diálogos, sobressai-se o “tudo o que sei é que nada sei”, principio de todo o processo de liberação pelo pensar.

Se não me conheço, desconheço minha capacidade de criar. Se não sou um pequeno criador, não posso sentir nem compreender o Grande Criador.

Todo o ser humano pode ser um criador, mesmo não sendo artista, e compreender melhor o Grande Criador, o Deus único, tão distante do materializado homem moderno. E a maior obra de arte que um ser humano poderia realizar seria a de criar a sua pessoa, tornando-se um indivíduo melhor, em constante aperfeiçoamento; essa sim seria uma obra-prima, a única que poderia merecer tal classificação.

Deus não está nas alturas, nos livros ou templos; nas desgraças, nas pestes ou nas doenças incuráveis. Ele não traz o tom pesado e vingativo; não pune, não castiga ou deprime; ensina, reconforta e traz esperança. Está num sorriso infantil, na emoção de uma descoberta, num instante de reflexão, na generosidade de quem ensina. Maior que tudo quanto existe, que o mesmo Universo do qual somos parte, tem em cada coração um pequeno templo despojado do ouropel e da pompa, do ar pesado da intolerância e da incompreensão. Para penetrar em seu interior, muitas vezes inacessível à pretensão e à ignorância, é exigido que se desvincilhe da pesada carga de preconceitos, da incompreensão e dos defeitos que vêm dominando a mente humana, impedindo-lhe contemplar a Verdade pela névoa da ignorância que tem cegado o seu entendimento.

Um homem afastado de si de dos semelhantes é desatento, distraído de Deus, inconsciente.

Nagib Anderáos Neto.