Questionamentos de um Futuro Negro

Sempre houve um sentimento de compaixão quando algo condizente ao sofrimento do povo negro foi mostrado.

O Brasil, país dotado de uma vasta cultura mesclada entre diversos segmentos étnicos, constantemente esculpe a imagem de uma nação anti-racista e democrática, procurando envolver seu povo com uma espécie de lavagem-cerebral extremamente moralista.

Entretanto quando algo de concreto é apresentado com a finalidade de combater a desigual concorrência entre jovens vestibulandos, dando foco aos que se enquadram à sociedade negra, o primeiro passo tomado foi sempre o da desconfiança.

O fato é que tem aumentado muito a discussão em torno da política de cotas para negros nas universidades brasileiras, uma iniciativa parcial a fim de tornar mais igual a quantidade de negros e brancos cursantes do Ensino Superior. E pelo que se apura, as duas opiniões (prós e contras) estão longe de chegarem a um acordo, dadas as extremidades de pensamentos.

Os contras possuem opiniões praticamente semelhantes. Protestam contra a falta de educação qualificada nos segmentos de ensino Fundamental e Médio, e têm razão. O que não se pode é tornar disso um alicerce argumentativo, levando-se em conta a contínua luta contra o problema e as poucas respostas e atitudes já sucedidas para o combate dessa situação. O ensino é ruim nas escolas públicas já há algum tempo e não vai ser, só, mais um ou outro protesto que vai mudar esse paradigma.

Outra ponto de argumentação dos que se dizem contra o sistema de cotas aos negros é a falta de "democracia biológica". O argumento praticamente decreta a igualdade de potencial biológico entre os brancos e negros da classe baixa do país. Salvo excessões, o material humano é praticamente o mesmo, com a supérflua, porém não desimportante, diferença de pigmentação da pele. Faz-se voz aos direitos dos brancos pobres, os quais passam pelas mesmas escolas e mesmas dificuldades dos negros alvos do benefício.

Carlos Ignácio Pinto, um professor/colaborador com bacharelado em História pela Universidade de São Paulo faz críticas consistentes aos que se opõe ao auxílio à comunidade negra brasileira. Em seu artigo ele divulga sua participação no projeto "Núcleo de Consciência Negra" da USP, o que proporciona a ele um convívio regular com membros da sociedade em questão.

É com muita propriedade que Carlos afirma ser "latente a exclusão do negro da Universidade Pública". O professor ainda apresenta números representativos quanto à quantidade e descendência étnica dos que são aprovados nas universidades públicas, mesmo fazendo parte da parcela menos-favorecida da sociedade brasileira. Segundo suas afirmações, mesmo os negros sendo maioria na classe-baixa do Brasil, se comparados os negros e os brancos pobres aprovados nos vestibulares, há uma grande diferença com pendor aos caucasianos.

Carlos Ignácio Pinto ainda faz uma grande crítica à afirmação de que a utilização, por parte dos negros, de camisetas com os dizeres "100% Negro" e afins é a exemplificação de uma espécie de racismo de ordem inversa, ou seja, é como se um negro se auto-excluisse da sociedade, se fazendo valer de uma valorização desnecessária de sua etnia.

No artigo é argumentado da seguinte maneira: "Estranho, quantas pessoas não desfilam entre nós com camisetas do tipo “MedicinaUSP”, “PoliUSP”, “Mackenzie”, “PUC”, “UNIUBE” e não os tratamos como racistas, apesar de a todo momento afirmarem sua condição de superioridade educacional. É racismo a afirmação da cor que traz na pele? Não existe uma negação do outro, mas uma afirmação da condição que sou. Se me afirmo como Universitário, tranqüilo; se me afirmo como Negro sou racista???"

Mas se o que diz o bacharel da Universidade de São Paulo é correto, então se um branco sair com uma camiseta dizendo "100% Branco" ele não seria racista. Acontece que hipotéticamente o ilustre professor/colaborador da USP teria total razão, porém se espera-se um resultado satisfatório, há de se estudar qual seria a reação de suas hipóteses em termos humanamente possíveis e coerentes. É fato: se um negro sai com uma camisa "100% Negro" ele é visto como alguém que valoriza sua etnia, mas se um branco sai com uma camisa "100% Branco" ele é firme e duramente execrado como um racista!

Se for feita uma análise hipotética e humana percebe-se a superficialidade da ação proposta. As cotas para os negros funcionam como álibi para setores educacionais do governo, os quais afirmam fazerem o que podem à respeito da desigualdade entre negros e brancos. Mas o que se percebe é uma ação assistencialista e inútil, dado o fato de se estar dando condições de acesso à universidades pessoas incapazes de acompanhar com igualdade básica o conteúdo futuramente apresentado.

Portanto a idéia do álibi torna-se clara ao concluir que, se está sendo feito algo minimamente satisfatório, dando exclusividade à população negra, quando se poderia estar igualando as oportunidades aos brancos e pardos pobres na sociedade nacional, então o intuito da ação é unicamente acalmar as críticas dos radicais que exigem uma ação do governo para com a população afro-descendente do país.

É triste constatar a covardia do governo brasileiro, simplesmente supérfluo em suas ações e inútil em resultados. Negros continuarão lutando por assistencialismos esporádicos, brancos continuarão criticando à priorização da massa afro-descendente do país, pobres continuarão sem oportunidades concretas e o país continuará vergonhoso em questões de desigualdade financeira e educacional enquanto não houver uma iniciativa realmente engajada e articulada para a soluções dos problemas sociais do país.