DE JORNALEIRO A JORNALISTA - uma história de vida (AMIGOS QUE FIZ E OS DEIXEI PELO CAMINHO, COMO REPÓRTER)

Depois trabalhei na Saga Publicidade e escrevia uma coluna sobre “Porto & Transportes” no Jornal do Commércio, herdada do jornalista Sebastião Carril, aos 18 anos. Fui demitido da Saga pelo dono da empre-sa. Alberto Castelo Branco. Em seguida, parei de escrever a coluna e ingressei em “A Notícia” no dia 1º de outubro de 1978, a convite do jornalista Gabriel Andrade, para fazer um teste. O empresário Andrade Neto era o dono do jornal. Foi minha primeira experiência jornalís-tic\\\\\a, escrevendo uma coluna com meu nome estampado em cima.

Trabalhando nesse jornal fiz história, construí muitos amigos e lancei meu primeiro, segundo e terceiro livros, respectivamente “(Des)Construção...” , de poesias, em 1979, com 19 anos, “Um pouco acima do céu da (boca), reunindo crônicas, contos e poesias, em parceria com Adry Araújo e “Carla, Carla e outros contos da terra”, no qual eu publiquei a crônica “Um dia fui jornaleiro”.

O “(Des)construção...”, por ser livro de estréia, foi todo produzido pelo escritor de “Mar de Sargaços” e prêmio Suframa de Literatura, Da-nilo Du Silvan. Ele também produziu a capa e todo o processo de lan-çamento, convidando as pessoas para prestigiá-lo, no “Salão dos Espe-lhos” do Atlético Rio Negro Clube. Andréa Limongi, João Valente de Azevedo e outras, foram alguns dos que compareceram a minha estréia no mundo das letras. Devo muito a Du Silvan, que além de escritor era também promotor de Justiça, ufólogo e presidente da Sociedade Amazo-nense de Antropologia e de Ufologia, que ele mesmo criou e presidiu por muitos anos.

Muitas coisas engraçadas e interessantes aconteceram durante os cin-co anos em que fui repórter do Jornal “A Notícia”

Através da democrática coluna “Território Livre”, tínhamos o costu-me de escolher sempre os “Piores do Ano”. Muitos escolhiam sempre os “Melhores do Ano” e a nossa coluna coletiva queria fazer o inverso. Os políticos eram os que mais sofriam com as nossas contundentes e quase nunca desmentidas críticas. Por isso, decidimos fazer a eleição de “Os Piores do Ano”.

Como repórter do jornal, tinha minhas fontes confiáveis e secretas. O Secretário Estadual de Administração, Natanael Bento Rodrigues, numa tarde, liga para “A Notícia” e pede para falar comigo:

- Carlos Costa, escreve aí na tua coluna “Território Livre” que o go-vernador José Lindoso está pedindo uma reunião com todos os secretá-rios, a fim de pedir uma contribuição financeira para a campanha de Josué Filho. Pediu sigilo e eu disse que lhe daria.

Saiu no “Território Livre” e a reunião foi cancelada. Até hoje procu-ram saber quem foi minha fonte.

Andrade Neto, reconhecendo que eu escrevia crônica muito bem, ofe-receu-me uma página para minhas publicações, aos domingos, com o título “Crônica de Carlos Costa”, ao lado dos cronistas Guido Fidelis e Chico Anísio. Todo domingo eu produzia uma crônica diferente, sobre assuntos variados, embora eu tivesse do meu lado o censor Paraguaçu Oliveira, por quem não passava nada se ele não tivesse lido antes. Muitos textos meus foram censurados.

Durante os cinco anos em que publiquei a coluna “Crônica de Carlos Costa”, freqüentava diariamente a 5ª seção da Polícia Militar, que cuida da relação com a imprensa, comandada pelo tenente Alfredo Assante Dias. Era eu e o repórter Oscar Carneiro.

Devido a essa minha proximidade com a Polícia Militar, sempre era convidado para almoçar com o comandante Mário Perelló Ossuoski, tido como linha dura no quartel. Às vezes, almoçava no quartel da Polícia de Guarda, com o tenente Edson ou na Companhia de Rádio Patrulha, con-vidado pelo aspirante Sirothou. Almoçando no quartel com os aspirantes, o comandante e alguns tenentes. Neste dia, estavam servindo frango. A Companhia de Polícia de Guarda e a Companhia de Rádio Patrulha eram unidas e o restaurante era um só, utilizado pelas duas companhias. Era amigo de muitos militares, que prefiro não citar por nomes porque posso esquecer alguém.

O aspirante Sirothou, da PM, sem que eu percebesse, comia o frango e colocava os ossos que sobravam dentro de uma bolsa de couro que sempre andava comigo. Todos riam. Quando percebi o fato, era tarde demais: tudo o que havia dentro da bolsa, inclusive as anotações que fazia para as notícias, carnê de pagamento de um telefone que tinha com-prado e outras coisas mais já tinham se estragado.

Um certo dia, com o diretor do Detran, Alfredo Assante Dias, dentro do meu fusca, fui parado em uma batida feita pela Polícia Rodoviária. O guarda bateu continência e disse:

- Pode passar. Eu já comprei A Notícia de hoje, mas ainda não tive tempo de ler sua crônica.

- Ainda bem que ele nos deixou passar.

- Por quê? Perguntou o diretor do Detran.

- Porque eu não tenho “carteira”.

- Passe amanhã comigo para fazer uma prova de Legislação. Se você passar, eu vou lhe dar sua carteira.

Fiz e passei. Depois, fui fazer o teste prático de rua, que era feito na ladeira da Rua Tapajós.

- O que tu estás fazendo aqui? Perguntou-me o chefe dos examinado-res, tenente Correia.

- Vim fazer prova prática para receber minha habilitação.

- Vai embora, antes que eu te reprove. Tu já diriges há muito tempo. Não vai fazer nenhuma prova prática. Passa depois no Detran e receba a sua CNH. Mesmo assim, fiz o teste e recebi minha habilitação das mãos do diretor.

Com minha habilitação em mãos, queria mostrá-la para qualquer po-licial de trânsito. No mesmo dia, aceitei o convite do Monteiro de Lima para uma viagem ao Território de Porto Velho e depois ao Território do Acre, onde faríamos cobertura de um conflito entre os plantadores de arroz e os índios Apurinãs, no Km-47 da Estrada Rio Branco/Boca do Acre. Fui dirigindo o Fiat147 do Monteiro de Lima, passei na barreira da Polícia Rodoviária e não pediram minha habilitação. Haja frustração!

