Influência em Preto e Branco na Língua Portuguesa no Brasil

INTRODUÇÃO

Sem dúvida, a base da Língua Portuguesa no Brasil foi construída na interação das línguas faladas por nossas matrizes no período colonial que, didaticamente, vai até os fins do século XVIII.

Apesar de o dominador em geral impor sua cultura, a tendência é que a língua do povo dominador sofra alterações, por receber influências da língua do povo dominado, que sobrevive através de vocábulos incorporados ao vernáculo imposto.

Num primeiro momento, a grande interação foi com a diversidade de línguas indígenas, que culminou com sistematização na Língua Geral construída pelos padres jesuítas, em especial José Anchieta, autor de mais de quatro mil textos e de gramática da língua Tupi.

Sobre a influência indígena em nosso falar, já dedicamos no trabalho “Matriz Brasil” de 2013, o artigo ”Tem Índio na Língua”.

Num segundo momento, em razão da escravidão dos negros da África no Brasil Colônia, houve importante contribuição africana na formação do que, hoje, podemos chamar de idioma brasileiro.

No artigo “Origem da Língua Portuguesa”, que faz parte deste trabalho “Mestiçagem em Preto e Branco” – 2014/15, encontramos o entendimento da Língua Portuguesa do colonizador.

Já, o objetivo maior deste, além de discorrermos de forma resumida sobre o Português do Colonizador é registrarmos a contribuição do escravo africano, para a Língua Portuguesa do Brasil.

A LÍNGUA PORTUGUESA DO COLONIZADOR

Como vimos em “Origem da Língua Portuguesa”, a invasão determinante sofrida pelos iberos para a construção da língua portuguesa foi a dos romanos.

Assim, o núcleo da língua portuguesa foi o latim vulgar falado pelos invasores. Entretanto, tanto a primeira influência, quando da invasão celta, como todas as outras invasões à Península deixaram suas contribuições, para o falar e o escrever trazido por nossos colonizadores.

Além disso, o próprio latim vulgar sofreu influências e transformações com o enfraquecimento e queda do império romano e com a interação com o lusitano invadido.

Então, o falar de nosso colonizador trazia termos de várias origens, em especial do latim tais como: água, amor, anjo, bacilo, báculo, casa, diabo, enfermo, estelionato, estilo, filho, imbecil, incesto, lei, jornal, mãe, noite, ônibus, ouvir, pai, pão, perdoar, precoce, prematuro, regra, reino, sardinha, sossegar, virgem...

Dos celtas: abrunho, bico, briga, brio, cais, camisa, canto ...

Dos suevos e visigóticos: agasalhar, agasalho, bando, branco, dardo, elmo, estribo, guardar, guerra, grupo, roupa, sopa...

Dos árabes: álcool, alcachofra, algodão, alicate, álgebra, alface, alfândega, armazém, almanaque , almirante...

INFLUÊNCIA DO NEGRO ESCRAVO NO FALAR BRASILEIRO

PROTAGONISTAS

Do século XVI ao século XIX, o Brasil recebeu quatro a cinco milhões de falantes africanos, aqui trazidos como escravos. Os homens principalmente para as monoculturas da cana e do café e para a mineração. As mulheres, principalmente para com seus ventres garantirem a reposição da força de trabalho.

Vieram praticamente de toda a África, entretanto destacam-se dois grandes grupos: o banto e o sudanês.

A região banto compreende grupo de 300 línguas muito semelhantes. Entre elas, as de maior número de falantes no Brasil foram o quicongo, o quimbundo e o umbundo. O quicongo é falado na República Popular do Congo, na República Democrática do Congo e no norte de Angola. O quimbundo é a língua da região central de Angola. O umbundo é falado no sul de Angola e em Zâmbia.

Quanto às línguas oeste-africanas, chamadas de “sudanesas”, as mais importantes

foram as línguas da família kwa, faladas no Golfo do Benim. Seus principais representantes no Brasil foram os iorubás e os povos de línguas do grupo ewe-fon que foram apelidados pelo tráfico, de minas ou jejes.

O iorubá é uma língua única, constituída por um grupo de falares regionais concentrados no sudoeste da Nigéria (ijexá, oió, ifé, ondô, etc.) e no antigo Reino de Queto (Ketu), hoje, no Benim, onde é chamada de nagô, denominação pela qual os iorubás ficaram tradicionalmente conhecidos no Brasil. Já o ewe-fon é um conjunto de línguas (mina, ewe, gun, fon, mahi) muito parecidas e faladas em territórios de Gana, Togo e Benim.

No que concerne à influência banto, ela é muito mais profunda em razão da antiguidade do povo banto no Brasil, denominado tradicionalmente de congo-angola, da densidade demográfica e amplitude geográfica alcançada pela sua distribuição humana em território brasileiro.

Então, dentre a diversidade de línguas africanas foram: quicongo; quimbundo; umbundo; o iorubá; e o ewe-fon as protagonistas da influência africana no português do Brasil.

Com seus prefixos ordenadores como: mu; ku; e ka contribuíram com inúmeros vocábulos para o português do Brasil.

O PROCESSO

Não nos foi possível tentar explicar o processo de participação do africano na construção da língua portuguesa do Brasil sem nos reportarmos ao símbolo construído por Gilberto Freyre das relações sociais do período colonial, “casa grande – senzala”.

Na casa-grande os escravos eram preferidos para os trabalhos domésticos, privando de intimidade, nas senzalas sofriam as demonstrações de domínio, como autoritarismo, rígida disciplina e arbitrariedade.

Nesse processo de objetivação da influência do escravo em nosso falar, destacam-se a atuação da mulher negra no seio da família colonial e dos negros “ladinos” junto à escravaria. “Ladinos” eram aqueles que logo cedo aprendiam a falar rudimentos de português e participavam dos dois ambientes linguísticos.

