Carta aberta ao Gustavo Franco

Carta aberta ao Gustavo Franco

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Prezado Sr. Gustavo,

Li seu texto na revista Época desta semana (ed. 494) na qual o senhor chama de imposto o FGTS, dizendo explicitamente que o empresariado está cansado de tanto imposto. Continua sua argumentação de que o “imposto FGTS” é pior do que a CPMF e por isto seria melhor reduzi-lo do que reduzir a CPMF...

Eu te pergunto: em que mundo o sr. vive? Certamente não é no mundo do trabalhador que tem 8% do SEU SALÁRIO descontado para formar o SEU PATRIMÔNIO no FGTS.

Dá para entender? ... o trabalhador assalariado trabalha o mês inteiro e recebe seu salário. Deste salário, 8% é descontado e é investido na conta dele no FGTS. Isto é salário do trabalhador e não imposto.

Esta mania que a classe alta tem de colocar o FGTS como imposto tem várias funções ideológicas. Uma delas é inflar a tal carga tributária e assim animar uma campanha para reduzir os custos e impostos que a classe alta paga.

A lógica é a seguinte: menos imposto, mais dinheiro no bolso da classe alta. (Não confundam classe média com classe alta, isto é um erro grave). Toda estrutura tributária no Brasil é constituída de forma a que a classe alta pague poucos impostos comparados com a classe média e a classe baixa. Primeiro porque grande parte dos impostos incidem sobre o consumo. E como vocês sabem um milionário toma tanto leite quanto alguém de classe média. Ou seja, por mais que um milionário gaste, o consumo dele é percentualmente bem menor do que o de um trabalhador assalariado. Isto permite com que ele, o milionário, vá acumulando; e é justamente neste setor que o Brasil cobra pouco imposto. Ou seja, onde os milionários ganham e aplicam seu dinheiro é onde o Brasil cobra menos imposto.

Segundo: existem mil maneiras dos mais ricos pagarem menos impostos ou se apropriarem, para uso pessoal, do dinheiro público. A forma mais fácil de observar este fenômeno é através do desconto no imposto de renda de despesas médicas. Ex: A madame sai de casa e vai fazer psicoterapia a um custo de 300 reais a sessão, três vezes por semana. Em um ano, com 52 semanas, ela gastará 46.800 reais (300,00 x 3 x 52)? Não, ela não gastará isto tudo. Sabe porque? Porque nós brasileiros pagaremos 27,5 % deste valor, já que ela vai abater este custo do seu I. Renda. O valor que nós pagaremos para que os membros da classe alta façam terapia e fiquem “legal” seria (neste exemplo) de R$12.870,00.

A classe alta tem várias formas de fugir dos impostos. Mais uma: depois de ir a terapia, ela se desloca de avião particular para sua casa de praia, onde fica o seu iate. Ela é uma sortuda, pois não paga IPVA nem do avião e nem do iate, apesar do imposto ser de veículos auto-motores.

Para não cansar só mais uma: o membro classe alta monta uma empresa e não paga impostos e nem a previdência. Enquanto isto, como pessoal física, engorda seu patrimônio. A receita e a previdência praticamente nunca conseguem ter acesso a este patrimônio pessoa física, já que as leis são feitas pela classe alta, com o intuito de proteger a classe alta. (Para quem quer saber a origem da impunidade está aí uma boa dica).

Eu, chicão, do blog do Chicão (http://blogchicao.tripod.com/) sou membro desta classe alta e já pensei como o Sr. Gustavo Franco. É uma mania de vítima que os membros da classe alta possuem, eles se imaginam espoliados por um governo que não “faz nada” e por uma população pobre, feia e incompetente. É desta mania de ser vítima que nascem loucuras coletivas (lembram de Hitler?) nas quais o dinheiro daqueles que trabalham se transformam em impostos pagos por estes membros da classe alta.

É um distúrbio de percepção da realidade (cultural), um distúrbio grave psicológico, o mesmo distúrbio que fez com que os senhores de escravos fossem contra a libertação dos escravos porque “a propriedade é um direito divino e a base da sociedade”.

Para terminar, caro Sr. Gustavo, te proponho o seguinte exercício mental: quando o senhor for a algum coquetel “boca livre” observe o champagne que você estiver tomando e pense: “o preço deste champagne vai ser abatido nos custos da empresa que oferece o coquetel, portanto, o garçom que está servindo-o estará ajudando a pagar (com os impostos que ele paga) para eu tomar este champagne “de grátis”. Depois vá para um canto qualquer da festa e pense na família do garçom, na sua esposa, filhos, na casa dele e, por fim, pense nele recebendo o seu salário descontado o valor do FGTS e repita: “o FGTS é um patrimônio do trabalhador, é fruto do seu esforço. O FGTS não é imposto, não vou mais confundir”. Repita isto 50 vezes. Certamente você ficará mais próximo da realidade e poderá ajudar o Brasil e ser um país mais justo e com menos desigualdade social.

Abraços, de quem lhe quer bem,

Chicão

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