Temas transversais X Literatura

Estética: palavra vinda do grego que significa sensação. Seu objetivo, segundo Kant, é o estudo da sensibilidade e das formas puras do sentimento.

O objeto da Estética é, portanto, o Belo. “O Belo é o esplendor da verdade”, segundo Platão. E o que seria a verdade? Poderia ser um acordo entre o pensamento e a realidade. Mas há mentiras ou desacordos belíssimos, como as lendas e as mitologias. E há verdades que não trazem em si nenhuma mensagem de beleza, como tratados científicos ou notícias desastrosas.

Os antigos já diziam que toda definição é difícil. E o problema se agrava quando tentamos definir ou conceituar certos abstratos, que pela sua própria natureza, perturba-nos com uma polissemia imprevisível. Tal ocorre com termos como Vida, Verdade, Amor...

A Arte é outra dessas palavras de difícil definição. Conforme Santo Tomás de Aquino, é “o meio adequado à realização de qualquer obra”.

Sob esse aspecto, a Arte opõe-se à natureza, pois é uma criação. A arte é uma ação sobre o universo.

Arte é superior forma do conhecimento intuitivo. É a representação sensível da beleza, através da intuição. E a intuição é uma mudança de forma.

Para ser artista, não basta apenas querer, é preciso poder. É a vocação, o dom, a adequação especial que algumas pessoas possuem para certas funções.

De todas as artes, a mais bela, a mais expressiva, a mais difícil é sem dúvida a arte da palavra. De todas as mais se entretece e se compõe.

Só a palavra, nas artes a que é matéria prima, fala ao mesmo tempo à fantasia e à razão, ao sentimento e às paixões.

O termo literatura é mais uma dessas palavras impossíveis de uma conceituação uniforme, tal a polivalência de sentidos com que é tomada.

A Arte (intuição), a Estética e a palavra são elementos da literatura. O conjunto estruturado de frases é portador de um conjunto de significados. Na essência da língua reside a possibilidade de palavras e frases “significarem alguma coisa”. É é nesse ponto em que a particularidade do texto literário se revela.

A arte literária pode ser conceituada, de forma restrita, como a arte que cria, pela palavra, uma imitação da realidade, a ficção, a criação de uma supra-realidade com os dados profundos, singulares da intuição do artista; pode ser verossímil ou inverossímil.

Literatura é sinfronismo: cada vez que uma pessoa frente a uma obra literária consegue emocionar-se e reviver em si os estremecimentos que comoveram o autor no instante em que a compôs, opera-se o efeito do sinfronismo, flui uma onda maravilhosa de sintonia espiritual capaz de aproximar simpaticamente dois seres, mais além do tempo e do espaço e as idades conjuradas pela emoção.

Literatura: função lúdica do espírito. O poeta é uma criança que se compraz em estilizar suas emoções, como um menino a edificar castelos na areia ou a fazer bolhas de sabão (Baudelaire já não disse ser “a poesia a infância que se encontrou de novo”?)

Literatura é evasão: é a compensação, é a fuga, é êxtase, é viver subjetivamente “num mundo da lua”, ou incrustar-se orgulhosamente “numa torre de marfim”.

Literatura é compromisso: é aliciante, engajada, sincrônica, amarrada às contingências determinantes de cada época.

Literatura é ânsia de imortalidade, de glória, de consagração.

A literatura visa o essencial, o universal. Não é essencialmente útil, considerando-se que ela não transforma objetivamente o modo de vida das pessoas. Contudo, contribui fundamentalmente para a formação dos homens, dando-lhes modos de agir, retratando-os em seus desejos, angústias e prazeres, contribuindo assim para que o homem descubra seu o ser.

A literatura é a expressão do homem e do humano. É energia que produz modificações nas mentalidades, contribuindo para a evolução coletiva e individual.

Quando paramos para refletir sobre a literatura, o fazer literário, deparamo-nos com vários questionamentos. Portanto, devemos ter em mente o que ela representa para o ser humano, qual papel desempenha substancialmente na vida das pessoas, o que justifica nosso estudo de então.

Por que trabalhar literatura na escola? Para que trabalhar literatura na escola?

Quando definimos, quando tornamos claros nossos objetivos, tudo fica mais fácil, tudo fica mais claro. Quero trabalhar literatura para mostrar apenas valores para meus alunos. Apenas valores? Mas valores não são fundamentais? Como assim “apenas”? Digo apenas, pois tudo o que foi dito a respeito dessa arte deve ser levado em conta.

Podemos tomar por base palavras organizadas em frases em um texto literário e em um não-literário. Qual é a diferença? Num texto não-literário, a seleção feita das palavras e a sucessão estabelecida conferem à frase uma significação que pode ser submetida à prova da verdade em relação à realidade imediata. Agora, as palavras num texto literário ganham uma significação que vai além do real concreto, remetem a uma realidade dos homens e do mundo, mas muito mais profunda do que a realidade imediatamente perceptível e traduzida no discurso comum das pessoas. Essa é a magia da literatura.

