Criação de Mundos de Fantasia: Os deuses

Segundo artigo da série sobre criação de mundos de fantasia, agora falando sobre os pantões.

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Deuses em mundos fantásticos

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Um mundo de fantasia não precisa ser necessariamente uma série de invenções malucas da cabeça de um jogador de RPG ou de um escritor. Muitas vezes, esse excesso de imaginação sem nexo acaba retirando um pouco da conexão e identificação do leitor. O mundo fica “viajado” demais. Uma ótima alternativa para fundamentar o mundo são as referências históricas ou mitológicas.

A começar pelas mitológicas, elas se tornam óbvias em mundos como a Terra Média. Nem é preciso se estender em comentários sobre a influência da mitologia nórdica na criação dos elfos e anões de Tolkien. Os panteões pagãos das variadas culturas da Terra também são ótimas referências para se criar os deuses de mundos de fantasia, principalmente porque podem se tornar guias que evitarão a criação de deuses desnecessários, com funções limitadas ou que são simplesmente um sujeito com um nome legal.

A criação de um panteão e das criaturas do mundo de fantasia pode ser conectada, por exemplo, com a mitologia grega, fonte de grande inspiração. Os deuses gregos possuíam versões e nomes variados pelas cidades-estado, às vezes tendo funções ligeiramente diferentes, mas continuando, em essência como a mesma divindade. Esse conceito pode ser facilmente usado para se evitar uma superlotação de deuses e clérigos no mundo de fantasia. Muitas vezes, existem tantas divindades que a maioria fica sub-aproveitada e seus sacerdotes nada são do que pessoas que cumprem apenas uma função muito específica nas aventuras, como existirem apenas para curarem os heróis de uma doença.

Essa idéia não limita a diversidade. Nota-se tanto pelo exemplo grego quanto por um mais próximo do nosso. O cristianismo, o islamismo e o judaísmo possuem a mesma divindade, mas enxergam-na de maneiras diversas com correntes de pensamento diferentes mesmo dentro de cada uma dessas religiões. Existem guerras e mais guerras religiosas por causa dessas diferenças.

Uma outra vantagem é que geralmente há uma certa lógica na criação e desenvolvimento nas mitologias da Terra. Os deuses ocupam espaços específicos e necessários para o povo em questão. Baseando-se nas mesmas, evita-se o esquecimento de algumas divindades em prol de outras. Estamos muito acostumados e enxergar deuses da justiça, da guerra, da morte e da cura em mundos de fantasia, pois são os que mais interessam para muitos aventureiros, mas e as divindades do clima, da agricultura, comércio, maternidade e outros? Eles nem precisam ser deuses específicos, mas podem ser como Hermes, deus grego mensageiro que no entanto também influenciava comércio, viagens, conhecimento, conforme a fonte relatada.

Já vi diversos panteões de mundo de fantasia em que os deuses mais poderosos tomam conta de funções extremamente específicas e às vezes nem tão compreensíveis. Existem panteões com deuses da guerra diversos que dividem esse conceito com outros em um mundo em que a guerra em si nem sempre é uma verdade maior (existem combates em mundos de fantasia, mas nem todos possuem muitas guerras).

O conceito de Ares, por exemplo, pode ser aplicado. Ele era um deus da guerra, mas tinha pouquíssimos centros de culto, servindo mais como lendas e referências. Nem mesmo em Esparta ele era louvado. A cidade tinha um apego especial por Zeus, Apolo, Atena e Ártemis, sendo que sacrificava para essa última antes da carga das falanges. Esses deuses possuíam outros aspectos da guerra e nenhum era exclusivamente um guerreiro. Ares também era visto como senhor da violência servia mais como um mal exemplo do que como uma divindade a se seguir. E isso em uma cultura em que a guerra era um dos pontos de maior importância (em média, cidades gregas raramente passavam mais de 2 ou 3 anos sem partir para a guerra).

O exemplo grego mostra que um deus específico da guerra pode acabar eclipsado por outras divindades de caráter parecido e que ainda abordem conceitos mais amplos, o que limita a necessidade de um grande e poderoso deus da guerra em um panteão. Este pode ser colocado até como uma divindade de poder médio ou, ainda, de poder menor em mundos em que a guerra não seja uma primazia.