O ABANDONO AFETIVO DO(A) MENOR E A AFRONTA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.

O ABANDONO AFETIVO DO(A) MENOR E A AFRONTA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE.

“A Justiça, cega para um dos dois lados, já não é Justiça. Cumpre que enxergue por igual à direita e à esquerda.”

Rui Barbosa.

RESUMO

O estudo desenvolvido no percurso deste artigo tem como objetivo analisar e discutir o abandono afetivo dos pais para com os filhos, o que acarreta total violação ao Princípio do melhor interesse da Criança e do Adolescente, uma vez que estaria em colisão a princípio constitucional e ao disposto no artigo 4º e 6º, da Lei nº 8.069/90. Utilizou-se a pesquisa em livros, análises de julgados e informativos do Superior Tribunal de Justiça para abordagem do tema. Analisa-se a importância da entidade familiar para o desenvolvimento psíquico, físico, social e intelectual da criança e do adolescente. E demonstra a colisão entre o abandono afetivo para com o princípio do melhor interesse da criança e do adolescente.

Palavras-chave: Constituição Federal/1988; Lei nº 8069/90. Abandono. Criança. Adolescente.

ABSTRACT

The study developed in the course of this article aims to analyze and discuss the affective abandonment of parents towards their children, which entails full violation of the principle of the best interests of children and adolescents, since it would be in conflict with the constitutional principle and the provisions Article 4 and 6 of Law No. 8,069 / 90. The research in books, judgments and informative analyzes of the Superior Court of Justice was used to approach the theme. The importance of the family entity for the psychic, physical, social and intellectual development of children and adolescents is analyzed. And it shows the collision between emotional abandonment to the principle of the best interests of children and adolescents.

Keywords: Federal Constitution / 1988; Law 8069/90. Abandonment. Kid. Teen.

1 INTRODUÇÃO

O ordenamento jurídico brasileiro, destaca vários princípios favoráveis à criança e ao adolescente.

Dos princípios pertinentes aos menores, salienta-se, nesta pesquisa, o melhor interesse da criança e do adolescente. Tendo como fundamentos o artigo 227 da Constituição da República, e os artigos 4º e 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente

Destaca-se, nesta pesquisa, um grande problema existente na sociedade atual, referindo-se aqui ao “Abandono Afetivo do menor”, uma vez que esta situação prejudica, consideravelmente as crianças e adolescentes, tendo em vista a necessidade de cuidado e proteção à eles, baseado na máxima do melhor interesse do menor, posto que trata-se de pessoas em situação especial, em formação de caráter e integridade, em formação de personalidade, formação moral e também psicológica, fazendo assim, por merecerem uma tutela especial, principalmente no meio familiar, ficando aqui em destaque as responsabilidades do(a)(s) pai(s)/mãe(s).

Diante o tema do abandono afetivo, é necessário destacar o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) que demonstra, claramente, por meio do enunciado 609, que o não cumprimento das obrigações dos pais em prestar auxílio afetivo, moral e psíquico, além de assistência material, caracteriza total afronta a direito fundamental da criança e do adolescente, podendo, portanto, configurar ilícito civil sendo passíveis de compensação pecuniária.

 

2 O PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DO MELHOR INTERESSE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Aqui destaca-se o Princípio do Melhor Interesse da Criança e do Adolescente, mais precisamente no artigo 227 da Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988).

Na obra “Constituição Federal Comentada e Legislação Constitucional” os autores (JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade) destacam que o Princípio do interesse superior da Criança e do Adolescente não foi inserido de maneira explicita na Constituição de 1988, mas destacam a pertinência deste Princípio (JUNIOR; NERY, 2017, p.1212).

Em estudo à Constituição Federal verifica-se a enorme proteção à família, sendo esta tratada como a base da sociedade, tendo especial proteção e prioridade ao se referir às crianças e adolescentes.

Denise Vargas (2010), trata da prioridade absoluta da criança e do adolescente, destacando a promulgação da Emenda Constitucional nº 65/2010, que além de alterar a denominação do Capítulo VII do Título VIII da Constituição Federal, modificou o seu artigo 227, cuidando dos interesses da juventude.

