HABEAS CORPUS PREVENTIVO: ESCRITO COM TINTA AZUL OU VERMELHA?

RESUMO: O artigo aborda no tocante à um dos remédios constitucionais que deveria ter como escopo cidadãos que realmente estejam sofrendo coação por parte de autoridades que cometem abusos contra pessoas interferindo no direito de ir e vir destes, o Habeas Corpus Preventivo ganhou notoriedade sendo usado por políticos, diretores de estatais e funcionários do alto escalão governamental para assegurar o silêncio de tais autoridades e fatalmente a impunidade destes.

PALAVRAS-CHAVE: TINTA AZUL E VERMELHA; HABEAS CORPUS, REMÉDIOS CONSTITUCIONAL

1) INTRODUÇÃO: No contexto dos remédios constitucionais está o Habeas Corpus Preventivo que é emitido pelo juiz à um depoente que necessita da garantia de manter o silêncio quando for questionado e não dispuser de meios técnicos para elaborar sua defesa, pois ninguém pode ser coagido a produzir provas contra si mesmo e isto está disposto na Constituição Federal de 1988 no artigo 5º, LXIII, ou seja o princípio” nemo tenetur se detegere” . Porém, cabe indagar se o habeas corpus constitui um direito ou uma garantia e outro fator determinante é que. A própria Constituição Federal, no artigo 142, §2º, cuidou de estabelecer uma única causa impeditiva de impetração de habeas corpus. Prevê o disposto citado que não caberá o remédio heroico em relação a punições disciplinares militares.

(MAXIMIANO, p.22)

A norma que deveria ter alcance pleno à todos aqueles que de fato a solicitam, invariavelmente tem sido usada nesta década por autoridades que pilharam o Estado e com a blindagem deste remédio continuam cometendo desfalque nos cofres públicos e bem longe das barras de celas que deveriam pôr um fim nestes péssimos representantes da sociedade.

Na esfera legal o Habeas Corpus é balizado pelos artigos 647 a 667 do Decreto-Lei nº 3.689/1941 (Código de Processo Penal CPP) e pelo artigo 23 da lei 8.038/1990 que reforça a aplicação das disposições do Código de Processo Penal que toca a competência do remédio no Supremo Tribunal Federal. (HETSPER)

Na doutrina de Hélio Tornagui o Habeas Corpus, remonta do Direito inglês, mais especificamente À Magna Carta- Magna Charta Libertatum, promulgada em 19 de julho de 1215 pelo rei João Sem Terra, cedida frente as pressões dos barões, dos condes e do clero.

A previsão vinha no artigo 48, verbis:

“Ninguém poderá ser detido, preso ou despojado de seus bens, costumes e liberdades, senão em virtude de julgamento de seus pares de acordo com a lei.”

Completa Beccaria:

Se se estabelecem esse método para avitar sugerir ao acusado uma resposta que o salve, ou por que foi considerada coisa monstruosa e contra a natureza um homem acusar-se a si mesmo, qualquer que tenha sido o fim visado com a proibição dos interrogatórios sugestivos.

(BECCARIA, p. 473)

Neste breve histórico percebe-se a verdadeira função do Habeas Corpus, um remédio que deveria garantir a proteção daqueles que são explorados pelos poderosos indo parar nas mãos dos próprios poderosos sob a alegação do princípio da isonomia, ou melhor, do devido processo legal.

Não é a primeira vez que o Estado brasileiro é arrebatado por pedidos de Habeas Corpus Preventivo e parece até que existe um tribunal de plantão para a expedição deste remédio constitucional.

