A INJUSTIÇA DO JUIZ A PARTIR DA QUESTÃO 67 DA SUMA TEOLÓGICA DE SÃO TOMÁS DE AQUINO

Pedro Francisco Xavier Neto

Prof. Dr. Lino Rampazzo

RESUMO

O presente artigo tem como propósito investigar e apresentar a injustiça cometida pelo juiz, segundo São Tomás de Aquino, a partir da questão 67 da Suma Teológica. A ética e a justiça são bastante faladas na atualidade, portanto, é significativo retomar a reflexão de autores como São Tomás de Aquino, visto que não faltam quadros de injustiças cometidos inclusive por juízes. Nesse artigo, será considerado o que o autor da Suma Teológica diz a esse respeito. Inicia-se com alguns traços biográficos do filósofo, bem como um breve relato sobre a obra e como esta se divide. Em seguida, faz-se uma breve apresentação geral do conceito de justiça e injustiça no pensamento tomasiano, conforme está contido na Suma Teológica. Ainda, antes de adentrar especificadamente na injustiça do juiz, é exposto como Tomás de Aquino concebe o julgamento, que consiste em fazer um reequilíbrio entre partes, conforme abordado na questão 60, da respectiva obra. Finalmente, discorre-se sobre as injustiças cometidas pelo juiz no julgamento, mostrando como evitá-las e, por consequência, um julgamento justo, ou seja, baseado na igualdade.

Palavras-chave: Tomás de Aquino. Justiça. Injustiça. Julgamento. Juiz.

INTRODUÇÃO

O tema da ética é tratado na segunda parte da Suma Teológica de São Tomás de Aquino. Dentro desse tema, destaca-se a questão da Justiça, à qual ele dedica 66 questões. O aquinatense trata do tema da justiça e da injustiça na secunda parte da Segunda (secunda secundae II-II) da referida obra e dedica um número considerável de questões para tratar desse assunto, se compararmos com as outras virtudes.

Dessa forma, o presente artigo está organizado em quatro itens. Inicialmente, faz-se uma abordagem histórico-biográfica de Tomás de Aquino, mostrando um pouco do contexto em que ele nasceu e viveu e que o influenciou na construção do seu pensamento. Dentro da primeira parte, ainda, apresenta-se a Suma Teológica e mostra-se como está dividida de uma maneira geral, para situar o leitor no tema abordado.

No segundo item, o conceito de injustiça e de justiça é apresentado, segundo o pensamento tomasiano. Esta é dar a cada um o que lhe pertence, ou seja, igualdade, e aquela é o contrário, desigualdade. Justo, então, seria dar a cada um o que lhe pertence, o que lhe é de direito. Antes de adentrar no tema específico do artigo, aborda-se a questão 60, sobre o julgamento justo, que nada mais é do que o ato do juiz de tomar decisões sem ultrapassar seus limites. Quando a igualdade é quebrada, é preciso fazer um reequilíbrio entre as partes, de acordo com a Lei escrita.

Por fim, o último item refere-se ao tema do juiz injusto, abordado na questão 67. Essa questão, composta por quatro artigos, analisa se o juiz sem injustiça pode julgar alguém que não lhe seja súdito, se pode julgar contra a verdade que conhece, baseando-se nas informações do processo, se pode condenar sem injustiça a quem não é acusado e se pode relaxar a pena do réu. Nas respostas a essas questões, será levado em conta que o juiz não age como pessoa privada, mas como alguém que busca o bem comum. Caso contrário, seria injusto.

1 TOMÁS DE AQUINO

1.1 VIDA

Tomás de Aquino nasceu em Roccasecca no ano de 1225, era de família nobre, filho de Landolfo e Teodora. Como era de costume da época, foi levado para fazer seus estudos primários na abadia de Montecassino, a fim de contribuir para o brilho do nome da família. Por conta da decadência da abadia, que estava em um estado de abandono, Tomás prosseguiu seus estudos em Nápoles. (HUISMAN, 2001).