Como freqüentava diariamente o Jornal do Commércio, onde entrava todos os dias na redação para deixar a minha coluna, o Francisco Pacífico (repórter policial), o “Cachacinha”, pediu-me um nome e um endereço.

Dei um nome e um endereço qualquer e ainda disse o bairro – Coroa-do, então propriedade da Ufam, cujo terreno estava sendo invadido por famílias, na época, sabidamente não tão carentes.

No dia seguinte fiquei surpreso com a manchete de primeira página: “Botijão de gás explode no Coroado e mata toda a família”.

Era tudo mentira. Mas tinha a foto para comprovar

No dia seguinte, logo cedo, apareceram na redação os diretores da Fogás, que queriam indenizar a família, que obviamente não existia.

O Pacífico foi chamado à direção pelo Sr. Epaminondas Baraúna, que lhe pediu explicações sobre o fato e determinou que ele acompanhasse os diretores da Fogás para encontrar o endereço citado, já que eles tinham estado lá e nada encontraram e nem encontrariam já que não existia nem a rua, nem o número e muito menos a família que deu nome à matéria.

O Pacífico entrou no carro e os acompanhou e, obviamente, nada en-controu – porque nada era verdadeiro. Voltou às 17 horas e comunicou o resultado ao diretor:

- Seu Baraúna, não encontrei o endereço, não!

- Mas como você até publicou uma foto?

- É que estava chovendo e eu fui pelo clarão – obviamente, tudo era mentira. Bati a foto e voltei para fechar o jornal

A Fogás ficou sem “indenizar” a “família enlutada”, e eu ri muito dessa estória. Não havia nada de verdadeiro na história contada. Não existia nem a rua, nem o número e nem a casa da família. Mas, para parecer mais realista ainda, o Pacífico publicou até uma foto de arquivo do incêndio.

Como repórter de “A Notícia”, convivi com muitos profissionais im-portantes para a minha vida: Hermengarda Junqueira (colunista social), Carlos Aguiar (colunista social), Denis Araújo, autor da foto de contra-capa do meu livro “(Des)Construção...”, Isaías Oliveira (repórter), Getú-lio Izel (repórter), Gerson Aranha (repórter), Terezinha Soares (repórter), Prêmio “Esso” de Jornalismo; Ivânia Vieira (repórter), Carlos Garcia (repórter), Monteiro de Lima (repórter), Raimundo Cardoso (revisor e pauteiro), Clóvis Silva (fotógrafo), João “Pinduca” Rodrigues (fotógra-fo), Denis Araújo (fotógrafo), autor da foto da contracapa do meu livro “(Des)Construção...”, Luiz Octávio Monteiro (repórter policial), Rai-mundo Holanda (revisor de textos), Plutarco Botelho (motorista e fotó-grafo), Francisco Lucena Baru (revelador), Zezinho Corrêa (colunista, hoje cantor, depois de uma famosa banda musical, a Carrapicho, que se apresentou até em Paris, (França), Bianor Garcia, “o homem das manche-tes porretas”, Sebastião Reis e muitos outros.

Confesso que depois de iniciar a minha produção de crônicas, me inspirei muitas vezes no que escrevia o também jornalista Plínio Valério, no caderno dominical “Vida”, de a Crítica, um dos melhores suplementos publicados naquela época. Nunca o copiei, mas sempre busquei inspira-ção na forma que ele escrevia para fazê-lo parecido ou melhor. Ele es-crevia crônicas belíssimas.

Como repórter do jornal, presenciei e testemunhei muitos fatos políti-cos e outros acontecimentos interessantes.

Decidi, então, produzir meus próprios textos. Foram mais de cinco anos escrevendo-as e publicando-as aos domingos da página “Crônica de Carlos Costa”.

Também como repórter do Jornal “A Notícia”, no final da década de 80, fui testemunha viva do que ficou conhecido como “Tragédia do rio Urubu”, quando um ônibus com ar condicionado da Empresa Soltur, passou da balsa e caiu dentro do rio.

Estava indo para o Município de Itacoatiara, fazer cobertura da elei-ção política na passagem do prefeito Chibli Abrahim para outro prefeito indicado por ele. Seguia em outro ônibus, com jovens tocando violões e fazendo batucada, quando, ao chegar à praça central da cidade, um carro passou e nos avisou que o ônibus que tinha saído depois do nosso, havia caído no rio Urubu. Na verdade, havia comprado minha passagem para ir no ônibus com ar condicionado, uma novidade em Manaus, na época, mas fui informado de que havia um outro ônibus, que também seguiria direto, sem escala, onde havia um grupo de jovens. Decidi trocar de ôni-bus. Mas meu nome ficou sendo noticiado em Manaus como uma das pessoas que haviam morrido.

Ajudei a resgatar cadáveres no rio Urubu, mutilados por piranhas. Só voltei para Manaus três dias depois. Minha mãe, aflita, mas com seu coração dizendo que eu não havia morrido, recebeu-me de madrugada, sem susto, embora estivesse escutado pelas rádios que eu estava entre os mortos. Passei dois dias dormindo e não fui à escola. Fiquei sonhando por algum tempo com a tragédia e lembrando-me dos cadáveres que tinha ajudado a tirar do ônibus e colocar dentro de um caminhão e dos noivos que tinham ocupado meu lugar.

Alguns amigos meus, sentindo minha falta por dois dias no Instituto de Educação do Amazonas, chegaram a me fazer visitas, pensando que eu estivesse entre os mortos.

Anos depois, de julho de 1988 a setembro de 1989, escrevi com regu-laridade, ao tempo em que editava a página nacional do Jornal “Folha da Tarde”; na Editora Garcia, a coluna diária “Folhetim da Dor”. Era o diretor da empresa o sociólogo Mário Jorge Correia, um grande amigo que um dia pensou em lançar em livro todas as minhas crônicas da minha coluna, mas eu achei melhor manter o anonimato de quem as escrevia. A primeira crônica que escrevi foi em homenagem ao colega de redação Augusto Banega Montenegro; todas as outras foram de livre criação minha, não havia cartas de leitores, embora a coluna informasse que as crônicas eram compilações de estórias criadas, inventadas ou vividas por leitores.