Este artigo jurídico não tem como alvo criar alarde contra a expedição de remédios constitucionais dessa natureza para aqueles que utilizaram toda má-fé para saquear o Estado, agindo como canibais do povo e com a certeza de que estando de posse deste documento sua liberdade estará assegurada, resta saber se ao escrever um Habeas Corpus Preventivo à um político ou funcionário público do alto escalão o juiz usa tinta azul ou tinta vermelha, com bem expõe Vitore André:

Não deixa de ser salvo-conduto a decisão do STF de permitir que determinas pessoas, suspeitas de haver cometido infração penal exerçam o direito ao silêncio ao serem ouvidas por comissão Parlamentar de Inquérito, visto que, em tais hipóteses, não poderão ser presas por falso testemunho (art. 342 do CP)

(Z. MAXIMIANO)

Raramente, através da mídia se ouve falar que um detento sem condições de suportar assessoria jurídica foi beneficiado com este tipo de remédio constitucional ou uma testemunha com a capacidade cognitiva abaixo do nível de homem médio ser beneficiada com esta ação. Nas questões em que realmente seria necessário o depoimento de pessoas suspeitas de fraudar, desviar, corromper, traficar influência e todo tipo de crime pernicioso contra a ordem pública nada se apura por que os envolvidos muito bem orientados já chegam no plenário munidos do Habeas Corpus Preventivo dando-lhes plena liberdade para escolher quais e como os tipos de perguntas irão responder. Não se sabe se o Habeas Corpus foi escrito com tinta azul ou tinta vermelha.

O Ministro Cezar Peluzo no ano de 2005 fez consignar na parte final de sua decisão:

Isto posto, concedo liminar para garantir ao paciente, sempre convocado a depor perante a já aludida Comissão, o direito de se fazer acompanhar de advogado (s), e o direito de não ser preso em decorrência da invocação do direito constitucional de não auto-incriminar-se com a prerrogativa de permanecer em silêncio, se, da resposta à pergunta, puder, a seu critério ou a critério de seu (s) advogado (s), derivar-lhes visa de auto-incriminação. Com urgência, comunique-se â autoridade, solicitando-lhe informações, e expeça-se salvo-conduto

( HC 87.066/DF)

Há anos e anos a mesma técnica de impunidade vem se arrastando e deixando pessoas que deveriam representar aqueles que depositaram sua confiança através do sufrágio e que após um curto período de tempo descobrem-se traídas e que seus achacadores ficaram gozando de liberdade por terem a garantia do Habeas Corpus Preventivo.

Nesse diapasão toda responsabilidade cai sobre os ombros do eleitor que a imprensa marrom descreve com único causador de toda má sorte empregada por políticos desonestos e a tática da imprensa marrom é escrever com tinta vermelha.

Para estes senhores, pseudos representantes só resta uma ferramenta capaz de coloca-los no devido lugar, esta alternativa seria a mesma usada em países politicamente desenvolvidos, onde o mesmo cidadão que elegeu seu representante tem nas mãos o poder de extirpá-lo do cargo, entretanto essa arma, ainda, não pode ser usada no Brasil por falta de segurança institucional. Esta Bala de Prata seria o Recall, como o chamam os americanos, ou de “chamar de volta” o seu voto, de “retomar” o mandato, de “dar um cartão vermelho” ao representante eleito.

Percorrendo rapidamente o campo do jornalismo, observem o que diz Fernão Lara Mesquita sobre o tema:

Pra começar a conversa das reformas, então, se com plebiscito está jurado que levaremos gato por lebre e sem plebiscito o canal que sobra é o dos próprios beneficiários das perversões do sistema atual, que jamais se disporão a alterná-lo? A saída dessa sinuca de bico está em redefinir apenas a norma que regula a relação de cada um de nós com o nosso representante eleito. Esta, sim, pode ser reduzida a uma pergunta simples, sem nenhuma implicação outra se não a que está expressamente contida na sua própria formulação e ir a plebiscito com totais segurança e adequação entre forma e função. Assim: “Você é a favor do direito de retomada a qualquer momento do mandato atribuído ao seu representante eleito por votação distrital?”

(MESQUITA, p. A2)

Interpretando a explanação do jornalista, conclui-se que ele usou tinta azul para escrever a matéria.

Já polícia usa tinta azul na investigação, apura e prende. A justiça manda soltar para ser analisado pela Casa responsável (Senado ou Câmara dos deputados), prescreve-se o prazo para cassação e quando um deles é intimado a depor surge a salvação através do Habeas Corpus Preventivo e mais uma vez a imprensa que na maioria das vezes usa tinta vermelha em suas matérias sacrifica o eleitor e como a cultura política do Brasil para a grande maioria da população não é de interesse da massa as roubalheiras, os descasos vão acontecendo sem que os responsáveis pela falta de medicamentos em hospitais, pela falta de merenda nas escolas, pela falta de segurança pública entre outras necessidades da população paguem por seus delitos muito mais sérios do aqueles cometidos no dia-a-dia.

