QUANDO A MORTE É BOA?

Pessoas buscam tribunais em bem de doentes inconscientes (inabilitatos), a fim de reclamar seu direito de cessação da vida frente a um sofrer insuportável. Em geral argumentam que não mais suportam assistir ao sofrimento do doente, embora tal sofrer seja questionável, visto que o doente está inconsciente.

Ao alegar não mais suportar assistir o sofrimento de um doente, quem alega não estaria a lamentar seu próprio infortúnio e sofrer, o que o doente não faz por estar impedido pela inconsciência? Seu assistente não estaria querendo fazer cessar o sofrer de sua própria alma, que tem origem no imaginar o quanto o doente pode estar a sofrer?

Certo é que sua preocupação não tem por alvo o doente, mas a si mesmo, prova de que inexiste o altruísmo que parece movê-lo, pois labora por seu próprio bem-estar.

De que argumentos jurídicos se pode dispor para pôr fim a vida daquele cujo possível sofrer nos desacomoda?

Povos antigos usavam o bem-estar do moribundo como pretexto para se livrar dele. As armaduras de certos soldados tinham uma fenda por onde o companheiro introduzia um punhal a fim de matar o combatente ferido, evitando que fosse morto pelo inimigo. Alguns povos deixavam para trás os maiores de sessenta anos para que fossem devorados pelas feras e não servissem de estorvo para os demais, nem tivessem que ser sustentados. Outros ministravam doses de poções alucinógenas que matavam sem dor a velhos, doentes, mutilados, deficientes físicos e mentais. Povos, como os primitivos brasileiros, assassinavam os recém-nascidos que apresentassem deficiência física ou mental. As mães os jogavam de certa altura em pedras ou rios.

A isto se denomina eugenia, que inspirou ideais de purificação e aperfeiçoamento da raça humana. O nome Eugênio(a), que deriava de eugenia, indica pessoa bem nascida, nobre e única, atenta aos detalhes e exigente consigo mesma e com os outros, que só se relaciona bem com pessoas do mesmo nível cultural e social.

Diversos são as pretextos elaborados para livrar-se do incômodo que uma pessoa doente pode acarretar e cada um a seu ver tem o motivo mais justo e os argumentos mais razoáveis, por isto forçam a intervenção da Justiça para julgá-los, abrindo precedentes de casos e casos, até chegar-se ao ponto que não se poderá mais controlar o ímpeto “altruísta” daqueles que não suportam ver o sofrer dos sofredores.

No apogeu desse "altruísmo", o nacionalismo identitário nazista decidiu exterminar judeus, ciganos, homo-sexuais e Testemunhas de Jeová por mero pretexto de melhorar a raça humana, deixando permanecer apenas arianos com olhos azul-celeste e cor-de-mel. E tudo se iniciou no induzir, por método psicanalítico, doentes mentais a se auto-exterminarem, entrar na câmara de gás e ele próprio acionar o botão, certo de estar fazendo um bem à humanidade.

Seja com motivos justos ou não, as leis dos países não toleram o tirar a vida do ser humano, o que serve de proteção para quem vê sua existência a mercê de certos altruístas e seus julgamentos. A lei esclarece que a vida não pertence ao indivíduo, mas a instituição social, no caso, o Estado. Portanto, só não vai para cadeia quem comete suicídio porque não se pode prender o morto, mas em certos países os herdeiros do suicida perdem o direito a herança.

Para a prática da eutanásia, seja ativa ou passiva, resta alegar legítima defesa, pois assiste a quem sofre injusta agressão repeli-la com os meios necessários na hora da agressão, mesmo que resulte na perda da vida do agressor, que, no caso, é o menos digno do direito à vida que a ambos assiste de igual modo. Todavia, na eutanásia o agressor é a doença. Entretante, quem acaba morrendo é aquele que pretende estar a repelir a agressão, se for o caso de o próprio pasciente administrar a autanásia em si. No caso de alguém executar em lugar do doente, a legítima defesa faz-se mais inviável ainda, pois somente ao agredido assiste repelir a agressão que ele mesmo sofre.

Restaria ainda saber se a doença que agride não tem origem numa vida dissoluta da parte do doente, implicando que a agressão não é injusta, pois resulta de uma ação anterior do agredido.

Todadavia, seja a eutanásia ministrada por esta ou aquela forma, a Deus pertence toda vida, pois Ele é quem a criou e sabe quando convém a alguém seguir vivendo ou descansar. Não é por pouco que muitos desenganados morrem após os médicos que os condenaram.

Wilson Amaral - Estudante de História na Unisinos e autor dos livros Os Sonhos não Conhecem Obstáculos e Os meninos da Guerra.

Wilson do Amaral Escritor
Enviado por Wilson do Amaral Escritor em 18/12/2007
Reeditado em 19/12/2007
Código do texto: T782926