EDUCAR É INCLUIR

A educação na pós-modernidade

A educação é um poderoso instrumento de liberdade. Seja no âmbito social ou espiritual, o indivíduo que aplica os ensinamentos da escola em sua vida consegue livrar-se de preconceitos, dogmas e barreiras que nos são impostos pela falta de informações e por bloqueios mentais.

Educado, o ser humano torna-se livre dentro de sua sociedade e dento de sua consciência.

O papel da escola e do professor não é só o de levar os conhecimentos pragmáticos da física, matemática, biologia, literatura, etc. Mas o de despertar no aluno a conscientização do seu papel como cidadão, fazendo-o acreditar na força transformadora da educação. Em outras palavras, fazer o aluno crer na possibilidade dele mesmo mudar seu destino, na medida em que vai se livrando dos discursos dogmáticos que a sociedade implanta no imaginário das pessoas.

A partir dessa afirmação, podemos entender de que maneira a cultura de massa (não a cultura produzida pelo povo de um modo geral, mas a produzida para o povo e implantada através da falta de fundamentação crítica) pode ser um poderoso objeto de análise escolar , produzindo a desmistificação de valores e conceitos ultrapassados e que persistem na nossa sociedade.

Cultura de massa versus Cultura escolar

A influência e o poder ideológico da cultura de massa coloca em questão um grande problema educacional se considerarem seu poder de comunicação e difusão.

As culturas de massa constroem uma representação social que privilegia uma única cultura. Para entender o porquê da preferência de uma cultura sobre outras , é necessário conhecer um pouco da trajetória do nascimento do discurso cientificista.

Quando o conhecimento histórico tornou-se científico, pode-se criar narrativas que identificassem povos/culturas superiores e povos/culturas inferiores. No momento em que se passou a considerar a realidade igual ao discurso produzido sobre ela, ou seja, quando aquilo que se narrava passou a ser o que “realmente” se passou, apagou-se o viés da interpretação.

No período conhecido como modernidade científica , em que nasce o espírito historicista, a filosofia e a história se inverteram. A filosofia se revela histórica. Buscaram-se fatos reais, concretos. Embora pretendessem se desvencilhar da filosofia da história, ainda se dependia de seus conceitos e suas idéias. A diferença consistia na falta de sentido histórico; priori inverificável. Perguntou-se como construir a narrativa histórica e que princípios a organizaria. Os historiadores cientistas também consideraram a história como desenvolvimento progressivo. A história torna-se contínua e com um fim único. O conhecimento histórico torna-se científico. A dispersão dos eventos ganha um fio condutor teleológico. Desenvolvimento progressivo, racional e contínuo do Espírito e Estado Nação em direção à liberdade. Faz-se do Estado, síntese do particular e do universal e de seus heróis , os principais personagens da história. Com o apoio científico, o historiador pôde diferenciar povos inferiores e superiores. A verdade histórica científica continuava política e moral. Esconde-se aí um projeto político. Os povos mais morais têm direito ao poder. A realidade histórica e a narrativa histórica se recobrem. O historiador se julga conhecedor do sentido da história e se torna um juiz. Criou-se a história como “consciência crítica” e “consciência crítica-prática” na perspectiva hegeliana e iluminista. A história científica estaria sempre a serviço do poder. O discurso histórico passa a ser dominado pela tese moderna da tendência à liberdade absoluta no futuro. Com isso, se legitima a violência desses povos “mais civilizados” e a sua dominação cultural.

Seguindo os passos da narrativa histórica coberta da legitimização científica, vêm as narrativas de ficção. Isso significa dizer que toda a produção cultural interpreta como sendo de maior valor e mais atraente, aquela que representa o povo mais “civilizado” E esse povo é o europeu. As referências culturais das crianças e jovens fazem a representação massiva desse povo: branco (mais precisamente loiro) e rico. “As identidades individuais e coletivas das crianças e dos/as jovens são amplamente moldadas, política e pedagogicamente, na cultura visual popular dos videogames, da televisão, do cinema e até mesmo em locais de lazer como shopping centers e parques de diversão”. ( GIROUX, 1999:50) Quando essa cultura, que molda as identidades individuais dos jovens, universaliza uma interpretação do que é ser feliz e estar na moda, torna-se , então, uma influência muito grande para crianças e jovens passando a ser, para eles, referência e modelo a seguir.

Podemos entender com isso, que a cultura de massa está a serviço da anulação das diferenças e particularidades de outras etnias e culturas. Não existe lugar para o outro, a não ser o lugar da exclusão , da marginalização e do desprezo. Ser negro, ser mulato, ser índio, ser pobre, ser da classe média baixa, tudo isso é desprezado e entendido como o lugar do inferior, do excluído. A cultura produzida por estas etnias e classes sociais é vista como inferior, desprovida de beleza e estética, desprovida de conhecimento. Basta buscar um exemplo ( existem vários) de como a mídia representa, na nossa sociedade, os jovens felizes: nas novelas, nos desfiles de moda, nas campanhas publicitárias, no Big Brother, etc. Observa-se sempre a predominância de pessoas brancas, de olhos claros, europeizadas. Não há lugar para o negro, o mulato (grande representante da cultura brasileira), não há lugar para representantes de outras etnias e não há lugar para a produção de outras culturas, a não ser para serem vistas como “exóticas”.

É então que entra o importante papel da escola: a produção da cultura escolar. A cultura escolar deve trazer à tona os conceitos transmitidos pela cultura de massa. O professor deve levantar, em sala de aula, discussões entre os alunos sobre a criação das identidades deles próprios. Deve-se promover uma análise dessas produções no sentido de criticar o projeto político por trás dessas representações. É preciso tornar os conceitos da pós-modernidade, uma realidade na sala-de-aula.

A filosofia, como prática de reflexão, pode ajudar na construção desses conceitos. É necessário incluir a filosofia como disciplina obrigatória nos currículos escolares de nível fundamental e médio. A construção de um currículo adequado à realidade pós-moderna, fundamental para a construção de uma nova forma de educar, desfazendo-se do já ultrapassado conhecimento científico.

“O currículo – como corporificação de um suposto conjunto de valores, conhecimentos e práticas culturais – tem um papel crucial nesse processo. A escola e o currículo têm sido vistos - e tem realmente cumprido – a tarefa de incorporação de grupos e culturas diversas ao suposto núcleo cultural comum de uma nação. Educar é, nessa perspectiva, basicamente um processo de incorporação cultural” (DA SILVA, 1999: 195).

A escola é o lugar da aquisição e do aprimoramento de habilidades que deverão ser levadas em consideração pelo aluno para sua libertação do discurso e do olhar do outro, e passando assim, a ver, pensar e ler por si próprio.

Além de ser o lugar da aquisição da cultura e da instrução, a escola fica entendida, então, como o lugar da prática da cidadania e do domínio de si mesmo.

Para isso é preciso adequar o discurso escolar, produzindo uma cultura de contestação aos valores e estereótipos produzidos por um discurso cultural dominante.

BIBLIOGRAFIA

COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia. História e grandes temas. São Paulo. Editora Saraiva,2002.

DA SILVA, Tomaz Tadeu. “Os novos mapas culturais e o lugar do currículo numa paisagem pós-moderna” in -.& MOREIRA, A.F. , org . Territórios Contados: O currículo e os novos mapas culturais. Petrópolis. Vozes,1999.

GIROUX, Henry A. “ A Disneyzação da cultura infantil” in DA SILVA, T.T & Moreira, A.F. org. Territórios Contados: O currículo e os novos mapas culturais. Petrópolis. Vozes,1999.