Crianças, Crianças...

Adoro crianças. De todas as formas, tamanhos e feitios. E a grande maioria delas parece ver em mim o “vô feio e simpático” que gosta delas. Difícil, muito difícil mesmo, é uma criança não sorrir para mim ou rir quando brinco com elas.
Já ouvi muitas lindas gargalhadinhas infantis ao perguntar às mocinhas de quatro ou cinco anos se já são casadas, se já estão namorando, ou onde estão os maridos delas. É um dos mais belos sons para meus ouvidos a cristalina gargalhada infantil.
Já deixei um jovem pai muito enciumado ao olhar para sua filhinha de quarenta e cinco dias, que ainda não havia dado um único sorriso em seu mês e meio de vida, abrir o maior sorrisão para mim. Sorrisão lindo e demorado. O pai ficou bravo de verdade. Procurei consolá-lo dizendo que ela havia rido de mim e não para mim. Ri muito com o ciúme do jovem pai.
Uma mãe me disse, muito orgulhosa, que sua menininha não ia com absolutamente ninguém a não ser com ela, o que lhe dava muita tranqüilidade. Eu abri os braços, a gatinha pulou neles e me deu vários beijos que eu ainda não solicitara. A mãe ficou sem saber se ria, se estava passando por mentirosa, ou se eu possuía algum poder mágico sobre crianças. Talvez eu tenha: o amor por elas.
O pai de duas gêmeas de três anos não podia entrar na USP sem que as filhas o obrigassem a levá-las à minha lanchonete. As duas gatinhas, morenas claras e lindas, absolutamente iguais, disputavam minha atenção e me enchiam de carinhos. Sem aceitar absolutamente nada que eu lhes oferecesse de balas, bombons ou sorvetes. Só queriam mesmo era ver o tiozão aqui.
Às vezes, em alguma fila de banco, uma criança me encara com expressão neutra e eu retribuo. Se ela me olha de novo, pisco um olho. Ela volta a olhar e eu pisco os dois. Na terceira vez finjo que vou mostrar a língua e ela ri. Depois disso a amizade começa a ser feita. Várias vezes já fiquei na fila com filho dos outros no braço, no maior “papo cabeça”.
Nos supermercados brinco com algumas mães mais simpáticas perguntando em que setor compraram aquela bonequinha viva que vai sentadinha no carrinho. Logo a bonequinha está conversando comigo. Geralmente me informando que não foi comprada, que é filha mesmo da mãe dela e do pai, é claro.
A filha da cabeleireira de minha mulher, a Isabela, tem quatro anos e em minha casa torna-se minha patroa. Patroa exigente e impaciente. Relaciona os discos que quer ouvir, os livrinhos infantis que tenho que ler para ela, as histórias que devo contar, e se posso ou não desligar meu computador. Ô magrelinha folgada...
As notícias tristes que vêem a toda hora pela tevê são em número incontável. Impressionante mesmo. Mas as que mais me doem, as que mais me ferem pessoalmente e profundamente, são aquelas em que as crianças, um dos mais indefesos seres da natureza, são as vítimas. Vítimas da maldade dos pais, dos policiais, dos tarados, dos parentes desalmados, dos avós amorais, dos bandidos, e de tantos outros inimigos naturais dos seres realmente humanos.
Recebo como punhaladas no peito notícias como aquela sobre o pobre menino arrastado pelo cinto de segurança, para a diversão dos monstros que assaltaram a mãe dele. Choro por dentro, sofro, envelheço, e me coloco no lugar dos pais imaginando o que eles estão sentindo, sofrendo, amargurando-se. E tenho ganas de me transformar em um vingador de fantasia, de histórias em quadrinhos, com super poderes, e cuidar com minhas próprias mãos de fazer justiça. Uma implacável e dolorosa justiça contra os assassinos e seqüestradores de crianças. Contra as mães que jogam filhos na caçamba de lixo, na lagoa da Pampulha, no lixão de um lugar qualquer. Contra um pai animalesco que se serve dos próprios filhos para saciar seus instintos animalescos.
Perco o sono ao saber sobre pessoas que têm a absurda coragem de usar crianças para sacrifícios humanos em magia negra. Coisas como essa, absurdos como esse, reforçam cada vez mais minha teoria de que céu, inferno e purgatório existem. E estão localizados aqui mesmo, na Terra. Aqui nós temos os Anjos, os Demônios, os Santos, e o Deus que está localizado dentro de cada um de nós. Ou não.
Fernando Brandi
Enviado por Fernando Brandi em 08/07/2007
Reeditado em 29/07/2007
Código do texto: T556285
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