Nesses dois ambientes a língua falada conservou-se por algum tempo dividida em duas: a falada nas casas-grandes, outra, nas senzalas. Entretanto um conjunto de relações, quase cumplicidades, acabou com essa dualidade: a ama com o menino; o sinhozinho com o moleque; os ladinos num leva e trás vocabular; a mucama com a sinhá moça; e o sinhô e a mucama.

Gilberto Freyre em “Casa Grande e Senzala” deixa muito claro que as línguas africanas dissolveram-se no idioma aqui falado enriquecendo-o e, até, substituindo com vantagem vocábulos português, como que gastos, puídos pelo uso.

Acrescenta que a influência africana amoleceu nosso falar e exemplifica com: a linguagem infantil muito influenciada pela ama negra (dodói, neném, cocô...); os apelidos de nomes próprios (Toninho, Chico, Betinho...); e a variação de colocação do pronome ( “faça-me”, é o senhor falando; o pai; o patriarca; “me dê”, é o escravo, a mulher, o filho, a mucama).

Então, foi assim que a construção do império português e sua necessidade de mão de obra para implantar a Colônia e realizar os interesses comerciais da Coroa, trouxeram uma de nossas matrizes e, com ela, sua contribuição na formação do português mestiço brasileiro.

CONTRIBUIÇÃO AO IDIOMA BRASILEIRO

No Vocabulário

O resultado da mestiçagem do português europeu, trazido pelo colonizador, com as línguas trazidas pelo escravo foi extenso número de palavras incorporadas ao nosso léxico, especialmente as relativas a:

Divindades, conceitos e práticas religiosas, axé, candomblé, canjerê, gongá ( ou congá); Iemanjá, macumba, mandinga, Oxalá, Ogum, pomba-gira, Quimbanda, Umbanda e Xangô;

Comidas e bebidas (muitas delas, originariamente, comidas e bebidas-de-santo, que depois se popularizaram na nossa culinária, notadamente na baiana) - acarajé, cachaça, canjica, caruru, dendê; farofa, fubá, mocotó, mungunzá, quibebe, quindim, quitute e vatapá;

Nomes de lugares e locais - Bangu, cacimba, Carangola, Caxambu, Guandu, mocambo, murundu , Muzambinho, S. Luís do Quitunde; quilombo, e senzala;

Roupas, danças e instrumentos musicais - agogô, batuque, berimbau, canga, caxambu, cuíca, jongo, lundu, macumba (antigo instrumento de percussão), marimba, maxixe, miçanga, samba, sunga e tanga;

Animais, plantas e frutos - camundongo, caxinguelê, dendê, jiló, macaco, maconha, mangangá, marimbondo, maxixe, mutamba e quiabo;

Deformidades, doenças, partes do corpo – banguela, bunda, cacunda (corcunda), capenga, calombo, calundu, caxumba e gogó.

instrumentos, utensílios, ferramentas, veículos - cachimbo, caçamba, carimbo e moringa;

Verbos – cochilar, mangar e xingar;

Apelidos a Nomes – Bebeto, Chico, Chicó, Dedé, maroca, Noca, Toninho, Totonha, Nezinho, Mandu ...

Específicos às Crianças - au-au, bambanho, bumbum, bimbinha, cacá, cocô, dindinho, neném, papá, papato, pipi e tatá.

Outros - abadá, babaca, banguê, banzé, banzo, bozó,caçula, cafajeste, cafofo, cafundó, cafuné, cambada, candango, capanga, catinga, dengo, lubambo, malungo, mandinga, moleque, muamba, mucambo, mucama, mulambo, munganga, muquirana, muvuca, quengo, quitanda e zumbi.

Na forma de falar

Não são raros os brasileiros que omitem a consoante final, ou que incluem vogais, ou ainda que excluem consoantes: falá, em vez de falar; dizê, em vez de dizer; adivogado, em vez de advogado; fulo, em vez de flor, memo, em vez de mesmo.

Esse desvio no modo de falar é justificado pela construção das palavras no banto não terem encontros consonantais, não terminarem em consoantes e sempre alternando consoante, vogal, consoante, vogal...

CONCLUSÃO

A mestiçagem em preto e branco está presente em nosso falar.

O idioma português do Brasil foi influenciado e construiu suas bases no período colonial.

Impossível à diversidade de línguas nativas e africanas resistir ao idioma do colonizador

Entretanto, o idioma imperativo do colonizador foi amaciado como podemos constatar em expressões como: lili; mimi; tentem; tatá; iaiá, ioiô... E nas formas quase maternas de reduzir os nomes como: beto, betinho, bebeto, para Alberto; Dondon, Toninho, Totonho para Antônio; Nezinho, Mandu, Manduca; Mané, para Manuel; Chico, Chiquinho, Chicó, para Francisco;

O idioma do colonizador cedeu à doçura das amas de leite, a alegria dos moleques, à sagacidade dos ”ladinos”, a cumplicidade das amas e às intimidades impostas às mucamas. Nessa teia de relações, nessa miscigenação, o idioma português do colonizador foi irresistivelmente influenciado pelo falar africano.

Certamente, o falar nosso dominante, português do Brasil, foi resultado de miscigenação linguística resultante do caldeamento étnico, que originou esse povo mestiço a caminho da formação de espécie de etnia síntese planetária.

FONTES

Livro: Casa Grande e Senzala – Gilberto Freyre

Sites:

afreaka.com.br;

educacao.salvador.ba.gov.br;

naturezareflexiva.blogspot.com.br; e

pt.wikipedia.org

J Coelho
Enviado por J Coelho em 27/10/2016
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