Algumas crônicas ficaram famosas. Lembro-me bem de duas: “A mo-rena do Chevette azul”, estória de uma professora de uma Universidade que, ao terminar suas aulas, “caçava” garotões em paradas de ônibus, alguns até ex-alunos e os levava para o motel e a “Mulher do Marinhei-ro”, que contava a estória de um mulher que traia o marido com o próprio sogro. Essas duas ficaram famosas pelo número de cartas escritas para a redação por causa delas. A “morena do Chevette azul” recebeu 48 cartas de leitores masculinos; e a história da mulher que traía o marido com o sogro, recebeu 96 cartas. À “Mulher do Marinheiro” foi embora de Ma-naus e escrevi uma crônica em que ela se despedia da cidade. A “morena do Chevette azul”, que seria uma professora da Ufam que procurava alunos pelos estacionamentos do Campus para um sexo sem compromis-so, eu escrevi uma outra crônica com ela pedindo demissão.

Um dia chegou uma história denominada “Vingança de um macho traído”. Contava a estória de um cara que pegou a mulher dele no “fla-gra”, encheu o Ricardão de “porrada” e foi parar no xilindró, onde serviu de noiva pros outros presos. Acontece que o corno gostou de escorregar no quiabo e quando saiu da cadeia, resolveu se vingar, paquerando e conquistando o Ricardão que estava morando com a adúltera, que acabou perdendo o amante para o ex-marido.A autoria desse “conto urbano” ficou em segredo por 20 anos. Só agora, em 2009, meu amigo Gabriel Andrade me confessou que inventou a história do machão que virou gay só pra sacanear com um colega de redação famoso por aplicar catiripapos na dona encrenca dele. O nome do tal colega Gabriel garante que não revela nem com anzol no olho.

Em 1980, o prefeito Raimundo Reis, do Município de Parintins, terra dos bois “Garantido” e “Caprichoso”, apareceu na redação de “A Notí-cia”, convidando um repórter para fazer cobertura do Festival Folclóri-co.

O próprio Andrade Neto o recebeu, mas foi logo avisando:

- Pelo jornal “A Notícia” não mandarei nenhum repórter porque se ele for, é só farrear, tomar cerveja, gastar dinheiro do jornal e, ao final, não escreve a matéria.

Em 1981, ano seguinte, decidi pedir férias exatamente no período do Festival e, em um avião DC-3 da Empresa Rico Táxi Aéreo, pilotado por Mickey Yurtsever, rumei para Parintins. O prefeito conseguiu acomoda-ções em um prédio, conseguiu um carro, eu escrevi a matéria e ainda fiz uma crônica “Parintins Fantástico”, falando de alguns fatos importantes da cidade, como os restaurantes “Piroca da Gadelha” e o “Banho da Ro-sa”. Nessa época, conheci o radialista Marcos Santos. Ele me empresto uma roupa, toda branca, para eu desfilar na comissão de convidados de um dos dois – não lembro qual, com o compromisso de na noite seguinte, desfilar também na comissão de frente do “boi contrário”.

Depois o Marcos Santos explicou-me o porquê de tal cuidado:

- Senão, podem pensar que você está protegendo e apoiando só o nos-so boi. Assim, dançando nas duas comissões de frente, ficará tudo em paz e ninguém vai falar nada.

No ano de 1986, já com o governador Amazonino Mendes assumindo a administração do Estado, o Festival Folclórico de Parintins passou a ter mais atenção. Foram para o Município, levados pelo Secretário de Estado da Comunicação, Ronaldo Tiradentes, vários repórteres de Manaus, da Rede Globo de Televisão, do Jornal do Brasil e do Jornal O Estado de São Paulo. Com isso, a Rede Globo publicou matéria de 15 segundos, e os outros jornais também noticiaram sobre o Festival. A partir daquele ano, o Festival e o município nunca mais foram os mesmos.

Devido à convivência com o fotógrafo Clóvis Silva, passei a ter, tam-bém, amizade com o fotógrafo de “A Crítica”, Djalma Almeida. Clóvis Silva era tio do Djalma Almeida. Ficamos amigos até os dias de hoje.

Antes de ser inaugurado o Bumbódromo da Cidade de Parintins, os primeiros Festivais ocorriam em um tablado montado no “Aeroporto Júlio Belém”, no centro da cidade. Participei da Comissão de Frente dos dois bois, nos anos de 81 e 82 porque, na época, para um repórter sair e desfilar por um boi, tinha, no dia seguinte, que desfilar pelo outro para manter a imparcialidade.

O prefeito Raimundo Reis foi o maior divulgador do Festival Folcló-rico e o transformou no que ele representa hoje para a cidade em termos de novos investimentos, patrocínios aos bois, além de outros benefícios como a Construção do Bumbódromo, asfaltamento de ruas, sinalização etc.

Para fugir de sua censura, criei vários personagens. O “Eleutério” foi um deles. Era analfabeto, pai de oito filhos, casado com uma socióloga e se lançou candidato a vereador.

Durante o período de campanha, achando-se com imunidade, tentou entrar no baile de carnaval do Bancrévea, dirigido por Alberto Martins. Depois, do outro lado da rua, tentou entrar no Cheik Clube, dirigido pelo ex-vereador Luizinho Souza. Em ambos os locais foi barrado, discutiu com os seguranças, e foi posto para fora.

Recebendo apenas dois votos, um da esposa dele e outro não se sabe de quem foi, a socióloga o esperou voltar do partido, com uma vassoura na mão:

- Esse outro voto foi da tua amante porque tu és tão burro que nem votou em si próprio. E foi batendo nele em todas as partes do corpo.

Foi atendido no hospital Getúlio Vargas pelo meu amigo Dr. Montei-ro, o “Monteirão”, um misto de médico e motoqueiro:

- Que te aconteceu, Eleutério? Foi um trator que passou por cima de ti? E recomendou radiografias em todo o seu corpo.

João Bosco Ramos de Lima, senador pelo Amazonas, ex-repórter de “A Notícia”, trabalhando em “A Crítica”, era inimigo de Andrade Neto e tinha sofrido um derrame cerebral em Brasília, ficando em coma.

