Polivalência: a poesia concretista de Pedro Xisto

Diego Guimarães*

Considerado um dos principais poetas do movimento concretista, Pedro Xisto faz uma imersão na experimentação visual, característica plena dos vanguardistas, que defendiam a racionalidade e rejeitava o investimento lírico e romântico. Pedro Xisto Pereira de Carvalho nasceu em Limoeiro, Pernambuco, formou-se em direito e mesclou em sua vida o oficio de procurador ao oficio poético produzindo haikais, poemas concretos e criações visuais. Farei neste momento uma adjacente análise acerca de uma de suas mais interessantes obras, que institui e concretiza o movimento e seus intuitos, o poema Epithalamium II.

O poema apresenta elementos pertencentes ao âmbito da cultura letrada, visto que sua estrutura exige do leitor não tão somente o suporte de sua língua, mas não obstante, de elementos atinentes à cultura global. O poema se embasa na palavra She dialeto inglês, obtendo desta forma a alusão a: serpens (S), homo (h) e Eva (e) e he (ele), & (e) e She (ela). Bakhtin afirma que “o artista utiliza a palavra para trabalhar o mundo, e para tanto a palavra deve ser superada de forma imanente, para tornar-se expressão do mundo dos outros e expressão de um autor com esse mundo”, (BAKHTIN, Mikhail, 1979). Desta forma, a não mera intencionalidade de Xisto mina a esfera sócio-cultural, uma vez que, no poema se estabelece a superioridade de She (a mulher), mediante ao homem (he), em ordem cultural de prevalência masculina. A recorrência ao período de surgimento do feminismo, é de tal forma cristalizada a partir do momento em que percebe-se a ruptura da consciência machista, em meados dos anos 60. O autor utiliza-se do “S” maiúsculo fazendo um enlaçamento na palavra he para expressar tal ocorrência: o sufocamento e a reação.

Com notória maestria, Pedro Xisto faz alusão, ainda com a utilização das letras/palavras pertencentes ao poema, do pecado original de Adão e Eva, à medida que recorre à composição visual fazendo a divisão entre o homem (homo/h) e Eva (e) através da serpente (serpens/S), e aí encontramos o ponto arguto do poema. Podemos cravar esta proposta mesmo antes de iniciar-mos nosso processo de compreensão cognitivo da obra, pois a essência é localizada no título, que provém do grego e significa o canto nupcial, que, por Xisto, faz a relação da segunda divisão entre o homem e a mulher, pois até então eram uma só carne. Estes valores são sustentados a partir do conceito adquirido ou forjado pelo autor. Assim, Mikhail Bakhtin definiria: “O eu e o outro constituem as categorias fundamentais de valores que pela primeira vez originam um juízo de valor real, e esse juízo, mais exatamente, a ótica axiológica da consciência, manifesta-se não só pelo ato, mas também, pela menos vivência, pela mais simples sensação: viver significa ocupar uma posição de valores em cada um dos aspectos da vida, significa ser numa ótica axiológica”, (BAKHTIN, Mikhail, 1979, p. 201/202). Interessantemente, Xisto revela a pluralidade lexical, de tal forma que a letra “S”, representando no plano “Serpente”, adquire, mediante a recorrência ao léxico inglês, a equivalência a palavra Sin¹, de justa propriedade do ser tentador do homem e da mulher.

Ainda com a utilização dos signos, Pedro Xisto permeia e permite a relação de disputa no cenário profissional entre o homem e a mulher; desta forma, representado pelo símbolo “&”², faz alusão ao combate que visa o poder econômico e que até então era firmado pela supremacia do sexo masculino. Mostra que as distâncias afetivas entre o homem a mulher estão maiores, e o que os aproxima, é somente o anseio monetário.

“Sem forma revolucionária não há arte revolucionária”, (MAIAKOVSKI, Vladimir, 1922). Esta proposta, posta em evidência pelos poetas concretistas, é justificado nas obras vanguardistas, em que há a formação intrínseca de conteúdo e forma, porém com a liberdade e possibilidade de cognição. “A forma não pode ser compreendida independentemente do conteúdo, mas ela não é tampouco independente da natureza do material e dos procedimentos que esta condiciona”, (BAKHTIN, Mikhail, 1979, p. 206). Haroldo de Campos definiu a obra concretista como: polivalente!

¹. do inglês; pecado.

². símbolo de representação comercial; sociedade.

Referências Bibliográficas

BAKHTIN, Mikhail. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2000

*Diego Guimarães de Paula Prodeliki é acadêmico graduando do Curso de Letras Português/Espanhol, das Faculdades Integradas do Brasil – UniBrasil.

Diego Guima
Enviado por Diego Guima em 08/07/2007
Reeditado em 08/07/2007
Código do texto: T556716
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