EUA produz apenas 10% dos semicondutores e China 80% dos minerais críticos e essa vulnerabilidade fez o governo Biden alocar trilhões para impulsionar a indústria

 

Por que investimento público e subsídios são a “nova" bússola da economia dos Estados Unidos                     

 

 

IMAGEM: ISTOCKPHOTO

Os EUA produzem apenas 10% dos semicondutores enquanto a China detém 80% dos minerais críticos e essa vulnerabilidade fez o governo Biden alocar trilhões para impulsionar a indústria

 

 

Por que investimento público e subsídios são a “nova” bússola da economia dos Estados Unidos

A vulnerabilidade do país na produção de semicondutores avançados e em minerais críticos explica o engavetamento da política dar liberdade total ao mercado

 

por Carlos Drummond

 

Enormes doses de investimento público e subsídios jorram para as políticas públicas de reindustrialização e descarbonização, nos EUA, na Europa, no Japão, na China e em outros países do Oriente, mas no Brasil isso ainda constitui anátema para economistas neoliberais colocados em posições chave, no setor financeiro e no próprio governo, e ainda para a maior parte do Congresso. O presidente Lula tentou, sem sucesso, romper o cerco contra o investimento público, ao menos duas vezes, quando da elaboração do novo arcabouço fiscal e na definição do Orçamento.

 

O fato é que o investimento público e os subsídios são pilares da retomada da industrialização nos Estados Unidos e no mundo, como deixou claro o conselheiro de segurança nacional Jake Sullivan, em discurso que iniciou, segundo a respeitada revista Politico, uma “revolução”, há pouco menos de um ano, totalmente ignorado pela imprensa doméstica. 

 

Na sede do tradicional think tank Brooking Institution, Sullivan vocalizou uma espécie de mea culpa coletiva pela condução desastrosa da política econômica estadunidense nos últimos anos. Em discurso mais que contundente, sem qualquer repercussão no Brasil, o conselheiro mencionou quatro vezes o caráter essencial do investimento público.

 

Os Estados Unidos fabricam hoje apenas cerca de 10% dos semicondutores do mundo, e a produção – em geral e especialmente quando se trata dos chips mais avançados – está geograficamente concentrada em outros locais. Produzem apenas 4% do lítio, 13% do cobalto, 0% do níquel e 0% do grafite necessários para atender a procura atual de veículos elétricos. Em contrapartida, mais de 80% dos minerais críticos são processados por um país, a China.

 

A reação dos EUA a esse quadro de vulnerabilidade foi alocar 3,5 trilhões de dólares nesta década em investimentos públicos e privados, com grande proporção de subsídios.

 

A seguir, excertos da fala de Sullivan sobre a importância do investimento americano na economia estadunidense:

 

1 - A visão de investimento público que dinamizou o projeto americano nos anos do pós-guerra – e na verdade durante grande parte da nossa história – desvaneceu-se. Deu lugar a um conjunto de ideias que defendiam a redução de impostos e a desregulamentação, a privatização em detrimento da ação pública e a liberalização do comércio como um fim em si mesmo.

 

Havia um pressuposto no centro de toda esta política: que os mercados alocam sempre o capital de forma produtiva e eficiente – independentemente do que os nossos concorrentes fizessem, não importasse o tamanho dos nossos desafios partilhados e não importasse quantas barreiras derrubássemos.

 

2 - Agora, os motores da desigualdade econômica são complexos e incluem desafios estruturais como a revolução digital. Mas entre estes fatores fundamentais estão décadas de políticas econômicas de gotejamento de dinheiro (trickle-down) – políticas como cortes regressivos de impostos, cortes profundos no investimento público, concentração empresarial desenfreada e medidas ativas para minar o movimento trabalhista que inicialmente construiu a classe média americana.

 

Uma estratégia industrial americana moderna identifica setores específicos que são fundamentais para o crescimento econômico, estratégicos do ponto de vista da segurança nacional, e onde a indústria privada por si só não está preparada para fazer os investimentos necessários para garantir as nossas ambições nacionais.

 

3 - Uma estratégia industrial americana moderna identifica setores específicos que são fundamentais para o crescimento económico, estratégicos do ponto de vista da segurança nacional, e onde a indústria privada por si só não está preparada para fazer os investimentos necessários para garantir as nossas ambições nacionais.

 

Implementa investimentos públicos direcionados nestas áreas que libertam o poder e a engenhosidade dos mercados privados, do capitalismo e da concorrência para estabelecer as bases para o crescimento a longo prazo.

 

4 - O Presidente Biden e a Presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, falaram sobre isto em Washington.

 

Eles divulgaram um comunicado muito importante, que, se você ainda não leu, eu realmente encorajo você a ler. No fundo, o que a declaração dizia era o seguinte: investimentos públicos ousados na nossa respectiva capacidade industrial têm de estar no centro da transição energética. E a presidente von der Leyen e o presidente Biden comprometeram-se a trabalhar em conjunto para garantir que as cadeias de abastecimento do futuro sejam resilientes, seguras e reflitam os nossos valores – incluindo no trabalho.

 

 

 

FONTE original: Revista CartaCapital