A Constituição Federal (Brasil, 2019) expressa seu artigo 227 da seguinte forma:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Observa-se no artigo supracitado, que a prioridade é o ser humano, em sua forma mais vulnerável. E nesse sentido, os artigos 4º e 6º do Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 2019) reforçaram o pertinente direito no seguinte contexto:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

(...)

Art. 6º Na interpretação desta Lei levar-se-ão em conta os fins sociais a que ela se dirige, as exigências do bem comum, os direitos e deveres individuais e coletivos, e a condição peculiar da criança e do adolescente como pessoas em desenvolvimento.

Percebe-se com clareza, que o dispositivo supracitado, praticamente reproduziu o enunciado do art. 227, caput, da Constituição Federal, buscando esclarecer que a defesa dos direitos fundamentais assegurados à criança e ao adolescente é tarefa da família, sociedade e Poder Público (em todas as esferas).

Importante destacar e mencionar o que se extrai do conteúdo disposto no endereço eletrônico do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (BRASIL, 2020) que, de todas as instituições tratadas, é no âmbito familiar que deve ocorrer preferencialmente todo trabalho em favor do menor. Ressaltando também, que o direito à convivência familiar foi expressamente relacionado como um dos direitos fundamentais a serem assegurados com absoluta prioridade à criança e ao adolescente.

Desta forma, tendo em vista a necessidade de cuidar e proteger as crianças e adolescentes, baseado na máxima do melhor interesse do menor, posto que trata-se de pessoas em situação especial, em formação de caráter e integridade, em formação de personalidade, formação moral e também psicológica, faz se então, necessário observar que estes merecem uma tutela especial, principalmente no meio familiar, destacando a responsabilidades do(a)(s) pai(s)/mãe(s), com o dever de cuidar dos filhos.

3 O ABANDONO AFETIVO E A RESPONSABILIDADE CIVIL

O doutrinador Flávio Tartuce explica com grande maestria que o Superior Tribunal de Justiça tem reconhecido o direito à indenização, tanto em casos de abandono afetivo, bem como em casos de abandono material do filho pelo pai (TARTUCE, 2018, pag. 1565).

Diante deste tema, destaca-se o entendimento do STJ, por meio do informativo 609 (BRASIL, 2017:

Cinge-se a controvérsia a definir se é possível a condenação em danos morais do pai que deixa de prestar assistência material ao filho. Inicialmente, cabe frisar que o dever de convivência familiar, compreendendo a obrigação dos pais de prestar auxílio afetivo, moral e psíquico aos filhos, além de assistência material, é direito fundamental da criança e do adolescente, consoante se extrai da legislação civil, de matriz constitucional (Constituição Federal, art. 227). Da análise dos artigos 186, 1.566, 1.568, 1.579 do CC/02 e 4º, 18-A e 18-B, 19 e 22 do ECA, extrai-se os pressupostos legais inerentes à responsabilidade civil e ao dever de cuidado para com o menor, necessários à caracterização da conduta comissiva ou omissiva ensejadora do ato ilícito indenizável. Com efeito, o descumprimento voluntário do dever de prestar assistência material, direito fundamental da criança e do adolescente, afeta a integridade física, moral, intelectual e psicológica do filho, em prejuízo do desenvolvimento sadio de sua personalidade e atenta contra a sua dignidade, configurando ilícito civil e, portanto, os danos morais e materiais causados são passíveis de compensação pecuniária (...).

Tal entendimento demonstra, claramente, que o não cumprimento das obrigações dos pais em prestar auxílio afetivo, moral e psíquico, além de assistência material, caracteriza total afronta a direito fundamental da criança e do adolescente. Até mesmo porque, a Proteção à Criança e ao Adolescente, estabelecida no ordenamento jurídico brasileiro, elevou-os à condição de prioridade nacional, reconhecendo-os como sujeitos de direitos fundamentais, com prioridade absoluta.