Ao mesmo tempo, Andrade Neto mandou fazer, em madeira, com le-tras grandes, a manchete “Bosco Morreu”, pediu aos seus repórteres que fossem colher tudo sobre o senador, ouvindo, inclusive, a opinião do povo.

Eu recebia e revisava os textos que vinham das agências de notícias e era encarregado de informar ao Andrade Neto sobre a saúde do senador João Bosco.

- Como ele está hoje? Saiu do coma?

- Ainda não, respondia!

- Será que ele vai morrer?

- Não sei!

Enfim, o senador morreu, e “A Notícia” saiu em Edição Extra infor-mando tudo sobre ele.

Durante muitos anos, escrevi matérias sobre os processos existentes no Poder Judiciário. Um dia, deparo-me com um processo de uma mu-lher, Zilda Azevedo de Souza, acusada, juntamente com outras pessoas, de ter matado sete motoristas de táxi e ter deixado os corpos nos ramais da Estrada Manaus-Itacoatiara. Ela teria, supostamente, os “assassina-dos” em Manaus e os despejado nos varadouros – ramais onde eram jogados – e um está “desaparecido” até hoje. Os crimes ficaram conheci-dos como “Varadouro da Morte”. Estive na Penitenciária do Estado, na Avenida 7 de Setembro, entrevistando a suporta criminosa. Ela contou uma história sobre os crimes e me convenceu de sua inocência. Só ela havia sido condenada. Os homens, supostamente integrantes de sua qua-drilha, tinham sido absolvidos por falta de provas.

Depois que ela foi condenada a 57 anos de cadeia, estive fazendo o mesmo trajeto feito supostamente pela acusada, levando um suposto cadáver dentro da mala do meu carro. Passei na barreira da Polícia Mili-tar, com um militar fardado dentro do meu carro. Não revistaram meu carro, não me pararam e eu me convenci mais ainda da inocência da ré. Ela dizia que se fosse absolvida em segundo julgamento, pegaria sua neta e se mudaria de Manaus para a Bolívia, onde passaria a residir.

Tendo como advogado de defesa o Dr. Armando Freitas e, como promotor de Justiça, o Dr. Yano René Pinheiro Monteiro, no dia do se-gundo julgamento de Zilda, escrevi matéria assinada de página inteira em “A Notícia”, com o depoimento da acusada. O título da matéria foi: “Zil-da: Culpada ou Inocente?”. O advogado de defesa, Armando Freitas, adquiriu os jornais, distribuiu aos jurados e pediu que todos os lessem. Zilda Azevedo de Souza foi absolvida por 7 X O, e o promotor não re-correu mais.

Durante o Governo José Lindoso, a administração do Poder Executi-vo foi transferida do Palácio Rio Negro para o atual prédio da Secretaria de Estado da Fazenda. Lá, o governador despachava, recebia as autorida-des e praticava todos os atos administrativos do Governo.

Recebi, das mãos do tenente Alfredo Assante Dias, um boletim de ocorrência da Polícia Militar do Estado informando que um garçom ha-via sido preso dentro do Palácio do Governo, roubando toalhas.

- Já tenho a manchete principal do Jornal “A Notícia”, para hoje.

No dia seguinte, saiu a manchete assim: “José Lindoso, preso dentro do Palácio do Governo, roubando toalhas”.

No dia seguinte, logo cedo, o então Secretário de Comunicação do Governo José Lindoso, escritor Elson Farias apareceu na sede do Jornal. Sabia que vinha alguma bronca feia.

Ele entra na sala junto com Andrade Neto, que manda me chamar na sala da redação.

Entrei na sala do dono da empresa levando a prova do crime. Estava lá, com o timbre da Polícia Militar do Estado que um garçom por nome de José Lindoso da Silva tinha sido preso dentro do Palácio do Governo, furtando toalhas.

Elson Farias, fazendo o seu papel de Secretário de Governo disse a-penas:

- Mas o nome dele é José Lindoso da Silva e não só José Lindoso. Então, por que o Jornal não colocou na primeira página o nome completo da pessoa que foi presa?

- Nome completo dele não daria todo na primeira página. Portanto o abreviamos e só colocamos o primeiro e o segundo nome dele e publi-camos a matéria. O senhor já sabe qual foi a fonte! – Respondeu Andrade Neto.

Nesse dia, tinha o pedaço do Jornal em que foi publicada a matéria, afixado em todas as Delegacias de Polícia de Manaus. A edição vendeu que nem água.

No dia seguinte à publicação, o Governo limitou um pouco mais o acesso dos repórteres às fontes de informação.

O Jornal “A Notícia” fazia oposição ao governador José Lindoso.

Bianor Garcia, em sua coluna “Redator Biônico”, todos os dias, sempre ao final, criticava um mesmo comerciante português. Ele decidiu dar o troco. Entrou armado na redação, dirigiu-se à sala ocupada pelo redator, colocou em cima da mesa o revólver e foi logo informando:

- Ta vendo isso aqui? Isso é para homem macho. Mas como descon-fio que nem isso você é...

E começaram uma discussão acalorada.

Ao fim, antes de bater a porta de vidro da sala em que ficava Bianor Garcia, ele olhou para trás e falou:

- Bianor, você é um rato!

Na hora, Bianor ficou meio sem ação. Minutos depois, deixa sua sala e pergunta:

- Gabriel, cadê aquele fi...de uma pu...? Ele pensa que pode entrar na minha sala, colocar um revólver em cima da minha mesa e depois me chamar de rato?

- Não liga não, isso é besteira, aconselhou o chefe de reportagem.

- Raciocina comigo, Gabriel: o rato gosta de queijo, o queijo vem do leite, o leite vem da vaca, a vaca é mulher do boi. E o que o boi tem na cabeça? Chifres! Esse fi..de uma pu...me chamou foi de corno!

O comerciante já havia entrado em seu carro e abandonado o jornal.

Depois desse fato, só pessoas anunciadas e autorizadas passaram a ter acesso à redação.

Por falar no Gabriel Andrade, que foi repórter, chefe de reportagem e editor de vários jornais e que acompanhou o meu início na redação do jornal A Notícia, é ele quem me fez lembrar algumas histórias daquele tempo. Nós trabalhávamos sob o olhar severo da Ditadura, que tinha colocado agentes da Polícia Federal dentro da redação.

