FUGA FRUSTRADA (COMPLETA)

FUGA FRUSTRADA

Ninguém acreditava em mim.

O Carnaval aproximava-se rápido. Eu tinha vindo a poucos dias de Itaberaí, deixando lá naquela terrinha boa, uma namorada.

- Bem , você vem passar o carnaval aqui comigo, não vem ?...

Aquela pergunta, depois de um doce beijinho, me deixava todo arrepiado.

- Venho sim, respondia resoluto nos meus 15 anos de adolescência efervescente e sonhadora.

Parti-me, com eles após promessa dos meus pais que eu voltaria. Mas na viagem de volta, ouvi que meus pais comentavam que daquele dia ao do Carnaval era muito perto e não era intenção deles voltarem. Fiz de conta que não era comigo, dormi só acordado já ao se aproximar de Goiânia. Estrada de terra a Mercedinha 220 preta, chacoalhando nos buracos e costelas de vaca, já estávamos todos empoeirados. Maquiavelicamente traçava os meus planos, não perderia aquela festa por nada.

Na quinta-feira, anta véspera do folguedo de momo, falei com minha mãe de minha intenção de ir para Curralinho, dando-me ela um sonoro não.

Aos 15 anos eu já era um homem, julgava. Não mais toquei no assunto, mas eu já estava preparado com um pouco de dinheiro, parte havia vindo das marmitas que carregava na casa do “Tio Bira”, com a venda de algumas garrafas velhas esparramadas no quintal dele, fiz uma faxina em troca delas.

Vendi também algumas latas de cinza de palha de arroz, era umas cinza brancas, retiradas de palhas em chamas brandas soterradas, serviam para arear vasilhas, a renda era boa, vendia a CR$ 2,00 (Dois cruzeiros cada), havia uma freguesia relativamente grande, e o restante do dinheiro vinha de engraxar alguns sapatos. Venda das bolas de gude, de selos usados, figurinhas principalmente as carimbadas. Lembro-me ainda de ter vendido um paletó para o Maurício e o jogo de camisa de futebol da molecada da rua.

Dinheiro no bolso, pouco, mais já dava para viagem de ônibus. Pensei sair de Anápolis, passar por Goiânia de jeito nenhum, a parentela mora toda lá, a tribo dos Leite, dos Caldas, dos Pinheiros, dos Bailões. Se fosse por aí eu seria pego logo, a viagem na estrada de terra demorava de 4 a 6 horas. Portanto inviável.

Matuei muito, após queimar alguns neurônios de massa encefálica, conclui a viagem seria feita via Nerópolis, Nova Veneza, Inhumas. Não deu outra, no dia aprazado, eis pois no velho ônibus laranja da Viação Pedatela, rumo aprumada à velha Goiabeiras. Como havia mata-burro, alguns modernos, feitos de trilhos da estrada de ferro, outros arcaicos mas funcionando, e outros nem madeiras tinhas eram verdadeiras valas, quanto muito, precários desvios.

A lavoura precária por toda a região, dando notícias da falta de animo e arrojo dos proprietários. As casas das fazendas muito simples, mais pareciam mal assombradas. Somente a parte que tocava à natureza, se fazia de uma beleza tal que já compensava a minha aventura.

E minha mãe, como se comportaria ao ler o meu bilhete ?

“Mãe, não se preocupe comigo, fui fazer um retiro em Silvânia onde vou passar o Carnaval. Estou em companhia do Padre Jair”.

Estou nas mãos de Deus.

Anápolis, fevereiro de 1956.

Jurinha

Minha mãe que não era boba nem nada, ao ler o bilhete, em vez de chorar como outra mãe qualquer, corrreu até a Igreja querendo saber notícias do padre Jair. Parece-me que esse padre que era de outra congregação, ia muito pouco alí, mas que no Colégio Auxiliadora, podiam lhe informar melhor. Foi o que ela fez. Ficou sabendo que fazia tempo que ele não dava as caras por aquelas bandas.

Bem pelo menos eu já ganhava meio dia de dianteira com a pista falsa. Nessas alturas eu já estava alcançando os primeiros galhos da Goiabeira. Mesmo eles tentando me intercepitar em Goiânia, eu já estava um pouco mais longe.

O dinheiro que eu tinha era pouco. O lanche na estrada fôra pago por um senhorque eu nunca tinha visto, mas tinha uma certeza, nunca o veria de novo. Agradeci ao descer do velho Pedatela, dirigindo-me para a estrada empoeirada a procura de uma carona. A primeira que achei só ia até Itauçu. Tudo bem, pensei fico mais perto. Nunca comi tanta poira na minha vida, era uma camioneta velha e eu ia na carroceria misturada com algus apetrechos de mudança. Ao aprocimar da 16:00 horas lá chegamos. Nova carona a tentar. Na terceira ou quarta tentativa, um caminhão velho, carregando telhas, dirigido por um irmão do Ciro, eu o conhecia, me deu carona em cima da carga. Consegui subornar o ajudante dele com algumas moedas, para ier no lugar dele da boleia, ele topou mas com ele também dentro. Tudo certo. Algumas léguas de poeira e eis-me no reino encantado da Curraleirandia.

