LINGÜÍSTICA _ algumas reflexões

O dicionário aponta, entre outros, alguns significados que o vocábulo NATUREZA apresenta, entre eles: espontâneo; algo em que não há trabalho do homem; que segue a ordem natural das coisas. Pode-se também dizer que natural é independente, por si só se forma e se mantém, subsiste.

A Bíblia Sagrada se refere ao momento em que toda a humanidade usava um só idioma até que, por castigo divino, os homens passaram a falar línguas diferentes. Significaria o momento inicial da comunicação humana que o ideal é existir uma língua universal?

A Língua Inglesa, há muito, é considerada universal por, supostamente, apresentar uma estrutura ideal possível de ser facilmente apreendida por qualquer pessoa . Claro que se trata de uma generalização absurda. Quem conhece um pouco do Inglês sabe que não é tão fácil assim. Entretanto, nota-se que o ser humano, mesmo que não o perceba, organiza-se em função de uma linguagem comum, como a do Orkut. Mas, jamais a unidade será possível pois assim como uma forma de comunicação é criada no Orkut, vaárias outras são criadas por pedagogos, médicos, marqueteiros, publicitários. Cada grupo quer se sobressair, o que é natural do ser humano.

Quanto à Língua Inglesa, deve-se levar em conta o processo de convencimento que cerca o indivíduo, a força econômica especial e estrategicamente utilizada pela América do Norte no afã de exercer ainda maior domínio sobre o globo. Para alcançar um objetivo de tal porte, a melhor das armas é a língua_instrumento com o qual se penetra fundo no íntimo do semelhante. Só dessa forma é possível entender seus anseios, conquistá-lo, subjugá-lo.

A Língua Inglesa não é fácil como muitos acreditam. Na sua formação passou e passa pelos mesmos movimentos e influências sofridos por outras línguas no planeta. Conte-se, na formação da Língua Inglesa, inclusive a presença da Língua Latina.

Pensar a língua na Pós-Modernidade inclui pensá-la envolvida em um contexto bem mais complexo, num panorama de novas e avançadíssimas tecnologias, uma realidade bem mais palpitante do que aquela das Grandes Navegações, da Revolução Industrial e das primeiras conquistas da Ciência. A língua de hoje contém sangue e espírito de hoje.

O panorama pós-moderno traz novas formas de expressão veiculadas pelo mundo virtual/digital, pela tentativa de democratização do conhecimento, pelas conquistas espaciais e pelo avanço da Medicina e das pesquisas no âmbito da Biologia.

Estudiosos da Língua Portuguesa, amantes apaixonados pela face européia de suas origens, lutam com unhas e dentes pela sua "preservação", pelas formas puristas/clássicas/nobres, loiras e de olhos azuis. Esta luta tanto pode ser consciente quanto inocente e fruto do desconhecimento ou do preconceito. Esquecem-se, estudiosos, em sua louca paixão, da presença do índio e do negro na formação do nosso idioma. O mapa genético da língua não pode ser escondido, falsificado. E não há a mínima possibilidade de isolamento lingüístico por ser a língua o mais importante e utilizado instrumento da comunicação entre os humanos.

Historicamente ocorre a imposição de modelos, de padrões lingüísticos. Por que há a necessidade de impor e de adotar modelos? A sociedade adota modelos para tudo que vê pela frente:beleza, educação, casamento, artes.

Tomando por critério a unidade da comunicação em um país do tamanho do Brasil, admita-se alguma validade para justificar a adoção de um modelo. Só que não há consulta, há imposição.

A engrenagem sócio-econômica força um modelo de língua que dá acesso ao trabalho. Se o indivíduo não pretende escorrer pelo ralo da exclusão, melhor que aprenda o modelo exigido, como manda o figurino da norma padrão.

As variantes lingüísticas tidas como padrão se fortalecem quando o grupo social se fortalece economicamente . Cabe a cada indivíduo, principalmente ao professor, refletir sobre o seu próprio comportamento sobre a diversidade, sobre a coerência de seu discurso e prática.

Quando se repele e, ao mesmo tempo, se ironiza, condena, reprime, exclui qualquer forma de expressão, o que se está fazendo é ignorância, é falta de leitura e diálogo com o mundo. É injustiça, maldade, tirania.

Um outro aspecto a ser pensado é o da canonização/divinização de determinado modelo/padrão lingüístico. Padrões dessa qualidade não existem pois não somos deuses.

Há uma conjugação de forças cujos objetivos têm um endereço certo, o do sucesso eterno de determinada classe social sustentada pelo dinheiro e pelo poderio bélico.

O leitor deste texto já parou para pensar que a llíngua se mostra moldável quando usada e que, ao contrário das outras coisas, não se desgasta, mas se renova ? Falamos e escrevemos o Latim renovado. repaginado.

A Lingüística ou Glotologia é uma senhora e respeitável ciência cuja função é estudar a linguagem e seus fenômenos, em si mesma e por si mesma. Observa a língua a partir de seu comportamento, manifestações, constatando, registrando, descrevendo, examinando e comparando esse comportamento/essas manifestações, sem sobre isto influir. Assim como Piaget observou o comportamento das crianças em seu desenvolvimento sensório-motor. Piaget não mandou que as crianças fossem diferentes de sua essência.

Se lançarmos um olhar para o passado, poderemos constatar que o Império Romano, a Península Ibérica e Portugal faziam distinções firmes, traduzidas na separação lingüística dominantes/dominados.De um lado, o sermo nobilis, do clero e da nobreza; do outro, o sermo vulgaris/castrensis, das classes sociais inferiores e dos soldados.

O português formou-se a partir da mistura do latim vulgar com os dialetos naturais das regiões conquistadas por Roma. O Período das Grandes Navegações trouxe, em seus navios, de Portugal para o Brasil, um idioma já em outro estágio de evolução. Este idioma foi ensinado, implantado, imposto durante o período da colonização do Brasil, cujos habitantes nativos falavam o tupi-guarani, principalmente.

A língua de Portugal unida com o tupi-guarani e dialetos africanos ganhou uma nova fisionomia. Temos hoje um português diferente do de Portugal e contamos com mais influências de línguas européias como o Francês e o Espanhol (filhas também do Latim), a linguagem surgida com o avanço tecnológico e o Inglês.

Não se pode colocar freios na língua. É o mesmo que tirar a liberdade, proibir o pensamento, cercear a expressão. Não adianta, por outro lado, dizer que é desnecessário dominar a norma considerada padrão, seria um absurdo.