Chegando a Nápoles, teve o seu primeiro contato com os dominicanos, que se dedicavam ao estudo e ao ensino em Universidades. Ele viu, na Ordem Dominicana, uma nova forma de vida religiosa: envolvida no debate cultural e livre de interesses mundanos. E mesmo contra a opinião da família, ingressou na Ordem. (REALE; ANTISERI, 2003).

Em Paris, continuou a sua formação teológica, tendo como mestre Alberto Magno, que não hesitou em encaminhá-lo para a carreira acadêmica na Universidade de Paris, onde lecionou e em 1256 recebeu o título de magister em teologia. É o que afirma Reale: “Em 1252, quando o mestre-geral da ordem solicitou um jovem bacharel (hoje, se diria professor-assistente) para encaminhar à carreira acadêmica na Universidade de Paris, Alberto não hesitou em indicar Tomás.” (REALE; ANTISERI, 2003, p. 212).

Além de Paris, Aquino peregrinou por várias universidades da Europa. Huisman, constata que vários papas foram seus amigos íntimos, inclusive, Tomás de Aquino faleceu quando viajava para Lião a pedido de Gregório X:

Foi surpreendido pela morte aos 53 anos, em 7 de março de 1274, no mosteiro cisterciense de Fossanova, quando viajava para Lião, para onde ia por ode do papa Gregório X, precisamente para participar de um concílio. (REALE; ANTISERI, 2003, p. 212).

Em todas as obras de Tomás de Aquino, existe uma intenção de ir contra aqueles que fazem mau uso da razão, diminuindo o seu valor. Para o santo, era necessário demarcar, com precisão, esse território, para impedir que a razão ultrapasse os limites da fé. (PENSADORES, 2004). Tomás de Aquino tem uma vasta obra que é resultado da sua vida dedicada ao ensino. Nesse sentido assim ele escreveu:

Muitos de seus textos são comentários de livros da bíblia, dos santos padres, de Aristóteles e outros autores. Há também breves tratados sobre assuntos específicos, como O Ente e a Essência e Questões Discutidas sobre a Verdade. Por fim, as duas Sumas: a Suma contra os Gentios é um manual de teologia destinado a converter os mulçumanos, e a Suma Teológica, embora inacabada, sintetiza o pensamento tomista. (PENSADORES, 2004, p.117).

1.2 SUMA TEOLÓGICA

Pode-se afirmar que a Suma Teológica, iniciada em Roma, é a principal obra de São Tomás de Aquino. Ela é composta de três partes, que ao todo contém 512 questões e 2.669 artigos. Huisman (2000) faz uma síntese do que trata cada uma dessas partes: a primeira parte podemos chamar de dogmática, uma vez que fala de Deus, criador de todas as coisas e do Deus uno e trino, ou seja, do mistério da Trindade. Na segunda parte, é abordado o problema da ética, mostrando que o homem é dotado de razão e precisa amar a Deus para ser feliz. A terceira parte, que não foi concluída por conta da sua morte, trata do mistério de Cristo salvador.

Neste artigo, pretende-se falar do tema da Justiça no juízo, que se encontra na segunda parte. Para que o leitor se situe melhor, vale destacar que a segunda parte está subdivida em duas partes: a primeira parte da Secunda (prima secundae I-II) e a segunda parte da Secunda (secunda secundae II-II).

Na primeira parte da Secunda (I-II), que não será tratada neste artigo, ele apresenta os princípios teológicos do agir moral, estudando a liberdade de escolha humana para praticar o bem, ajudada, também, pela lei moral. Analisam-se, nesta primeira parte, os seguintes temas: o fim último, os atos humanos, as paixões, as virtudes, os vícios e os pecados, a lei, a graça. Na secunda parte da Secunda (II-II), ele estuda as três virtudes teologais: fé, esperança e caridade, seguidas de um exame de mais de cinquenta virtudes morais, que, por sua vez, estão organizadas em torno das quatro virtudes cardeais: prudência, justiça, temperança e fortaleza. Por fim, reflete sobre as diferentes vocações da Igreja. (RAMPAZZO; NAHUR, 2016).