Desembarquei no ínicio da praça maior, rumando incontinente par a casa da minha vó. Chegando lá ela achou meio estranho eu estar alí, mas como outras viagens era mesmo assim o procedimento, procurei um jeito de tomar um banho rápido, um lanche com os famosos biscoitos de queijo, estranhei não encontrei a cria da casa, minha amiga Mércia, companheirona para o que der e vier, ainda me lembro bem daquela vez que roubamos uma garrafa de licor de jaboticaba na dispensa da minha vó, tinha tantas de produção própria, munca sentia falta; e fomos lá para chacrara, que bebedeira, moça me ensinava tudo, que professora.

Libertando-me dos pensamentos pecaminosos do passado, fui a luta a fim de enfrentar os sonhos do futuro: Wanda.

Subi para a praça Maior, após avisar minha vó que iria para o baile de carnaval, fui até a casa do Dito Monteiro, o Tio Dito, toda a vez que assim o chamava ele dizia:

- Tio Dito, não, só Monteiro, dito é nome de preto.

É parece que não lhe era mesmo apropriado, principalmente levando em conta ser ele meio aloirado. Mas também eu não entendia nada, porque preconceito eu não tenho, tendo em vista que a minha origem étcnica é uma babozeira danada, aliás que só me traz orgulho.

Lá chegando, cumprimentei os treis loirinhos do Monteiro e minha tia, ama de leite, Maria Rosa. Fui até a oficina radiofônica do Monteiro no meio do quintal.O coloquei ao par de minha molequagem. Ele morreu de rir, falando fique na minha casa. Já já vamos jantar e depois iremos para o baile. Lá chegando, parece que haveria um baile só, o PSD e a UDN, estavam de mãos dadas, era o progresso político que chegava. Logo o Monteiro de além de mão solta, era um mulherengo de primeira, estavamos rodeados de moças bonitas, cervejas e muita lança-perfume, Colombina e Rodhia, sendo que a primeira era embalada em frasco de vidro e a segunda de metal. Ocorria até então riscos com a primeira, porque quando o bebum, cai com uma dessas, eram inevitaveis os cortes.

A gente erguichava aquele líquido frio nas costas das moças, que arrepiavam até na forquilha da alma, dando um frenetico gritinho tesudaço.

Quando já se ia lá pras tantas, eis que chega a Wanda, trocamos uns tys e wpsilones e fomos dançar, quando cansamos chamei para sentar na mesa do Monteiro, ela topou, mas não ficou muito, desagradou da presença de algumas moças e foi embora. Eu que havia fugido de casa para passar o Carnaval com ela, fiquei a ver navios. Fiquei nada peguei na mão da moça que a desagradou e fui dançar até o fim do baile. Que bom.

No domingo quando preparavamos para o matiné carnavalesco, chegou a notícia, não vaí mais haver carnaval, morreu o Chico Belizário. A cidade devia reverência mil para êle, músico e dos bons, chefe da banda, e outros etc. que desconheço, mas que o homem era bom, ah isso era. Muito embora ali naquele momento, estava estragando o meu carnaval. Estava nada, bola pra frente em Goiânia também tem. Boite Lisita, Jockei Clube, Clube do Dezoito, etc. Eta coisa boa.

Ao chegar na porta da casa do tio Dito, o Monteiro, avistei emfrente a farmácia do Sinhô Foseca, dois tios meus, mais nervosos do que de costume. O Tio Balduino e o Tio Jacinto, ambos Caldas como eu. Comuniquei o fato com o Monteiro, que me mandou tomar Benção deles.

O que fiz. Lá chegando foi uma saraivada de broncas, babas e cuspes por todo lado. Mas o que eu errado como estava, sem namorada, sem carnaval, sem dinheiro, não podia falar nada, só ouvir, reconhecer que estava errada e falar que precesava de uma graninha para ir embora, sabe, que saiu algo, muito pouco é verdade, oruncipalmente do Tio Jacinto. O muquirana mais pão duro da cidade, haja pandurisse, meu Deus, ele é demais.

Na primeira jardineira do Expresso Guarani que parou na porta do bar do José Pereira, olha nós lá dentro embarcando para comer mais poeira rumo a Capital.

Chegando tarde da noite, ainda consegui ir até ao Jockei Clube, após ter tomado um banho na cas da Tia Maria Pinheiro; conversei o porteiro que já estava meio sonolento, não foi difícil.

Lá dentro encontrei os primos, Gilbertinho e Jales Perilo, que pulavam junto com um montão de homens, oh catástrofe, lá em Itaberaí, eu tinha um montão de mulheres.Mai foi bom, ao sair do clube fomos até a Boite Lisita entra a Av. Araguaia e a Rua 6 , onde o baile já havia acabado, mas na porta havia um sujeito vendendo quatro lança perfume da Rhodia grande, pichichamos e as compramos barato.

Dali fomos para casa do Jales Perilo, passando antes pelo curral das Éguas, pontinho bom de se passar, tendo em vista a boa quantidade de mulheres.

Ao sair tomei uma cheirada maior de lança-permufe, vindo a bater com a cabeça na trazeira de um caminhão. Não sei como consegui chegar na casa do primo, nem eles sabem como fomos, porque o porre de lança foi grande.

Já no outro dia, resolvi ir para casa em Anápolis, meu pai ao me ver falou:

- O que voce acha que eu devo fazer com você ?...

Respondi:

- Mata!...

Goiânia, sexta-feira, 9 de fevereiro de 2001.

jurinha caldas
Enviado por jurinha caldas em 25/11/2008
Reeditado em 18/12/2008
Código do texto: T1301978
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