Tudo o que se escrevia era lido pelos agentes. Se aprovassem, ia para as oficinas; se não aprovassem, ia direto para a cesta... de lixo.

Certa ocasião, em que os censores eram um ex-padre e a mulher dele, que estava grávida, Gabriel fez a manchete em cima de uma briga de índios, numa aldeia do rio Javari, na fronteira com o Peru. Um índio tinha matado outros a terçadadas, e Gabriel exagerou nas tintas, abrindo a manchete “Índios bêbados banham de sangue o Vale do Javari”.

Como era de se esperar, a manchete foi censurada.

Já eram lá pelas 11h da noite, e Gabriel resolveu castigar os censores. Junto com o Mário Buzaglo, nosso diagramador, desmanchou toda a primeira página e começou a fazer tudo de novo. Meia noite, uma hora da madrugada, a censora grávida dormindo com a cabeça apoiada na mesa, o marido dela mais brabo que siri na lata, e os dois enrolando para refazer a primeira página. O pessoal da oficina também pu..., até que liberaram a página que o censor não quis mais nem ver. Incrível é que, depois de tanta confusão, a manchete acabou sendo publicada com título “Banho de sangue no Vale do Javari”. Cada uma pior do que a outra.

Mas era uma época bacana de se viver e trabalhar porque segundo Gabriel Andrade, exigia muita criatividade para criticar a Redentora (como jocosamente a gente chamava o golpe militar de 1964) sem dar muito na vista.

Como no dia em que o fotógrafo João Pinduca Rodrigues, no cami-nho para o jornal, pela Rua Maceió, notou um monte de gente pegando peixes num buracão alagado aonde até hoje funciona a indústria de água mineral Santa Claudia, no sentido centro-bairro. Era mais uma obra do prefeito Jorge Teixeira de Oliveira e eu fui cobrir a matéria.

Pinduca chegou na redação com um monte de fotografias da pescaria, homens, mulheres e meninos com cambadas de carás, traíras, tamauatás e outras espécies. Gabriel não contou desgraça e abriu página dupla central na A Notícia com o sugestivo título “O dia em que o povo tirou a barriga da miséria”.

Dava de tudo na nossa redação: havia repórter pai de santo, repórter espírita, repórter padre, repórter batuqueiro... era muito eclética, por isso A Notícia era um jornal que onde cada leitor encontrava o que mais lhe interessava.

O Adegeno Amaro, por exemplo, que, junto com Nestor Nascimento, formavam a dupla Nestorgeno (alusão a Nestogeno, uma marca de ali-mento para recém-nascidos), fundou uma associação de defesa das donas de casa, protótipo das associações de defesa do consumidor que existem hoje. Dedé criou uma coluna onde tacava o pau na inflação e nos preços altos. Mas durou pouco. Logo depois ele enveredou pelo espiritismo e passou a assinar uma coluna de orientação kardecista.

Nestor, por sua vez, fundou o Movimento Alma Negra, o qual presi-diu até a data de sua morte. O MOAN tornou-se o primeiro e mais impor-tante movimento de defesa dos negros no Norte do país, numa época em que negro não era tratado como “afrodescendente”.

Enquanto isso, o Getúlio Izel, que falava fanhoso e arrastava nos “e-les”, virou pai de santo, abriu um terreiro no bairro da Compensa onde pegava a cabocla Mariana, e a gente ainda ia lá de vez em quando curtir com a cara dele.

Adegeno, Nestor e Izel já partiram desse mundo, infelizmente, assim como se foram os nossos Altair “Capitari” Rodrigues e Luiz Otávio, entre tantos outros que Deus já chamou para si.

Mas tinha o repórter padre. Trata-se do (graças a Deus ainda vivo) Alberto Jorge. Ex-seminarista, se tornou umbandista, concluiu os cursos de Psicologia e Serviço Social e foi presidente da Associação de Cultos dos Afro Descendentes e do Conselho Regional de Psicologia. Alberto Jorge é único. Para os amigos dele ele é, ao mesmo tempo, padre, jorna-lista, umbandista, assistente social e psicólogo.

Tinha também o repórter Miltão Ferreira, que foi presidente da Asso-ciação dos Grupos Folclóricos de Manaus. Miltão apareceu na imprensa como assessor do Missionário Ivo Silva que, por sua vez, apareceu em Manaus fazendo curas milagrosas como as que os pastores da Universal e de outras seitas dizem que fazem agora.

E havia o jornalista Isaías Oliveira, chamado de Profeta, pelo jorna-lista de “A Crítica”, Peri Augusto. Isaías é um cara super-tranquilo, mas muito verdadeiro, e por causa disso perdeu o emprego no jornal A Notí-cia.

Uma noite, Marilu apareceu na redação distribuindo fatias de uma bo-la que ela mesma fazia. Depois, saiu perguntando se estava gostosa, e o Isaías caiu na besteira de dizer que estava dura. Marilu se queixou pro Andrade e, no dia seguinte, o excelente repórter pegou o bilhete azul. Quem mandou não elogiar a bola da “mulher” do chefe?

Mas o Andrade era pessoa boa praça. Permitia até que o Mário Buza-glo improvisasse uma bola com cola de sapateiro (que era usada para colar matérias, no antigo processo de fazer jornal) e toda noite era aquela pelada na redação, até o dia em que quase acertaram uma bolada no Bia-nor Garcia. O jogo de fim de expediente acabou ali mesmo.

São muitas lembranças de um tempo em que fazer jornal era român-tico, apesar dos baixos salários, da censura prévia, dos processos, etc. e tal. Só o Andrade Neto dizia que respondia mais de 70, em função do jornal, e ainda abria armário de aço, no canto da sua sala, para provar que era verdade.

Ainda como repórter de “A Notícia”, passei a freqüentar o escritório do advogado Tude Moutinho da Costa e, mais tarde, também ia à sua casa geralmente acompanhado com o ex-padre e ex-vereador Vitório Cestaro. O Tude fazia-me críticas constantes em razão de eu sempre estar com a unha grande no meu dedo mindinho. Já tinha um carro marca Corcel I, vermelho e todos os sábados ia à casa do Tudi pela manhã. Saía de lá e seguia para a casa do Dr. Raimundo Silva, no Japiim, a quem um dia eu o chamei “de um desconhecido advogado do Júri, com boa orató-ria”.

O Tude era meio “louco”!