2 O TEMA DA JUSTIÇA E INJUSTIÇA NA SUMA TEOLÓGICA

O tema da justiça e injustiça é tratado na segunda parte da Secunda (secunda secundae II-II) da Suma Teológica. Tomás de Aquino dedica a maioria das questões dessa parte, sendo mais preciso, 66 questões ao total, para tratar desse tema. A partir disso, percebe-se a sua importância.

Para apresentar o conceito de justiça e injustiça, Tomás quase que acompanhou integralmente a doutrina Aristotélica, mais precisamente do livro V da Ética a Nicômaco, pois muitos dos seus elementos foram condensados na questão 58 sobre a justiça. (VALDARES, 2010). Percebe-se isso quando o aquinatense diz que a justiça é uma virtude e o meio termo entre o excesso e a carência é a justa medida. (BITTAR; ALMEIDA, 2012). É o que afirma o aquinatense:

Por isso, o meio-termo da justiça consiste em certa igualdade de proporção da realidade exterior com a pessoa exterior. Ora a igualdade é realmente o meio-termo entre o mais e o menos, como diz Aristóteles. Logo, a justiça comporta um meio-termo real. (AQUINO, 2005, p.73).

Nader (2014) afirma que a definição de Justiça apresentada por Tomás de Aquino nada mais é que uma reprodução à de Ulpiano com o pequeno acréscimo da palavra hábito, pois ela não é um ato insolado: “Hábito pelo qual, com perpétua e constante vontade, se dá a cada um o que lhe é próprio.” Ou seja, nada mais e nada menos do que lhe é devido. Vejamos: “Como propriedades essenciais da justiça, São Tomás indicou a alteridade e o devir. A presença do outro estaria implícita no valor do justo, que pressupõe sempre uma relação de pessoas, isto é, alteridade.” (NADER, 2014, p. 167).

A justiça é a relação de igualdade entre pessoas. Esse “próprio de cada um”, não nos mostra uma simples igualdade entre coisas ou entre coisas e pessoas, mas entre pessoas, sendo que esta como virtude geral está orientada para o bem comum. (BITTAR; ALMEIDA, 2012). É o que percebemos no texto da Suma Teológica:

Assim o bem de cada virtude, quer ordene o homem para consigo mesmo, quer o ordene a outras pessoas, comporta uma referência ao bem comum, ao qual orienta a justiça. Dessa maneira, os atos de todas as virtudes podem pertencer à justiça, enquanto esta orienta o homem ao bem comum. (AQUINO, 2005, p. 63).

No texto da Suma Teológica, Tomás de Aquino afirma que o ato de justiça para que seja virtuoso deve ser voluntário, constante e perpétuo, demostrando uma firmeza nesse ato. Isto quer dizer que não basta querer respeitar a justiça em apenas um momento ou situação, é preciso, sempre, ter essa vontade de observar a justiça. Rampazzo comenta sobre o apresentado:

Mas para que o ato seja virtuoso, é necessário que seja voluntário, estável e firme. A esse respeito, ele cita Aristóteles, para quem o ato de virtude exige três condições: que o sujeito o pratique da maneira consciente, com livre escolha para um fim devido; e de maneira constante. Mas a primeira destas condições está incluída na segunda, pois, sempre segundo Aristóteles, o que fazemos por ignorância é involuntário. Por isso, para definir a justiça, primeiro enuncia-se a vontade. Em seguida, a constância e a perpetuidade designam a estabilidade de tal ato. (RAMPAZZO, 2017, p. 13).

