A Celebração da Amizade

Há algum tempo recebíamos a notícia da morte de um amigo e refletíamos que o que se ausenta deveria ser recordado, para que não morresse pela segunda vez; a sua sobrevivência dependeria, em parte, dessa recordação que seria um tributo àquele espírito que continuaria vivendo entre nós.

Revendo um ensaio de um pensador americano sobre a amizade, não pude deixar de recordar daquele dia e fazer algumas reflexões sobre a amizade e a vida, pois serão os nossos amigos que estarão presentes nas celebrações da vida e da morte.

A amizade não pode ser uma ligação passageira e interesseira, senão a confortante experiência de estar acompanhado. E não se pode ser amigo de alguém se não se é de si mesmo.

O sopro divino que habita o coração dos que são amigos desconhece, ou deveria desconhecer, as grosseiras muralhas dos defeitos pessoais.

A amizade, em seu profundo significado, implica o amor que é a síntese e a essência do Deus único.

Um amigo é como um espelho que pode nos ajudar no caminho evolutivo. Nesta mágica relação poderemos aprender a não incomodar e a não ser incomodados.

Diante da morte de um amigo, de uma ausência que parecia ser irreparável, deveríamos pensar que a vida celebra a vida, e que a alegria e a amizade sustentam o ser humano nos anos de sua vida terrestre. E que essa ausência não é mais que um sinal e um convite para que continuemos a nos ver e a nos falar através da recordação.

O pensador González Pecotche escreveu certa vez que “a vida física não é mais que um fragmento da vida do espírito, e o conhecimento disto deve obrigar a mente humana a meditar que se a vida do corpo é transitória, a do espírito é permanente, seja qual for o estado em que se encontre.”

A amizade é um sentimento que dignifica a espécie humana; capaz de elevar a conduta pessoal a níveis de desprendimento, humanismo e heroísmo que chegam a surpreender a opinião do mais frio observador. No entanto, apesar disto, e de reconfortar os corações daqueles que a experimentam, é fugaz, efêmera. Quantos distanciamentos incompreensíveis! Quanto sofrimento nas separações que jamais se cogitou! Quanta incompreensão!

E a que se deve tudo isto? Por que o sentimento morre como se nunca tivesse existido?

Esta é a pergunta que cada um deve fazer a si mesmo ao contemplar a própria incapacidade por conservar o que um dia julgou justo, belo e imorredouro.

O que não se chega a compreender é que a manutenção da amizade exige a correspondência do afeto. Em geral, espera-se tudo da outra pessoa; que ela dê tudo de si mesma;de si próprio se quer dar muito pouco ou quase nada. Se a posição pessoal fosse oposta, se não se esperasse quase nada do amigo,dando o máximo de si mesmo, certamente muitas amizades seriam preservadas.

A amizade é uma das maiores riquezas que tem o ser humano. O esforço que se faça por preservá-la, será largamente compensado pela correspondência espontânea do afeto que se prodigou.

Um amigo é uma riqueza imponderável que nos acompanha sempre. Nem mesmo o distanciamento ou a morte poderá abalar uma amizade conscientemente cultivada. Cada amizade é como uma planta que de semente poderá florir se dispensarmos a ela o cuidado que exige tudo aquilo que queiramos que seja permanente em nossas vidas.

Este sentimento superior deve ser despojado de qualquer interesse pessoal ou mesquinhez, começando por sermos amigos de nós mesmos, ensaiando as gentilezas, a sinceridade e o afeto com nossa própria pessoa, e quem sabe este sentimento deixe de ser palavra morta, expressão literária, e possamos experimentá-lo em sua plenitude em nossos corações.

Nagib Anderáos Neto

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Nagib Anderáos Neto
Enviado por Nagib Anderáos Neto em 18/04/2007
Código do texto: T454595