Um sábado, pediu-me que deixasse o carro em sua garagem, no bair-ro de São Lázaro, onde residia, pegasse um fusca novo que ele tinha comprado para sua mulher, como presente de aniversário e fossemos para o balneário do GET, da Telamazon, com um litro de uísque embaixo do braço.

Como residia próximo a uma igreja evangélica e ao lado do Bar Coca 2 onde, aos finais de semana, sempre havia música ao vivo, o Tude, de-pois de denunciar os dois lugares sem que providências fossem tomadas, comprou um conjunto de som e um alto-falante, que mandou instalar no alto de seu muro. Toda vez que começava o barulho na Igreja Evangélica ou no Bar Coca 2, o Tude ligava a sua aparelhagem de som e alto volume e passava a ouvir música orquestrada. Não sei o que aconteceu, se os barulhos pararam, mas sei que o advogado Tudi não mora mais no local.

O Tude bebeu um litro de uísque, quase sozinho. Na hora de voltar, deu-me a chave para vir dirigindo.

Em frente à Iplam – Indústria de Pasteurização de Leite do Amazo-nas, fiz uma manobra muito atabalhoada, em função da bebida que tinha tomado no Clube GET – Grêmio Esportivo da Telamazon, passei por cima do meio-fio e entrei na garagem. No dia seguinte, o Tude me liga e pergunta se eu sabia o que tinha acontecido com a barra de direção do carro da mulher dele. Eu lá lembrava de nada!

Feita a revisão no fusca, tinha entortado toda a barra direção e teve que ser trocada por outra.

Gilberto Mestrinho tinha sido banido do Amazonas e foi morar no Rio de Janeiro. Depois da “abertura política”, com a eleição de Tancredo Neves no Colégio Eleitoral, o Andrade Neto decide mandar o repórter Monteiro de Lima ao Rio de Janeiro para fazer uma entrevista com Mes-trinho.

A matéria, com muitas fotos, foi publicada em página inteira e reper-cutiu muito. Andrade Neto decide patrocinar o retorno de Gilberto para Manaus, que se lançou logo candidato de oposição ao Governo, contra o candidato da situação, Josué Filho.

Durante o período em que cobria o Poder Judiciário, conheci advoga-dos, juízes, promotores e desembargadores.

Cobrindo um julgamento no Tribunal do Júri, passei a conhecer um advogado que o chamei de “desconhecido advogado de júri, mas com boa oratória”, Dr. Raimundo Silva. Através dele, fui apresentado aos advogados Flávio Queiroz de Paula e Ivo Alberto Brasil Lagos.

O advogado Raimundo Silva, filho de Itacoatiara, de origem também muito pobre, indo para lá defender no júri o homicida que ficou conhe-cido como “Barabadá”, eu dirigindo o Chevette dele, quando ele gritou:

- Para o carro, Carlos, para o carro porque acho que estou vendo um disco voador lá em cima.

- Que foi, Silva?

- Tem um disco voador lá em cima!

- Onde, Silva?

- Lá, tu não estás vendo, não?

- Não! Eu estou vendo um carro vindo em nossa direção, em sentido contrário!

E, de repente, passou um carro ao nosso lado. Ele disse:

- Prossegue!

Eu fiquei sem entender nada.

Nossa amizade ficou tão forte e confiável, que eu sempre passeava de lancha com eles, o Dr. Silva, o Dr. Flávio Queiroz de Paula e o Dr. Ivo Alberto Brasil Lagos.

Uma vez, o Dr. Flávio Queiroz, em sua lancha, deixou a mim e minha namorada Maria Luiza, numa espécie de ilha e foi para o outro lado do rio. De noite, eles voltaram. Eu me enterrei na areia de tanto frio que fazia. O Dr. Flávio Queiroz saiu da lancha com uma lanterna, focando e eu escondido, enterrado na areia. Ele gritava:

- Carlos! Carlos! Eu acho que ele nadou até a praia e morreu afoga-do!

Eu apareci e dei um susto nele!

Quanto ao amigo Raimundo Silva, ao assumir uma cadeira de Juiz Togado do Tribunal do Trabalho, em Tabatinga, escrevi uma crônica para ele: “Meu caro Silva”.

Foi através do Dr. Raimundo Silva e com discurso seu, enaltecendo minhas qualidades poéticas, que lancei meu primeiro livro “(Des)Construção...”, em Itacoatiara, em um evento que parou a sede da Câmara Municipal do Município. Vendi poucos livros, mas foi de uma importância vital para mim.

Meu ingresso na União Brasileira de Escritores, dirigida pelo escritor Jayme Pereira, seu deu por indicação do poeta, escritor, ufólogo e pro-motor de justiça, Danilo Du Silvan. No dia, além dele e do presidente da UBE, dentre outros, estava presente também o ex-juiz Newton Sabbá Guimarães. Lancei “(Des)Construção...” em 1979... Meu ingresso na UBE – União Brasileira de Escritores ocorreu nos primeiros meses de 1980.

Certo dia, quando fazia matéria com o então reitor da UFAM, Octá-vio Hamilton Botelho Mourão, encontro com o pintor, escritor e outras coisas mais, Moacir Andrade, subindo uma escada.

- Maninho, eu estava doido pra falar contigo mesmo. Maninho, como você é amigo do professor Mourão, peça a ele para dar-me uma passa-gem para Fortaleza, que eu quero visitar uma menina que já mandei na frente e ela está me esperando lá.

Dias depois, encontro novamente com o pintor Moacir Andrade e pergunto a ele:

- E aí, tu queres ainda a passagem para Fortaleza?

- Para quê, maninho!

- Tu não tinhas mandado uma “gatinha” para te esperar lá.

- Sabe que eu já até esqueci desse fato!

O Moacir Andrade era assim mesmo!

Outra vez, parou-me, abrindo os seus braços imensos:

- Maninho, era com você mesmo que eu queria falar!

- O que foi dessa vez, Moacir?

- Maninho, estou com uma briga danada com o teu amigo Danilo Du Silvan e quero que você assuma a presidência da Sociedade Amazonen-se de Antropologia porque só com você na presidência essa briga pode ser resolvida!

- Mas eu não entendo nada de antropologia, Moacir. Como é que vou assumir uma coisa dessas!

- O Danilo também não entende nada de antropologia e ele não é o presidente? Tu também podes ser!