A injustiça, assim como todos os vícios, opõe-se ao bem comum, portanto, é um vício oposto à justiça. A igualdade é o objeto da justiça, assim o objeto da injustiça é a desigualdade. O Santo Doutor refere-se ao exposto, dizendo: “Como a igualdade nas coisas exteriores é o objeto da justiça, assim o objeto da injustiça é a desigualdade, no sentido de atribuir a alguém mais ou menos do que convém.” (AQUINO, 2005, p.79).

É importante destacar aqui que Tomás de Aquino, a partir do que assegura Aristóteles, afirma que alguém pode fazer algo de injusto, sem ser, no entanto, injusto. Isso pode acontecer de dois modos, como podemos verificar:

Por isso, se alguém comete uma injustiça, sem visá-la intencionalmente, por ignorância, por exemplo, sem pensar fazer algo de injusto, não comete formal e propriamente injustiça, mas só por acidente fazendo materialmente o que é injusto. [...] praticar a injustiça, por intenção e livre escolha, é próprio do injusto, no sentido em que se diz que injusto é o que tem o hábito da injustiça. Mas, praticar algo de injusto, sem intenção e por paixão, pode acontecer a quem não tenha o hábito da injustiça. (AQUINO, 2005, p. 79-80).

3 O JULGAMENTO

Antes de adentrar na questão da injustiça do Juiz que julga, é necessário conhecer o que é o julgamento no pensamento tomasiano: o ato pelo qual o juiz toma decisões, aplicando justiça chama-se julgamento. Ele o exerce na medida e nos limites do seu poder. No julgamento, estabelece-se o que é justo, ou seja, a igualdade que de alguma forma foi rompida e, por consequência, pede um reequilíbrio entre as partes e dá a cada um o que é seu. (BITTAR; ALMEIDA, 2012). É o que diz o Santo Doutor: “Deve-se dizer que o juiz dá a cada um o que lhe pertence, como quem manda e dirige, pois "o juiz é o direito animado," e o "príncipe é o guarda do direito", como diz Aristóteles.” (AQUINO, 2005, p. 57).

Tomás de Aquino, na Suma Teológica, afirma que o julgamento é lícito na medida em que é um ato de justiça e, para que seja classificado como tal, deve reunir alguns requisitos: que proceda de uma inclinação vinda da justiça; que emane da autoridade competente; que seja proferido segundo a reta norma da prudência. Se acontecer que algum desses requisitos venha a faltar, isto torna o juízo vicioso e ilícito.

Algo vem a ser justo de duas formas: pela própria natureza da coisa, é o que se chama de o direito natural, ou por uma certa convenção estabelecida entre os homens, o que se denomina direito positivo. A lei escrita contém o direito natural, mas não o institui, pois, ele não tira sua força da lei, mas da natureza. A lei escrita contém e institui o direito positivo e confere-lhe autoridade. Sendo assim, faz-se necessário que os julgamentos sejam proferidos de acordo com as leis escritas. Aquele que pronuncia o julgamento interpreta o texto da lei, aplicando-o a um caso particular. (AQUINO, 2005).

No terceiro artigo da questão 60, sobre o julgamento, Aquino repudia o julgamento baseado, apenas, em suspeitas. A suspeita pode constituir um ato de injustiça por proceder de indícios muito superficiais. Vale ressaltar que quando o julgador tem alguma resistência ao que está sendo julgado, deve-se evitar, ainda, a condenação por mera suspeita. (NUNES, 2011).

O artigo seguinte, da mesma questão, diz que a dúvida deve ser interpretada favoravelmente, ou seja, no melhor sentido possível, para assim evitar injustiças. Vejamos: “Por isso, enquanto os indícios de perversidade de alguém não são evidentes, devemos tê-lo como bom e interpretar no melhor sentido o que nele é duvidoso.” (AQUINO, 2005, p. 91).

