CADA ÉPOCA A SEU TEMPO
    Nesta semana, conversava com meus alunos do Ensino Fundamental e lhes dizia que a minha geração lidava com coisas que eles nunca mais verão e que por ora lidamos com bens e dispositivos que eles usam, marcando uma divisão de habilidades, algumas já definitivamente descartadas, e de hábitos e saberes que nos unem em certos pontos e nos desunem noutros, mas que fazem parte de um universo compartilhado. Vou ser mais claro. Vim de uma faixa etária que muito usou a máquina de escrever e que, a cada vez que precisava do texto datilografado, tinha de fazer essa tarefa de novo. Nosso mundo virou de cabeça para baixo e para melhor quando vieram os primeiros computadores que permitiram copiar e colar, armazenando esse texto para usá-lo como e quando melhor nos aprouvesse. Os telefones são outros exemplos. Em tempos idos, muitas demandas só nos ficavam conhecidas quando nos inteirávamos dos recados na secretária eletrônica e nos organizávamos para dar conta delas num tempo razoável, mormente no dia seguinte. Agora, temos de responder em tempo real. Para ver um filme, na era pré-streaming, era comum ir a uma locadora para alugar uma fita VHS ou um DVD. Atualmente, filmes e séries passaram a visitar nossas casas. O cinema de calçada resiste bravamente.
    Essas alterações de fundo no modo de viver e de desfrutar daquilo que a tecnologia nos oferta já fazem parte da história da humanidade. Homens de gênio como Leonardo da Vinci foram visionários que abriram os caminhos por onde homens e mulheres passariam para aproveitar o melhor que seus ancestrais puderam lhe oferecer. Em relação ao passado, há os saudosistas e os que o refutam. Os primeiros, por verem nele apenas os bônus, que existem, claro. Já os segundos pensam que os tempos atuais são melhores de se viver. Parece que, novamente, a virtude está no meio. Há coisas boas em eras pretéritas como igualmente há senões que não podem ser negados. Vamos exemplificar. Até poucas décadas, era comum a assertiva de que em briga de marido e mulher ninguém mete a colher. Menos. O combate à violência doméstica deve ser um compromisso de toda a sociedade. Já na época presente, tem-se que as relações nas redes sociais são ágeis e dinâmicas, mas elas igualmente podem ser perigosas, como se vê em casos de golpes que se valem das novas tecnologias.
    É famosa a frase de Caetano Veloso: “Cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Verdade. Pode-se parafraseá-lo: cada um sabe as vantagens e as desvantagens de viver na sincronia com seu entorno e com seu momento da passagem por este mundo velho sem porteira. O poeta espanhol Antonio Machado aduziu que não há caminhos feitos, que os caminhos se fazem ao andar. Que cada um de nós palmilhe sua própria história, que tem raízes em tempos imemoriais.

 

Jornal Correio do Povo, Porto Alegre-RS, 22.2.2024, p. 2

Jornal Nova Folha, Guaíba-RS, 23.2.204

 

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Landro Oviedo
Enviado por Landro Oviedo em 22/02/2024
Reeditado em 22/02/2024
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