5.1 - Concepções Filosóficas de Mundo


Wilhelm Guillermo Dilthey (1833 - 1911), em sua insuperável capacidade de síntese e para o erguimento de sua FILOSOFIA CRÍTICA DA HISTÓRIA, sistematiza três concepções filosóficas de mundo, presentes no pensamento europeu até o final do século XIX.

1a.) NATURALISMO / MATERIALISMO / POSITIVISMO com os mais destacados representantes: Demócrito de Abdera (460-370 a.C.), Epicuro de Samos (341-260 a.C.), Lucrécio Caro (91-55 a.C.), Tomás Hobbes (1588-1679), os Enciclopedistas, os materialistas modernos Isidore Auguste Marie François Xavier Comte (1798-1857) e Ricardo Avenarius (1843-1896).

2a.) IDEALISMO DA LIBERDADE com os representantes: Anaxágoras de Clazomene (500-428 a.C.), Sócrates de Atenas (469-399 a.C.), Platão (427-347 a.C.), Aristóteles de Estagirita (384-322 a.C.), Cícero (representando a filosofia greco-romana dos conceitos de vida), os Apologistas e padres cristãos, a Escola Escocesa, Immanuel Kant (1724-1804), Friedrich Heinrich Jacobi (1743-1819), Thomás Carlyle (1795-1881), Johann Gottlieb Fichte (1762-1814), Maine de Biran (1766-1824) e os pensadores franceses a ele vinculados, Henri Bergson (1859-1941).

3a.) IDEALISMO OBJETIVO com os representantes: Xenófanes, Heráclito de Éfeso , Parmênides de Eléia, os Estóicos, Nicolau de Cusa (1401-1464), Giordano de Nola Bruno (1548-1600), Baruch Spinoza (1632-1677), Anthony Ashley Cooper – o terceiro conde de Shaftesbury (1671-1713), Johann Gottfried Herder (1744-1803), Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832), Friedrich Wilhelm Schelling (1775-1854), Georg Wilhelm Hegel (1770-1831), Artur Schopenhauer (1788-1860), Daniel Ernst Friedrich Schleiermacher (1768-1834), Gottfried Wilhelm Leibnitz (1646-1716).

A relevância da identificação destes três tipos de concepções filosóficas de mundo e seus representantes está na impossibilidade epistemológica e lógica de promover as chamadas unidade das ciências e complementaridade das mesmas: e isto porque são três tipos de sistemas de pensamento incompatíveis um com o outro.

Uma anarquia epistemológica foi gerada a partir do Positivismo e ainda hoje é mantida nas Academias quando se fazem junções arbitrárias de extratos de pensamentos daqueles três tipos incompatíveis de concepções filosóficas ou quando se promovem "lambanças" metodológicas na composição de monografias, dissertações e teses, fundadas na concepção falsa de métodos quantitativos, qualitativas e a monstruosidade epistêmica dos chamados métodos quanti-qualitativos. (Esquecem-se mestres, doutores e phDs que a concepção quantitativa e qualitativa se refere às técnicas de pesquisa e não a métodos de pesquisa).

 

Vejamos a explicitação diltheyana das características de cada uma das concepções filosóficas de mundo, por ele estudadas e compaginadas.

 

5.1.1 -  Características do Naturalismo

- o sensualismo é a raiz dominante de sua gnoseologia: sensualismo é sistema filosófico de pensamento para o qual o processo de conhecimento ou de suas operações se reduzem à experiência sensível exterior e em que as determinações de valor e de fins estão sob o critério de valor contido no prazer e na dor sensíveis, ou seja, dos sentidos humanos.

- a direção de sua metafísica é o materialismo. Metafísica caracteriza o sistema de pensamento em que uma concepção de mundo e da vida é captada e fundamentada conceptualmente e elevada à categoria de validade universal.

- sua ética é hedonista. Hedonista refere-se à filosofia de Epicuro (342 ou 241 a.C. – 270 a.C.) e ao seu sistema filosófico de pensamento denominado Epicurismo, oposto ao Estoicismo fundado por Zenão de Citium (~336 a.C.– 264 a.C.).

- preconiza a anterioridade do conhecimento da natureza ao estudo do homem.

- utiliza-se da matemática e do experimento (repetição em laboratório) para compreender o mundo físico e suas leis.

- a matéria é realidade absoluta: qualifica-se de materialismo se a matéria é a última substância do real e de positivismo quando a matéria é concebida como caráter fenomenal do real.

- o mundo é totalidade causalmente determinada e aonde não existem os conceitos de liberdade, valor e fim (teleologia).

- o homem é um traço da natureza e participa de sua estrutura legal.

- o físico (material) explica e subordina o espiritual.

- o homem é escravo da natureza por suas paixões.

- o comportamento naturalista (materialista ou positivista) perante o mundo é causalista.

            Pelas características da tradição naturalista de pensamento, incluindo-se suas vertentes de materialismo e positivismo, pode-se afirmar que Allan Kardec não pertence a esse sistema filosófico.

 

 

5.1.2 – Características do Idealismo da liberdade

- é uma criação do espírito ateniense.

- o mundo é uma luta entre espírito e matéria.

- a partir da experiência volitiva (da vontade) do homem, há o primado da questão ética.

- o espiritual é autônomo e se subtrai de toda causalidade física.

- o fundamento de sua gnoseologia é a consciência.

- sua metafísica baseia-se na razão ou numa divindade transcendente.

- seus pensadores lutam contra o naturalismo e opõem-se a toda forma de panteísmo.

- seu clímax é a idéia do homem heróico e, portanto, liga-se à filosofia do Estoicismo, de Zenão de Citium.

- o comportamento idealista da liberdade perante o mundo é de aspiração ao espiritual.

         O pensamento de Allan Kardec e, portanto, o pensamento espírita, não se funda em todos os princípios do Idealismo da liberdade.

 

5.1.3 – Características do Idealismo objetivo

- o mundo é concebido como espírito, Deus ou valor.

- a realidade é expressão de algo íntimo e do desprendimento espontâneo de uma força espiritual atuante de modo consciente ou inconsciente.

- em alguns de seus sistemas, a nota dominante é o motivo religioso: Panteísmo e Panenteísmo são duas das formas deste tipo.

- o homem está em afinidade com toda a natureza pela sua atitude contemplativa, estética ou mística.

- da plenitude da vida afetiva surgem os valores do belo, do verdadeiro e do bem e a realização da felicidade da existência humana.

- o comportamento idealista objetivo perante o mundo está fundado na experiência íntima (interna ou interior) e no valor.


              O pensamento de Allan Kardec e, portanto, o pensamento espírita, não se funda em todos os princípios do Idealismo objetivo.

 

A concepção filosófica de pensamento no Espiritismo é inédita; não é naturalista nem idealista, razão porque será mais acertado falar em concepção espírita de pensamento, fundada na Filosofia Espírita expressa em O Livro dos Espíritos.

 

Vale ratificar o fato de que uma concepção filosófica de mundo e da vida tem sua lógica, epistemologia e metodologia específicas: não existe possibilidade de diversidade complementar ou de unidade das ciências perante concepções filosóficas incompatíveis.

Carlos Fernandes
Enviado por Carlos Fernandes em 17/11/2007
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