FUGA

Essa palavra FUGA me veio à mente ontem; liguei o computador, coloquei a palavra no título e não saía nada para escrever. Tentei forçar, mas não adiantou, nada de interessante vinha para poder escrever. Apaguei três linhas que havia escrito, pois ao ler, não era eu, não tinha nada meu. Eram palavras forçadas, palavras colocadas uma ao lado das outras para um nada de entendimento e compreensão. Não me representavam. Fui para o word e tentei escrever uma poesia com o mesmo título. Até saíram alguns versos interessantes, que até poderia tê-los aproveitado para uma outra situação, mas não estavam do meu gosto, ou eu não estava do meu gosto para escrever. Apaguei e desisti de escrever e fui ler.

Não gosto de escrever por escrever. Não gosto de apenas organizar palavras numa frase e fazer de conta que são versos com inspiração. Não curto pensar para escrever. Me dá vontade de escrever, vem a palavra e eu começo a discorrer, a dissertar sobre o assunto e as palavras brotando que às vezes eu nem consigo acompanhar na digitação, embora digite muito rápido. Talvez seja por isso que não gosto de rimas, nunca gostei de poesias com rimas, acho tudo muito organizado, muito métrico, prefiro versos em branco, que me parecem serem mais à vontade, criados mais de qualquer jeito, mais conforme a inspiração chega e a coisa vai fluindo e se transformando em uma poesia, em um conto, em uma crônica, em um artigo. Qualquer coisa que seja, mas escrito com o coração e não com o dicionário na mão.

Podem estar pensando que devo estar equivocado ao falar tanta coisa e não me referir à palavra que compõe o título: FUGA; mas tenho a lhes dizer que tudo mencionado acima é uma fuga. Toda vez que sento para escrever, na verdade, estou tentando fugir de mim mesmo, por isso, ao escrever, não leio e nem sei. muitas, a maioria das vezes, o que escrevi, porque deixo fluir meu espírito que viaja para não sei que lugar e se refugia num canto do meu ser e assim começa a me enviar baldes e mais baldes repletos de palavras, jorrando de dentro de mim, fazendo com que eu escreva tudo aquilo que me atormenta, que me incomoda, até aliviar de vez o meu coração e meu pensamento se esvaziar e eu voltar ao normal - nem tão normal assim - e me situar para saber que eu sou eu. Isso é pura fuga.

Quando se fala, se lê, se ouve de fuga, já imediatamente pensamos em fuga de presídios, de cadeias, onde pessoas malfeitoras algo fizeram para terem sido encarcerados mas conseguiram fugir com uma fuga muito cinemática; tudo porque eles tiveram tempo de sobra para conseguirem organizar, planejar e colocar em prática tal fuga, pois vivem num ócio, para não dizer vazio, imenso, sem fazerem absolutamente nada, fazendo com que suas forças e energias sejam voltadas apenas e exclusivamente para uma fuga, sair da tortura, sair da inanição e voltarem ao que faziam antes, que eram contravenções, mas ao sairem serão muito piores. O sistema carcerário não faz ninguém melhorar socialmente, muito pelo contrário, piora.

Assim é a nossa vida aqui fora, na liberdade - será que temos liberdade para sermos o que quisermos ser? Será que temos liberdade para fazermos o que quisermos fazer? Será que temos liberdade para estarmos onde quisermos estar? A resposta é apenas uma: NÃO. Vivemos numa prisão onde as pessoas se dizem e pensam serem livres, mas na verdade é uma pseudoliberdade. Por mais dinheiro que a pessoa tenha, maior a prisão que ela vive.

As pessoas de modo geral pensam em ganhar, ganhar e ganhar muito dinheiro para que possam comprar, comprar, e comprar tudo o que pensam ser necessário para torná-las felizes. Quando chegam a alcançar o que sempre almejaram, com trabalho, com herança, com jogos, legal ou ilegal, não interessa qual a forma, ela percebe que nada daquilo se faz importante, nada se torna necessário. Usufrui de tudo, mas o vazio impera, pois ninguém que está a sua volta é digno de confiança, e sim de pensamentos interesseiros. E o vazio e a infelicidade se instala na pessoa e só resta a ela fugir de tudo aquilo, comprando o que dinheiro compra, mas não tendo o que o dinheiro não consegue oferecer: felicidade verdadeira.

A fuga se dá em todos os momentos de nossas vidas, conforme a necessidade que enfrentamos para que ela aconteça. Quando algum desequilíbrio emocional se apresenta e nos exige uma fuga triunfal, nos fazendo cometer atrocidades e boicotes, conosco e com as pessoas que nos rodeiam, então há a necessidade de uma intervenção. Alguém tem que estar olhando, tem que estar alerta para que possa acudir e intervir na loucura dessa fuga e fazer a pessoa se situar, colocar os pés no chão e voltar à realidade, seja ela qual for. Muitas vezes a fuga traz consequências terríveis, assustadoras, pois ao retornar a sua sanidade, se dá conta do que perdeu tanto em bens materiais, na sua parte física, quanto e principalmente no seu emocional.

A fuga de nós mesmos nos transporta para outros patamares, para outras instâncias que nem imaginamos, mas é pra lá que as pessoas vão quando querem fugir de si mesmas utilizando todo tipo de recursos que apareçam a sua frente, aceitando todo tipo de proposta e assédio, só para se machucar e se dizer que ela é o que ela quer ser naquele momento.

Assim como muitos presidiários fogem das cadeias e acabam sendo pegos e voltam para as cadeias para cumprirem suas penas, muitas pessoas voltam da sua fuga, mesmo tendo cometido todo tipo de loucura possível, porque sempre há um caminho de volta quando a pessoa está propensa a isso, está aberta para voltar a ser o que ela era antes, mesmo que prisioneira de si mesmo, mas livre para nunca mais querer fugir. É um longo, difícil e árduo processo, mas ele acontece desde que haja um acompanhamento, um cuidado muito especial, sem sufocar, sem impor diretrizes, sem nada obrigado, mas sim, estimulando a consciência de voltar a ser um ser humano normal que ainda tem um tempo aqui na terra e sua vivência e experiência servirão de exemplos para tantas pessoas que entram nesse mesmo processo de FUGA.

E tu caro amigo e cara amiga, já vivenciou alguma fuga?