4 A INJUSTIÇA DO JUIZ QUE JULGA

No início da questão 67, sobre as injustiças cometidas pelo juiz, da Suma Teológica, Tomás de Aquino passa a tratar dos vícios opostos à justiça comutativa, pelos quais se lesa o próximo por palavras, de modo específico nos julgamentos. É composta por quatro artigos, a saber: se o juiz sem injustiça julgar alguém que não lhe seja súdito; se pode julgar contra a verdade que conhece, baseando-se nas informações do processo; se pode condenar sem injustiça a quem não é acusado; se pode relaxar a pena do réu.

Tomás de Aquino afirma que na ordem das coisas humanas só aqueles que estão investidos de autoridade pública podem exercer o poder de correção sobre os seus submissos, seja em virtude de um poder ordinário ou poder delegado. No fundo, ele quer determinar e apresentar os limites de uma autoridade judicial. Vale ressaltar que pode acontecer que alguns queiram se submeter ao julgamento de outros que não sejam seus superiores, como foi o caso de Cristo, exemplificado na resposta à segunda objeção desse primeiro artigo.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos afirma que todo homem tem direito a um julgamento justo e por parte de uma jurisdição imparcial. A Constituição da República Federativa do Brasil (art. 5, LIII) garante que o cidadão não poderá ser submetido a julgamento senão perante uma autoridade pública pré-estabelecida, evitando, assim, a designação arbitrária de um juiz. (RAMPAZZO, 2015).

No segundo artigo, Tomás de Aquino afirma que o juiz, por ser uma autoridade pública, não deve julgar pelo que sabe como pessoa privada. O julgamento só é legítimo se é baseado em provas, testemunhas, documentos processuais e da experiência profissional do juiz. Caso falte algum desses elementos o juiz deve absolver o julgado. O conhecimento ou verdade que o juiz conhece pode ajudar, mas não determinar. (BITTAR; ALMEIDA, 2012). Vejamos:

Tratando- se de um caso particular, porém, a informação lhe vem mediante as peças, os testemunhas e demais documentos legítimos, que hão de ser seguidos no julgamento, mais do que a ciência que o juiz adquire como pessoa privada. Essa ciência, no entanto, poderá ajudá-lo a discutir mais rigorosamente as provas aduzidas e a desvendar-lhes os defeitos. (AQUINO, 2005, p. 174).

Rampazzo e Nahur (2015) afirmam que o juiz deve sentenciar baseado em fatos e provas, mesmo que ele possa conhecer a verdade como pessoa privada. Neste caso, ele informa a sua consciência pelo que pode ser conhecido pelo juízo público e não pela sua consciência privada, uma vez que não deve afastar-se da objetividade das provas existentes.

O terceiro artigo da referida questão trata do caso em que um juiz pode julgar mesmo quem não tem acusador. Usando as palavras de santo Ambrósio, Aquino afirma: “Não cabe ao juiz condenar, se não há acusador.” (AQUINO, 2005, p. 175). Além do mais, na resposta da questão, Aquino diz que se pratica a justiça não para si mesmo, mas para outros, ou seja, o juiz decide entre duas partes: autor e réu. Usa o exemplo de Judas, que embora fosse ladrão, não foi acusado de nada, pois não houve acusadores. E cita que até o próprio Deus, serve-se da consciência do pecador que o acusa.

O último artigo refere-se ao relaxamento da pena por parte do juiz. Este que está investido não de sua autoridade, como já foi visto, mas de autoridade pública, portanto, não pode absolver um culpado por dois motivos:

A primeira vem do acusador, que tem, às vezes, o direito de exigir a punição do réu, por exemplo, pelo dano que lhe causou. Então, nenhum juiz pode relaxar essa pena, pois todo juiz deve assegurar a cada um o seu direito. A outra razão diz respeito ao Estado, em nome do qual se exerce a justiça e cujo bem exige que os malfeitores sejam punidos. (AQUINO, 2005, p. 177).

