O que é ser um Monitor de Colônia de Férias

Em alguma parte entre a adolescência e a fase adulta, ocorre no desenvolvimento humano uma idade que é física e psicologicamente impossível. É a incompreensível fase conhecida como Monitor de Colônia de Férias, uma criatura indefinida pelos psicólogos, mal interpretada pelos diretores da Colônia, adorada pelas crianças, admirada ou vista com desconfiança pelo resto da sociedade.

Um monitor de Colônia de Férias é uma rara combinação de médico, advogado, índio e chefe. É um competente psicólogo infantil. É uma babá mal paga, sem televisão e sem geladeira. É um disciplinador severo com um brilho nos seus olhos, um ministro para todos os credos, com dúvidas sobre o dele próprio. Ele é o juiz, o técnico, o professor. É um conselheiro. É o exemplo de fase adulta com um tênis gasto, uma camiseta duas vezes maior do que o seu número e um boné duas vezes menor. Em um momento de crise ele é o humorista, em uma emergência é o médico, um “puxador” de músicas, um artista para entreter, um diretor de teatro. Ele é um ídolo, com a cabeça numa nuvem formada pela fumaça da fogueira e seus pés de barro. É o cara que acabou de dar para alguém o seu único sanduíche.

Monitores não gostam de suco artificial com sabor indefinido, de acordar cedo, de reunião de funcionários, de dias chuvosos. Eles adoram banho de sol, intervalos, ensinar novos jogos e dias de folga. Eles são hábeis para reconciliar amizades rompidas, nariz sangrando e jeans rasgados. São bons para localizar trajes de banho perdidos, ficar acordado até de madrugada nos acampamentos a preparar “sketchs”. Dá dó vê-los tendo que entusiasmar as crianças nas manhãs chuvosas e tentando lembrar o nome de cada uma delas no primeiro dia da Colônia de Férias.

Mas quem, a não ser o Monitor joga inúmeros jogos em um pequeno gramado, caminha até o córrego e volta em 10 minutos para não perder o ônibus, planta bananeira, fala a língua do “pê” e come dez cachorros-quentes em uma noite no acampamento, mesmo que eles estejam congelados no meio?

De um Monitor é esperado reparar dez anos de estragos no Joãozinho em dez dias, tornar o Marquinhos um homem, reabilitar o Paulinho, permitir a Suzana ser um indivíduo e ajudar a Maria a se ajustar no grupo. Dele é esperado liderar os “bens” mais preciosos de vários adultos muito mais velhos que ele. É esperado liderá-los com diversão e aventura - mesmo que esteja com dor de cabeça; ensiná-los a viver na natureza mesmo que ele passe dez meses por ano sentado numa sala de aula; guiá-los nas regras sociais – quando ele ainda nem alcançou a maioridade; assegurar a segurança e saúde mesmo estando com o nariz queimado de sol, um band-aid no seu polegar e uma bolha no calcanhar.

Por tudo isso ele é pago o suficiente para comprar um livro para o próximo semestre, algumas aspirinas, alguns pares de meias, dois pneus para a bicicleta e alguma camiseta nova. Como será que ele consegue agüentar toda a pressão e manter o pique? Você se perguntará se ele realmente sabe o tanto que vale, e de alguma forma você compreenderá que jamais poderá pagá-lo o suficiente quando, ao partir no final de janeiro, ele acena tchau e diz: - até o ano que vem”.

Tradução e adaptação de um artigo da Revista “Camping Magazine” , de março/1965, por Lúcio Fonseca e Rodrigues.

***

Lúcio querido, para você que durante muitos anos, dedicou suas férias às crianças como Monitor, coloco, hoje, este texto no Recanto como uma forma de perpetuar a sua lembrança.

Kika, por onde anda, menina, que nunca mais apareceu? Se ler este texto, por obséquio, faça contato. Meu abraço.

fernanda araujo
Enviado por fernanda araujo em 31/01/2008
Reeditado em 15/07/2008
Código do texto: T841311
Classificação de conteúdo: seguro