A UBE promoveu na década de 80, a “Noite dos Poetas ao Vivo”, uma apresentação no Teatro Amazonas. No dia da apresentação, chegou um misto de poeta e pintor, o Afrânio de Castro, apelidado por muitos intelectuais da época de “Troglodita”, pedindo minha vaga para “ridicu-larizar” todo mundo Ele não havia sido convidado e queria se vingar. Logicamente que não dei minha vaga. Dias depois o Afrânio de Castro apareceu morto nas areias da Praia da Ponta Negra. Morte por afogamen-to. Ele bebia demais!

Um dia, o telefone tocou na redação. Era uma pessoa com um “furo” como se dizia no passado. Na Ceasa, um bairro distante de Manaus, um homem tinha sido preso por ter engravidado uma porca. Ele morava só com a porca em um flutuante. A barriga da porca tinha crescido de forma descomunal. Peguei um fusca novinho e fui apurar. Dei como manchete: “Homem preso por engravidar uma porca”. Repercutiu até em Londres. De lá, um jornal sensacionalista pediu a continuação da matéria. No dia seguinte, fiquei sabendo que a “gravidez” da porca era, na verdade, um mioma. Matei a porca e encerrei a matéria dizendo que a porca tinha morrido no “parto”.

Outra vez fui fazer a matéria de um ônibus da empresa “Santa Luzia”, do administrador de empresas e empresário Francisco Saldanha Bezerra, que havia batido na traseira de um fusca. Ao chegar ao jornal, o Bianor perguntou se matéria poderia dar uma manchete “porreta”. Eu disse que sim. Terminei de escrever a matéria e a entreguei ao Bianor. A manchete saiu assim: “Trepada Covarde”. Esse acidente ocorreu nas proximidades do Hospital do Exército e o fusca entrou numa garagem, cujo portão encontrava-se aberto. Só amassou a tampa da mala na parte detrás. Mas o motor do fusca era exatamente nessa área. O Bianor ainda criou outras manchetes “porretas”.

Da época de jornal, algumas coisas ficaram gravadas na minha me-mória: as manchetes escandalosas saídas da cabeça do Bianor Garcia e alguns fatos criados por Luiz Octávio Monteiro, que ficaram marcados na imprensa amazonense: o “chupa-chupa”, o “Negro Angola”, e o “Mão Branca”.

Gabriel Andrade lembra duas manchetes porretas do Bianor: “Viola-da no Teatro” e “Beleza abunda nos Jogos Estudantis”. Na primeira, a matéria se referia a uma noite cultural ao som de violas no Teatro Ama-zonas. A outra manchete era sobre os jogos esportivos promovidos pelo Governo do Estado. A foto que ilustrava a manchete era de autoria do João Pinduca Rodrigues, mostrando algumas jovens com o bumbum pra cima.

Cansado de levar “esporro” de Andrade Neto, por não ter noticiado o “afundamento” de um motor no interior, criação esperta de Altair Rodri-gues, que trabalhava em “A Crítica”, Octávio bolou uma vingança: criou o “chupa-chupa”, que seria um disco voador, com luz bem forte, que deixava os animais paralisados e chupava todo o sangue dele. Isso virou um pandemônio na cidade.

Depois criou o “Negro Angola”.que era um garçom que servia cerve-jas de graça para nós, no bar de propriedade da advogada e dona de bar Letícia Teles Guimarães.

Sempre que havia publicação em A Notícia, que uma pessoa negra e uma outra pessoa branca haviam assaltado alguém, a pessoa descrita como “negra” pelo excepcional repórter Luiz Octávio, era de um negro angolano que vivia em Manaus há algum tempo. Depois, para descobrir uns crimes, inventou o “Mão Branca”, após de freqüentar um terreiro de umbanda.

Depois disso, Altair Rodrigues, que trabalhava em “A Critica”, dei-xou de escrever sobre afundamentos de barcos no interior.

O fato mais interessante sobre a personalidade do Luiz Octávio ocor-reu em um dia em que estávamos bebendo em um bar em frente ao Vi-valdo Lima.

Ele, já porre, começou a se lamentar:

- É isso mesmo, a Rose – mulher dele – só me chama de lindo quando eu estou porre! Bom, ela nunca me chamou assim!

Eram 4 da manhã quando eu fui deixá-lo até a casa dele.. A Rose a-briu a porta escorou-se com uma mão na parede e a outra na cintura e começou a falar:

- Muito lindo, não é, Luiz Octávio. Isso é hora de chegar em casa?

- Eu não disse? Eu não disse? Ela só me chama de lindo quando eu estou porre! E entrou.

No dia seguinte, chegou todo arranhado ao jornal para trabalhar e com uma diarréia danada. Eu saí com ele nesse dia e sentei atrás. Cutu-quei as costelas dele. Pediu ao motorista para ir rápido até a sua casa porque tinha se cagado todo.

Como presidente da 7ª Vara Criminal e presidente do Tribunal do Jú-ri, o juiz Arnaldo Carpinteiro Péres queria dar uma dinamizada nos jul-gamentos. Perguntou se eu o ajudaria nessa empreitada. Respondi que podia contar comigo.

Decidiu por um julgamento anterior, em que o homicida estava cum-prindo 21 anos de cadeia e convidou o advogado Milton Asenssi para defender o réu em segundo julgamento. Eu, o Altair Rodrigues, de “A Crítica”, e o Francisco Pacífico, do “Jornal do Comércio”, prometemos ao o juiz, Dr. Arnaldo Carpinteiro Peres, que daríamos cobertura em todos os fatos relacionados ao novo julgamento, para empolgar mesmo!

Milton Asenssi entra com recurso e consegue um novo julgamento. Vai à Penitenciária e promete que ira absolvê-lo.

O homicida, que tinha cometido um crime bárbaro para os padrões e comportamentos da cidade na época, no então bairro Planeta dos Maca-cos, hoje Redenção, pegou 22 anos de cadeia.

De cabeça baixa, o réu aguarda o seu advogado passar pelo corredor que existia no segundo andar do antigo prédio do Tribunal de Justiça. Puxando na toga do seu advogado, diz:

- Poxa, doutor, eu já estava até acostumado com minha pena de 21 anos. Mas o senhor foi na Penitenciária, me deu esperanças de ser absol-vido em segundo julgamento. Me faz relembrar tudo novamente e me dá mais um ano de graça!