Existe uma diferença entre juízes, segundo Tomás de Aquino: há os Juízes inferiores e o supremo juiz. Este é o príncipe que, por sua vez, tem plenamente o poder público e pode absolver o réu em duas circunstâncias: se aquele que sofreu uma injúria perdoou ou se o príncipe entender que o relaxamento da pena não prejudicará a utilidade pública. Se um juiz remir uma pena desordenadamente, poderá causar dano à comunidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pode-se concluir que o pensamento de Tomás de Aquino, no que se refere à justiça, foi influenciado quase que integralmente pela doutrina Aristotélica, como se pode perceber no livro V da Ética a Nicômaco, em que a justiça é uma virtude e o meio termo é a justa medida. Sabe-se, também que, mesmo contra a opinião da família, ingressou na Ordem dominicana, na qual percebeu que teria a oportunidade de um debate cultural e livre de interesses mundanos. O seu objetivo, em seus escritos, geralmente é ir contra aqueles que faziam mau uso da razão, diminuindo-a.

Para ele, a justiça orienta o homem para o bem comum, uma vez que busca igualdade, ou seja, dar a cada um o que é seu por direito. A injustiça é oposta ao bem comum, isto é, orientada à desigualdade. A partir disso, pode-se dizer que um julgamento justo seria aquele que busca a igualdade entre duas partes, no mínimo. Para que ele seja lícito requer que proceda de uma autoridade competente e de uma inclinação vinda da justiça, além de ser proferido segundo a prudência. A falta de um desses requisitos torna o julgamento ilícito. Vale destacar que o julgamento baseado, apenas, em suspeitas, deve ser evitado por ter conclusões muito superficiais. E para evitar injustiças, na dúvida deve ser interpretado no melhor sentido possível.

Para que o julgamento de um juiz, não seja injusto, deve ser feito por uma autoridade competente ou delegado por ela. Aí percebe-se que Tomás de Aquino tenta colocar alguns limites na autoridade do juiz. Isso é uma garantia de que o cidadão só poderá ser submetido a julgamento perante uma autoridade pública pré-estabelecida, como garante a Constituição Brasileira em seu artigo quinto.

Aquilo que o juiz sabe como pessoa privada pode ajudá-lo no julgamento. Porém, não deve ser fator determinante, pois as provas e testemunhas devem ser levadas em consideração. O juiz só pode julgar quando houver um acusador, pois a justiça é feita entre duas partes e ninguém pode fazer justiça a si mesmo. Não é justo para com aquele que foi prejudicado ou o acusador, que o culpado seja absolvido, portanto o juiz não pode relaxar uma pena. Só cabe ao príncipe, em algumas exceções, relaxar ou eliminar a pena, a saber: se aquele que sofreu uma injúria perdoou ou se o príncipe entender que o relaxamento da pena não prejudicará a utilidade pública, pois remir uma pena desordenadamente pode causar dano à comunidade, ou seja, seria uma injustiça cometida pelo juiz no julgamento.

REFERÊNCIAS

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BITTAR, Eduardo C. B; ALMEIDA, Guilherme Assis de. Curso de filosofia do direito. São Paulo: Atlas, 2012.

HUISMAN, Denis. Dicionário de obras filosóficas. São Paulo: Martins Fontes, 2000.

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NADER, Paulo. Filosofia do direito. 22. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2014.

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RAMPAZZO, Lino. A visão antropológica em Santo Tomás e o destaque do tema da justiça da Suma Teológica. Lorena: Centro Unisal, 2017. Digitado.

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______. Princípios Jurídicos e Éticos em São Tomás de Aquino. São Paulo: Paulus, 2015.

REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. Aristóteles. Trad. Ivo Storniolo. In:______. História da filosofia: patrística e escolástica. São Paulo: Paulus, 2003. cap. 7, p. 187 - 204. v.2

VALADARES, Jeferson da Costa. A justiça geral em Tomás de Aquino. Revista Dominicana de Teologia, São Paulo, n. 10, p. 93-102, jan./jun. 2010.

Pedro Xavier
Enviado por Pedro Xavier em 09/08/2018
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