Ser Mineiro

Mineiro é aquele que se levanta na madrugada, quando em férias na praia, para ouvir a arrebentação, indo até a janela para ver se o mar não transbordou. Mas nega até a alma que seria capaz disso.

Mineiro adora esquina e, talvez, por isso, é que contempla o mar azul, que encontra no infinito com o céu, como uma ampla esquina, única, sem fim, que o faz sentir uma paz e uma liberdade interior.

Mineira tem calos nos joelhos e nos cotovelos de tanto ficar ajoelhada num banquinho e debruçada na janela, olhando o movimento do que se passa na rua.

O boteco para o mineiro é uma instituição, um território livre, onde extravasa suas emoções. O mineiro é o inventor da botecoterapia. A pinga para o mineiro é como o whisky para o escocês, a vodka para o russo, o vinho para o italiano e a cerveja para o alemão. O café para o mineiro é um tônico indispensável, não somente no café matinal, mas durante a manhã, após o almoço, à tarde, durante uma visita, etc. O mineiro gosta de café encorpado, com gosto de café que fica na boca por mais de uma hora, pedindo um pito de palha, pois o mineiro da gema compra fumo de rolo para preparar o seu próprio cigarro e, por tal razão, é que deve gostar tanto de canivete.

A culinária mineira é simples, mas de sabor inigualável. Um frango ao molho pardo, com quiabo, com angu liso; um feijão tropeiro, ou um tutu com linguiça caseira - são irresistíveis para o mineiro -. A costelinha com orapronobre ou com quiabo...

No norte de Minas ele não resiste ao arroz fumegante com pequi e isca de carne ou frango acompanhado de farofa de andu verde e torresminho, à carne de sol com mandioquinha. Não dispensa o queijo e a manteiga diariamente.

A rapadura comum, a “cerenta”, (com textura de cêra) o “tijolo” (rapadura com mamão ou cidra), o doce de leite e a goiabada, caseiros, com queijo branco, os ovinhos de doce de leite na palha, as pamonhas, doces e salgadas, cozidas ou assadas, o mingau de milho verde, pastoso ou cortado. . .

A ambrosia ao leite ou em calda, de origem grega, é muito bem preparada e apreciada pelo mineiro.

Mineiro gosta de usar botina e chapéu. Alguns até fingem que não gostam, mas se você colocar uma botina ou um chapéu despistadamente perto de um mineiro em férias, ele, inevitavelmente, os usará.

Mineiro gosta de ver o tempo e o trem passar. Qualquer trem, ainda que seja voando. Gosta de um bom causo temperado com humor, mesmo que dramático.

Mineiro tem autocrítica e gosta de ser desconfiado, arredio, teimoso e frequentemente paga caro por isto. Ele gosta de uma variedade de Santos e cultua mais que outro brasileiro a Nossa Senhora. Faz de todos seus procuradores diante de Deus e para as diversificadas causas.

Mineiro gosta de uma vida lenta. Um mineiro no volante é conhecido: ele sinaliza que vai entrar à esquerda ou à direita e espera, espera, espera, até o último passar, quando não é mais necessária a sinalização.

Mineiro gosta de fazer seus negócios sem alarido ou, quando faz, é para despistar, prá todo mundo pensar que está enganando os demais, caindo num descrédito propositado, mas favorável, pois ele estará enganando mesmo!

Mineiro é respeitador e gosta de ser respeitado.

Mineiro é assim, solitário por natureza, pensador por definição e com uma alma imensa - um sábio enfim.

Di Amaral
Enviado por Di Amaral em 21/01/2008
Reeditado em 13/10/2015
Código do texto: T826796
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