“O ILUSIONISTA” – MENSAGENS SUBLIMINARES
 
O Ilusionista é um dos mais belos filmes, rico de significados nem sempre perceptíveis na primeira vez em que é assistido, e menos ainda por todos que o assistem. De fato, há os que o assistirão várias vezes fazendo da história apenas a mesma leitura. Mas muitos outros irão mais longe - naturalmente, os que detêm uma percepção mais espiritualizada - e espírita - da vida.

Edward Eisenheim, o protagonista, é, à primeira vista, um mágico; um ilusionista, no significado mais estrito da palavra, que aprendera o seu ofício ainda menino de um homem misterioso que - e aí insinua-se o primeiro mistério da história - também realizava coisas extraordinárias, como desaparecer ele mesmo, carregando junto uma árvore dos campos onde acontecera o seu primeiro encontro.

Quando menino, as artes do aprendiz Eisenheim atraem justo a atenção de uma jovem duquesa, criança pertencente às camadas sociais nobres daquele país europeu; logo se encantam um do outro e, nada obstante as proibições imediatas de se encontrarem, alegando-se as condições sociais díspares entre ambos, o que fazem é exatamente o contrário. Claro; a duquesa, embora menina, não era uma mentalidade comum, menos ainda contaminada com os preconceitos do seu tempo. A autenticidade e pureza d'alma são as tônicas de sua personalidade, reveladas desde o princípio.

No resto da história, em sendo ambos final e definitivamente separados, o jovem Edward segue para uma vida sem paradeiro, onde desaparece com destino incógnito para muito mais tarde, já adulto, ressurgir realizando não apenas mágicas e truques de ilusionismo comuns - mas maravilhas, que acabam por estarrecer platéias até aos níveis mais seletos da sociedade, atraindo a atenção do próprio príncipe herdeiro, Leopold, àquela altura da história noivo justamente... da sua antiga amiga de infância, Sophie!

Só que o príncipe herdeiro, homem de caráter duvidoso, despótico, e de perfil doentiamente racional, termina por descobrir o antigo elo de Eisenheim com Sophie, pois que logo se reconhecem e retomam a sua história anteriormente interrompida à revelia. E, principiando uma perseguição velada ao ilusionista, em ocasiões em que se empenha obcecadamente em resolver a contento os segredos dos seus supostos truques, Leopold acaba antes, com o apoio de seu inspetor chefe de polícia, transtornado por deflagrar denúncia de fraude contra Edward, a desforrar-se do envolvimento secreto deste justamente com a sua noiva!

Se abordasse as artes comuns, por mais bizarras, dos mágicos tradicionais, O Ilusionista seria apenas mais um filme, nada obstante ainda e sempre encantador. Todavia, o que é exibido instiga o telespectador na direção da existência do sobrenatural, na conotação mais adequada a esta obsoleta designação para fenômenos que apenas e ainda hoje escapam ao escopo analítico da nossa limitada ciência. Nos próprios discursos de Eisenheim às platéias hipnotizadas, ele menciona as "leis naturais desconhecidas, a morte, a ilusão do tempo..." Tudo conceitos com os quais são intimamente familiarizados os paranormais, sensitivos, médiuns, e estudiosos profundos do espiritualismo e dos fenômenos extrasensoriais, na sua melhor forma.

Porque na verdade as artes de Edward Eisenheim afrontam as mentalidades de seu tempo (circunscrito à Viena do início do século XX). Quando se entrega aos gran finales de seus espetáculos, exibindo espíritos materializados que interagem com o público respondendo às suas perguntas - embora nunca mencionando quem e o que são! - e ademais sendo tais espíritos testados pelos presentes na platéia que, em tentando tocá-los, encontram nada mais do que uma transparência vaporosa, sua situação frente ao transtornado Leopold, já empenhado com tenacidade na sua perdição, periclita!

Eisenheim não poderia admitir seus dons, sua intermediação mediúnica em público. As sociedades espiritualistas eram mal vistas pelo status quo e pelas mentes arraigadamente cartesianas de seu tempo. Se o fizesse, ofereceria a Leopold as ferramentas que desesperadamente buscava para aprisioná-lo por fraude. Então, o que faz é justo o contrário, num desses momentos críticos - homem sagaz que era: afirma em alto e bom som perante o público em perigoso acesso de fanatismo que era preciso desenganá-los; que suas apresentações, todas, não mais eram que truques. Que, de fato, não era capaz de atrair da morte os seus entes queridos...

