Divagações sobre a igualdade de género

A evolução da sociedade é um fenómeno interessante de se estudar na história. É de facto interessante ver como o Homem passou de queimar bruxas e hereges até às questões pelas quais nos debruçamos atualmente. Contudo, estudar em detalhe esta dita evolução não seria uma façanha para uma pessoa como eu, deixemos isso, caro leitor, para as pessoas que mais percebem de história.

Porém, desta evolução civilizacional surgiu uma interessante problemática: as questões de igualdade de género. Analisar este problema de raiz, mais uma vez, seria um trabalho para um outro mais instruído que eu na matéria. No entanto, isto não me impede de falar da problemática como ela é nos dias de hoje, ou pelo menos apontar certas injustiças. Uma tal injustiça bastante intrigante de que tomei conhecimento recentemente vem de uma comunidade um pouco que estranha para mim: a comunidade profissional de xadrez. Ora, por palavras simples e sem mais demoras, os órgãos máximos que organizam os grandes torneios mundiais baniram a participação de mulheres transgénero nos torneios femininos.

Mesmo não sabendo muito acerca da complexidade de outros dramas à volta do desporto, este despertou a minha atenção por inteiro, pois levanta duas questões. A primeira, e a mais evidente, é a clara discriminação da comunidade transsexual num desporto em que não têm uma clara vantagem dado o seu sexo biológico. Num desporto como o culturismo ou outros que envolvam o desenvolvimento de musculo rápido ou ao extremo, faz sentido a separação entre géneros, mesmo que não seja cristalino em todos os desportos físicos. Contudo, num desporto em que não há vantagem de se ser biologicamente homem ou mulher não faz sentido este embargo, é como se o transgénero se tivesse tornado no papão para muita gente.

A segunda questão levantada é o porquê de haver um tão grande preconceito com o desporto feminino? A fundo não sei se consigo explicar, pois isso iria requerer um elevado nível de pesquisa, todavia, podemos olhar para situações recentes e não tão recentes.

Comecemos então pelo acontecimento mais recente, com o mundial feminino de futebol. Lamentavelmente para uns não ei de falar de um tal senhor Rubiales, mas sim o desinteresse de uma grande parte do público-alvo do futebol masculino. Sim, o Mundial de Futebol Feminino de 2023, que foi realizado na Nova Zelândia, foi um grande sucesso em termos de espetadores tendo atingindo um número recorde de espetadores. Mesmo assim, muitos recusaram-se a ver os jogos pelo facto de não acharem que as equipas não jogarem bem, ficando pelos vídeos engraçados de fails. Isto não é nada a não ser um paradoxo total, um catch22! Tem que se perceber que o fenómeno do futebol feminino começou há menos de 30 anos, nos anos 90 não se ouvia falar de mulheres no futebol, a não ser em raros casos ou como uma piada. Isto é enquanto o futebol masculino tem mais de cem anos de história e, ainda mais importante, evolução. Não se pode esperar que o nível do futebol feminino seja o mesmo do masculino, isso seria aprender a correr antes de andar.

O mesmo se aplica a outros desportos, até mesmo os motorizados. Para isto temos o exemplo de Michèle Mouton, hoje considerada das melhores pilotas femininas de rally, porém os seus rivais franziam os seus narizes (sem dúvida entupidos pelas grandes quantidades de dinheiro que tinham) sobre a ideia de ela sequer entrar dentro de um carro. Mesmo não tendo ganho nenhum campeonato do mundo de rally, teve uma carreira repleta de vitórias e de façanhas, calando assim quem se atrevesse a questionar os seus dotes detrás do volante. O exemplo de Michèle Mutoun serve mais para demonstrar como mudamos num prazo de mais ou menos 40 anos, mesmo que a presença de mulheres nos desportos como o rally seja ainda raro, está a começar a mudar também com o aparecimento de modalidades como o Formula Academy. Mesmo assim, ainda há muito terreno por cobrir.

O que é que podemos tirar por conclusão? Que precisamos de apoiar o desporto feminino? Que deve haver mais mulheres pilotas de carros? Sim, realmente é verdade, mas eu gosto de pensar que isto serviu mais para mostrar um microcosmo do que devemos mudar enquanto sociedade para atingirmos um verdadeiro estado de igualdade de género. Contudo, isso só acontece se todos nós estivermos dispostos a isso.