UTOPIA DE PRIMEIRO MUNDO

Sempre gosto de fazer a analogia do Brasil com uma pirâmide. No topo junto com a elite, estão nossos legisladores e governantes. Esses sofrem de uma cegueira contagiosa. Com a capacidade de contagiar até mesmo nossos “intelectuais”, que eu diria de “quinto mundo”. E todos se enxergam morando no Primeiro.

O Brasil real que está muito distante de ser Primeiro Mundo, vive na base dessa pirâmide. Na última década e meia tentou-se através do crédito fácil e farto, colocar uma classe entre a base e o topo. Hoje, sabemos que o resultado dessa aventura foi um retumbante fracasso. A conta, outra vez, a base terá que pagar.

Nossos legisladores sofrem ainda de outro mal. A “síndrome da ditadura”. Como tiveram que enfrentar leis pesadas durante os anos dos generais, a ordem agora é amolecer sempre mais. Para distinguir a democracia da ditadura, nossos legisladores criaram um país sem punição.

Quando alguém disse que o crime estava se organizando no Brasil, nossos legisladores afrouxaram as gravatas e deram boas gargalhadas. Agora já temos uma guerra silenciosa em nossas cidades, e eles continuam rindo. Talvez, se perguntando: Guerra no Primeiro Mundo?

Em 2015, as mortes violentas causadas por crimes somaram 75 mil. Pelo tamanho do Brasil parece pouco. É muito mais do que em países vivendo conflitos declarados. É como se toda a população de Rio Negrinho, a minha cidade, fosse assassinada duas vezes. Acho que agora, já não parece tão pouco assim.

Nossos legisladores não dão a mínima para a base da pirâmide. Quando leem relatórios como o dos “Direitos Humanos”, estufam o peito e confirmam que a violência está apenas de um lado. Que a ditadura deixou seu legado nas forças de segurança.

Em Blumenau foi inaugurado um presídio, tido por todos de “Primeiro Mundo”. Na entrevista o futuro diretor disse que faltavam ainda pequenos detalhes e ajustes. Tipo calibrar a iluminação. Uau! Quantas escolas e hospitais de Primeiro Mundo nós temos? Com iluminação “calibrada”.

No Ceará algumas crianças assistiam as aulas sentadas no chão. No Amazonas, um médico fez máscaras de garrafas PET, para dois recém nascidos respirarem. Em São Paulo, um menino de dois anos morreu numa enxurrada causada por um temporal.

No Distrito Federal, bem pertinho do topo da pirâmide um pai foi morto numa tentativa de assalto, enquanto esperava os filhos na frente da escola. Quantos desses eventos constarão em futuros relatórios dos Direitos Humanos? E também nem sei se “calibrar” a iluminação dos nossos legisladores mudaria muita coisa. A cegueira é demais.