Só que, para desconcerto tanto de Leopold, a vigiá-lo encarniçadamente, quanto da polícia, em duas de suas apresentações finais atraí para o palco, diante do espanto de dezenas de presentes, justamente a presença espiritual de Sophie - a quem Leopold supostamente havia matado num acesso de fúria ciumenta*... embora tudo estivesse orquestrado pela jovem coadunada com o Ilusionista num fantástico plano de fuga final de ambos para a sua liberdade, unidos. É esta a gota final, tanto para Leopold quanto para a polícia, que, naquele ápice, tenta prendê-lo, em plena apresentação...

Não conto o desfecho entusiástico desta cena, em respeito aos que ainda não viram o filme e se interessem em assistí-lo. Antecipo apenas que a polícia acaba desvendando, devido a uma série de circunstâncias entrelaçadas à trama principal, as tentativas criminosas do príncipe interessado em usar Sophie apenas como instrumento para arrebatar a coroa do pai; bem como também compreendendo não somente a inocência de Eisenheim, mas também o ardil da falsa morte da duquesa...

O que se compreende com clareza nesta bela história, num nível subliminar, é o franco dilema que enfrentava naquelas épocas um homem dotado não apenas das habilidades para prestidigitador, mas também dos dons avançados do sensitivo, ou médium dos tempos atuais. A acuidade mental de que se fazia portador, para driblar investidas do poder estabelecido que não podia tolerar o manejo de leis naturais ainda desconhecidas da ciência tida como oficial, e ainda por um homem das classes mais desfavorecidas da população, afrontando o poder estabelecido e respeitado pelas massas. Pois, se se admitisse o que toda gente presenciava naqueles palcos, que espécie de ciência era a consagrada e tida como douta, na última palavra sobre questões graves a respeito de vida e de morte, da existência, ou da ilusão imposta pela contagem do tempo, e derivações infindas a partir daí?! Mais - como lidar com bom senso com a verdade de que tais dons extemporâneos vinham favorecer um representante humilde das camadas sociais mais baixas, e não um nobre?! E como admitir que uma duquesa prometida ao príncipe herdeiro da coroa o preterisse, e de resto prejudicando seus interesses políticos, em favor do homem representante dessas classes desprezadas que lhe fora amigo de infância, a par de primeiro amor de juventude?!

Sem dúvidas, a duquesa Sophie não nos surge como uma mulher comum, representante autêntica da mentalidade e das castas daqueles tempos. Jovem, interessou-se com inteireza d'alma pelo rapaz modesto, mas sobre o qual a sua sensibilidade pura, cristalina, livre de máculas, lhe segredou um indivíduo especial, dotado de dons e de valores que a encantaram e, com sinceridade, encontraram em seu íntimo ressonância perfeita.

Sophie pode ser identificada como a alma gêmea de Edward - aquele encontro que mais cedo ou mais tarde se verifica entre duas almas em ressonância perfeita de visão de vida e de padrão vibratório evolutivo. E que não encontram obstáculos para realizar sua união, acima dos ataques e posicionamentos em contrário de terceiros, devido à sua compreensão tácita de que a união prescinde de distâncias. De fato, isto se evidencia, na trama, no camafeu confeccionado por Edward, com o qual a presenteia no início da história, e que jamais ela retira do cordão delicado que traz ao pescoço, denunciando os sentimentos pelo amigo de infância que nunca deixaram de habitar seu íntimo, unindo-os, desta forma inexpugnável, até ao instante em que se reencontram.

O Ilusionista é, portanto, tocante história, onde o amor e a espiritualidade retratada nos primórdios da arrancada dos fenômenos de ordem mediúnica no último século encontram palco fascinante para exibir ao telespectador, de forma exuberante, os lances de uma realidade que ainda hoje encontra ressonância no dia-a-dia de muitos. Não talvez no de mágicos ou prestidigitadores, nada embora muitas polêmicas girem em torno de uns tantos, cujas realizações permanecem envoltas em encantamento e em mistério - mas no cotidiano de seres humanos comuns que, em qualquer época e em qualquer região do mundo, se vêem assim aquinhoados com a manifestação espontânea destas faculdades reveladoras da existência das dimensões ignoradas, muito mais ricas e mais vastas da vida, tendo que, em decorrência, enfrentar a ira, o orgulho e o despeito dos inquisidores cegos existentes em todas as épocas onde se viram obrigados a defrontar a grande ameaça representada pela simplicidade soberana destas almas de vanguarda.

*Ocorria, aí, em se tratando de alguém ainda em vida no corpo físico, o fenômeno que o Espiritismo nos explica como a bicorporeidade, manifestação espiritual simultânea de uma mesma pessoa em dois lugares ao mesmo tempo.

Carinho a todos,
Christina Nunes
Enviado por Christina Nunes em 04/05/2008
Código do texto: T974969
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