Uma vez que tal afronta é realizada, esta encontra-se completamente às margens da Moral e da Ética. Neste contexto Ronald Dworkin (2012) conceitua moral e ética como:

A ética estuda o modo como as pessoas gerem a sua responsabilidade de viver bem, e a moral pessoal concentra-se naquilo que cada indivíduo deve às outras pessoas.” (DWORKIN, 2012, p. 336)

Partindo, portanto, do entendimento externado pelo STJ, percebe-se que afetar a integridade física, moral, intelectual e psicológica do filho, em prejuízo do desenvolvimento sadio de sua personalidade configura ilícito civil.

Desta feita, resta claramente demonstrada que tais condutas, além de contrárias à moral e à ética, e de ferirem a dignidade da pessoa humana do menor, afrontam diretamente ao princípio constitucional do melhor interesse da criança e do adolescente, tendo em vista que, quanto à afetividade, fica a cargo da entidade familiar a obrigação de contribuir para que haja uma adequada formação psicológica e inserção social dos menores.

O amor e o afeto dos pais para com os filhos, neste caso se referindo às crianças e adolescentes, não podem ser impostos, mas o cuidado para com eles é dever. 

5 CONCLUSÃO

Diante do problema proposto inerente ao abandono afetivo do menor e a afronta ao princípio do melhor interesse da Criança e do adolescente, é possível afirmar que os objetivos propostos inicialmente, foram respondidos e para se chegar ao resultado obtido foi necessário passar por alguns pontos de discussão, além de promover a análise de doutrinas e jurisprudências.

Os capítulos foram elencados a fim de demonstrar o conceito jurídico e a fundamentação legal do que é o princípio aqui tratado e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, quanto ao abandono afetivo.

Quando se depara com o não cumprimento das obrigações dos pais em prestar auxílio afetivo, moral e psíquico, além de assistência material, caracteriza total afronta a direito fundamental da criança e do adolescente, podendo, portanto, configurar ilícito civil sendo passíveis de compensação pecuniária.

A contribuição do trabalho realizado vai muito além do aprendizado acadêmico. Busca demonstrar a vulnerabilidade da criança e do adolescente e demonstra o valor que o legislador teve para com estes, reconhecendo-os como sujeitos de direitos fundamentais, com prioridade absoluta.

Conclui-se, com a pesquisa realizada, que a necessidade de cuidar e proteger as crianças e adolescentes, baseado na máxima do melhor interesse do menor, uma vez que trata-se de pessoas em situação especial, em formação de caráter e integridade, em formação de personalidade, formação moral e também psicológica, são, portanto, merecedores de um cuidado especial, principalmente no meio familiar, ficando aqui em destaque as responsabilidades do(a)(s) pai(s)/mãe(s). E em caso de afronta a estes princípios, levando a afetar a integridade física, moral, intelectual e psicológica do menor, em prejuízo do desenvolvimento sadio de sua personalidade, configura ilícito civil.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2018]. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 3 jan. 2020.

BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Presidência da República, [2018]. Disponível em: http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm. Acesso em: 5 jan.2020.

BRASIL. Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Estatuto da Criança e do Adolescente Anotado e Interpretado. Brasília, Distrito Federal, 2018. Disponível em: http://www.mpdft.mp.br/portal/pdf/unidades/promotorias/pdij/Legislacao%20e%20Jurisprudencia/ECA_comentado.pdf. Acesso em: 5 jan.2020.

BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1.087.561-RS. Informativo 609. Família. Abandono material. Menor. Descumprimento do dever de prestar assistência material ao filho. Ato ilícito. Danos morais. Compensação. Possibilidade. Disponível em: https// http://www.stj.jus.br/docs_internet/informativos/PDF/Inf0609.pdf . Acesso em: 4 jan. 2020.

DWORKIN, Ronald. Justiça para Ouriços. Edição negociada com Harvard University press. Coimbra. Portugal: Almedina, 2012. p. 335.

JUNIOR, Nelson Nery; NERY, Rosa Maria de Andrade. Constituição Federal Comentada e Legislação Constitucional. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. p. 1212.

TARTUCE, Flávio. Manual de Direito Civil. 8. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Método, 2018. p. 1565.

VARGAS, Beatriz. Manual de Direito Constitucional. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 723.

Fernando dos Santos Resende

Fernando Resende
Enviado por Fernando Resende em 15/03/2020
Código do texto: T6888846
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2020. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.