Este é o momento de se usar tinta azul para mudar essa realidade e isso se faz na urna, mas com vontade e consciência de mudar.

Uma parte será feita pela população e a outra parte por nós futuros operadores do Direito.

2) CONSIDERAÇÕES FINAIS

Após o deslinde que versa sobre habeas corpus preventivo resta questionar se este remédio constitucional é um direito ou uma garantia.

Vitore André explica que:

Direitos são preceitos de caráter declaratório ou enunciativo, enquanto que garantias são marcadas pelo conteúdo assecuratório dos direitos, ou seja, são meios voltados para a obtenção ou reparação de direitos. Os remédios constitucionais, dentre os quais o habeas corpus, são medidas assecuratórias, razão pela qual devem ser classificadas como verdadeiras garantias que visam a corrigir violações a direitos. De qualquer forma, vale destacar que na Constituição Federal há dispositivos declaratórios (direitos) e outros assecuratórios (garantias), formando-se assim um essencial dualismo, em que direitos e garantias são indispensáveis para a vida das pessoas. Nesse contexto, pode-se sustentar que o habeas corpus tem natureza jurídica de ação e apresenta-se como garantia para proteção à liberdade.

(MAXIMIANO,p.22)

A partir de todo conteúdo deste artigo, se faz necessário refletir sobre quem mais se beneficia do habeas corpus preventivo. Este pensamento deve sobressair-se do campo jurídico e ser analisado concomitantemente com o sistema político nacional que tristemente encontra-se totalmente eivado. Será preciso anos, talvez décadas para fazer uma assepsia e superar a corrupção, e como tudo, via de regra, tem um início, devem os operadores do Direito dar o primeiro passo garantido às gerações futuras um país mais justo e que aplique uma política digna oferecendo oportunidades igualitárias à todos que fizerem por merecê-la.

Ao longo deste artigo jurídico foi usada a frase tinta azul ou tinta vermelha para aludir a determinadas situações.

Isto vem de Slavoj Zizek que costumava narrar o seguinte fato:

Nos tempos férreos do socialismo burocrático leste-europeu, um cidadão é condenado à prisão na Sibéria. Antes de partir ele combina com seus amigos um código para enganar a censura que certamente vigiará suas cartas. Se a tinta com a qual a carta for escrita for azul seu conteúdo é verdadeiro, mas se a tinta usada na carta for vermelha saberá tratar-se de mentira. Alguns meses depois chega a primeira missiva. E ela está escrita com o azul da verdade: “ Aqui na Sibéria vai tudo bem. As mulheres são belas e fartas. Os guardas são cordiais. O clima é ameno e encontramos toda sorte de mantimentos com grande variedade de filmes nos cinemas. Temos toda liberdade que desejamos, a única coisa que nos falta é tinta vermelha.

(ZIZEK, p.42)

3) BIBLIOGRAFIA

BECCARIA, César-Dos Delitos e das Penas, p.473.

Editora SA2 Digital.

FEDERAL, Constituição, 1988, artigo 5º, LXIX.

HC. 87.066/DF, rel. Min. Cezar Peluzo, 05-10-2005

HETSPER, Rafael Vargas-www.ambitojuridico.com.br

Acessado em 07-09-2014.

MAXIMIANO, Vitore André Z.-Coleção Prática Juridica.

1º edição, ed. Saraiva.

MESQUITA, Fernão Lara- Jornal O Estado de São Paulo, p. A2.

Edição de 21H10, nº 44220, quarta-feira, 12 de novembro de 2014.

TORNAGUI, Hélio (1988, p.401)

ZIZEK, Slavoj-Revista Filosofia, p.42

Editora escala, ano 2014.

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 03/03/2018
Reeditado em 03/03/2018
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