Portanto, pode-se dizer que o texto literário tem uma função estética, enquanto o texto não-literário tem uma função utilitária (informar, convencer, explicar, responder, ordenar etc.).

Quem escreve um texto literário não quer apenas dizer o mundo, mas recriá-lo nas palavras, de forma que, nele, importa não só o que se diz, mas também o modo como se diz.

Então, pensemos bem: o que estamos trabalhando em literatura na sala de aula? O que estamos mostrando aos nossos alunos como sendo literatura? Arte? Ou produto de uma avassaladora propaganda que nos incita a selecionar títulos que são consumíveis e consumidos como perecíveis? Como rápido se não estraga!

Como estamos escolhendo livros para serem apreciados pelos nossos alunos? O que vem primeiro: o objetivo a ser trabalhado com a obra; apenas a leitura em si; a obrigação de uma leitura por trimestre; uma indicação de colega que, nem ao menos foi verificado se valia a pena mesmo; a preocupação em apresentar uma obra de qualidade para incitar o gosto pelo belo, pelo prazeroso que será lembrado para todo e sempre?

A escolha é difícil? Claro! Com tantos catálogos mostrando mil títulos apresentados ao mercado, já com resumos e indicações de quais temas podem ser trabalhados, assim é fácil. Agora, escolher obras de qualidade em meio a tantas “historinhas” de fundo moral (ou não) é como catar feijão, aquele que se compra lá na roça. Que delícia que ele é, não é mesmo? Só que para prepará-lo tem-se que ter muita paciência, dedicação, porque ele vem cheio de lixo: gravetos, pedrinhas, barro... Mas ele é uma delícia! Eu não ficaria nem um pouco desanimada de ter esse trabalho porque valeria a pena o “sacrifício”. É muito bom criar uma expectativa de se deliciar com algo que satisfaz plenamente o gosto, a vontade, os anseios, não só do corpo, como, principalmente, da alma. E é aí que a literatura entra. Deve-se alimentar a alma de nossos pequenos para que eles possam ficar completamente extasiados das delícias que cada livro lhes reserva.

Temos que valorizar o trabalho do artista que suou, limou, preocupou-se em escrever um texto que valesse a pena ser lido. Que sentiu aquela emoção, aquele arrepio que, acredito, ele gostaria que o leitor também sentisse quando estivesse diante de sua obra. A aproximação do autor com o leitor dá-se nesse instante, o momento da leitura. O êxtase tem que se externar; aí, sim, aparece a magia da literatura. Se o autor-artista tem tanto cuidado na hora de escrever o seu livro, por que então também não o temos no momento de escolhê-lo?

Desde sempre acredito que não existe quem não gosta de ler; existe, sim, aquele que ainda não encontrou a literatura de sua preferência. Nós, professores, é que temos que apresentar aos pequenos toda a espécie de contos de fadas, mitos, lendas, poemas, contos, crônicas, romances, magia, fantasia, verdades e ficção, que vão encantá-los e dar-lhes a oportunidade de saber o que poderá ser a sua leitura para o resto de sua vida.

O papel da família é também essencial, mas, e se não tiverem condições para isso? Pode-se criar um leitor que não possui livro algum em sua casa? É claro! Equipemos nossas bibliotecas escolares com livros de qualidade. Incentivemos nossos meninos a freqüentar as bibliotecas públicas da cidade. Sabe aqueles livros que estão enfeitando a nossa estante lá da sala? Por que não lhes emprestar essas obras? Livros foram feitos para serem lidos, apreciados, devorados! Medo de estragar? Já li uma vez uma historinha de um livro que ficava em uma estante, quietinho, lindo, limpinho, sem nenhuma dobrinha, sem nenhuma marquinha, mas que morria de inveja de um colega seu que a todo instante estava nas mãos das pessoas, apesar de estar com as marcas do uso. Isso também pode ser ensinado às crianças: o cuidado, o carinho com o livro. Para que todos possam usufruir as suas delícias, é necessário que todos dêem valor a esse objeto tão precioso fazendo um bom uso dele.

A responsabilidade encontra-se nas mãos dos professores sim, que devem, primeiramente, ser apaixonados pela arte literária, para poder transmitir essa paixão para os alunos, fazer seus olhinhos brilharem ao escutarem uma linda história de amor, ver sorrisos iluminados ao sentir as aventuras de um herói atrapalhado, dar deliciosas gargalhadas, emocionar-se. O compromisso de transformação das mentes ávidas de saber é essencial, é primordial, é sagrado.