Ao que Milton Asensi respondeu:

- Você dê-se por satisfeito porque se eu fosse esse juiz que vem aí a-trás – e apontou para o Dr. Arnaldo Carpinteiro Péres – eu tinha lhe dado era cadeira elétrica!

Eram memoráveis os julgamentos do Júri em que se enfrentavam Francisco Guedes de Queiroz, Félix Valois Coelho Junior, João Valente de Azevedo e o promotor Lupercíno de Sá Nogueira. Aliás, Lupercíno era o melhor promotor de Júri de então, e o advogado Francisco Guedes de Queiroz, por 26 anos deputado estadual pelo Amazonas, representan-do o Cambixe, grande orador e tribuno, era um dos melhores advogados que já vi atuando. Levava até revólver de espoletas para o júri para me-lhor defender seus clientes. Como o seu desejo era ter sido médico, che-gou a levar uma representação de uma caveira ao tribunal, só para melhor explicar a sua tese de defesa. Félix Valois Coelho Júnior, também era brilhante no Júri.

Nessa época, já era assessor de imprensa, na Associação das Empre-sas Exportadoras da Zona Franca de Manaus, dirigida pelo empresário Manoel Henriques Ribeiro. Gilberto era candidato ao Governo, mas não tinha um vice já que Andrade Neto não aceitou ser o seu vice. Fui desig-nado para convidar Manoel Ribeiro para a missão.

- Eu não dou para isso. Não sei prestar entrevistas e não vou disputar voto em palanque! Respondeu ele

Dias depois, aceitou, mas não freqüentou o palanque com Gilberto Mestrinho, ficando sempre à sombra dele, mas negociando o apoio do Distrito Industrial onde ele tinha distribuído cinquenta mil cartas criti-cando o governador da época, José Lindoso.

O partido era o PMDB de oposição. Mais tarde houve uma fusão com o partido PP, representado no Amazonas pelo vereador Fábio Lucena. Devido a essa fusão e a entrada do vereador Fábio Lucena para o grupo de Gilberto Mestrinho, Andrade Neto abandonou o seu desejo de ser novamente Deputado Federal pelo Amazonas. Mas não deixou de apoiar o grupo de oposição, que tinha também como candidato a deputado fede-ral, Arthur Virgílio Neto e outros.

Gilberto ganhou o governo e vai ao jornal “A Notícia” oferecer o car-go de presidente do Banco do Estado do Amazonas para Andrade Neto. Ele não aceitou.

- O membro da Jari do Detran é remunerado?

- É. Respondeu o Governador.

- Então, nem esse eu quero!

Durante o primeiro Governo de Mestrinho, ele falou para os deputa-dos estaduais campeões de voto na época, Waldir Barros, Samuel Peixo-to e José Costa de Aquino que aquele seria o último mandato dos três. E foi mesmo. Não se elegeram mais, nem contra Gilberto e nem do lado de Gilberto.

Durante entrevista publicada em “A Notícia”, Gilberto disse que for-maria um grupo político para governar o Amazonas por 20 anos. Isso aconteceu, mas com muitas traições de bastidores, levando as criaturas a ficarem contra o criador.

Naquela época, o repórter era considerado bom se, todos os dias, le-vasse pelo menos sete textos diferentes para serem publicados no jornal. Eu sempre conseguia mais do que sete e me rebolava para dar conta do recado. Não se media a capacidade de um repórter pela qualidade dos seus textos, mas pela quantidade de textos que ele conseguia produzir.

Depois de o governador empossado e o seu vice na presidência do BEA, fui convidado para prestar assessoria de imprensa para o senhor João de Mendonça Furtado, que tinha sido indicado para concluir o resto do mandato de Frank Abrahim Lima, à frente da Prefeitura de Manaus.

A cidade estava cheia de buracos e lixos. O senhor João de Mendonça Furtado tentou resolver os dois problemas. Encomendou uma campanha da Saga Publicidade sobre o lixo e mandou fazer um “recenseamento” de todos os buracos.

João Furtado, depois de alguns meses à frente da Prefeitura, voltou para a presidência da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas e continuamos amigos. Ele sempre telefonava para “A Notícia” e falava comigo:

- Carlos Costa, você já cortou o cabelo e tirou sua barba?

- Não, seu João!

- É que eu estava querendo te levar para uma inauguração que vou fa-zer no Território Federal do Acre, mas preciso que você corte o cabelo e tire a barba.

- Então não vou, seu João!

- Se você não tem dinheiro para ir a um salão, eu mando meu moto-rista te pegar, te levar ao salão e pago.

- Eu prefiro não ir à inauguração, seu João!

Como ainda era cronista em “A Notícia”, aproveitei para fazer uma gozação com o senhor João de Mendonça Furtado. Publiquei uma crôni-ca sobre o “recenseamento” de buracos que ele tinha autorizado e, ao final, um buraco de rua se apresentava e perguntava se ele tinha entrado na pesquisa.

- Talvez! Você é o número 18.927. Respondeu o autor dos levanta-mentos.

Alberto Castelo Branco, dono da Saga, de paletó e gravata, apareceu no gabinete do prefeito, na sede da FIEAM, à tarde, para apresentar a campanha e o orçamento. Estavam previstos outdoors, placas e spot de 30 segundos para a televisão.

O prefeito leu atentamente todo o processo de campanha, gostou, mas não aprovou o preço da conta, que era muito alto.

Aproveitando-se de um descuido de Alberto Castelo Branco, que o-lhava para uma das várias pinturas que existia no Gabinete do presidente da FIEAM, em que ele despachava, João Furtado disse:

- Já que lugar de lixo é no lixo, vou colocar tudo isso no seu devido lugar. E a jogou no lixo. Depois, retirou o material do cesto e entregou para o diretor da Saga, que não voltou mais para falar com o João.

Arthur Virgilio Filho, na época presidente do extinto INSS, sempre telefonava aos finais de tarde e eu passava muitos minutos conversando com ele. Contava-me, empolgado, as coisas boas que fazia à frente da administração e, sempre sorrindo e feliz, dizia-me “o Brasil é um país que ainda tem jeito”.

Sempre recebi dele muito incentivo pois gostava das crônicas que es-crevia e costumava dizer-me que era um “fã” meu. E, eu, dizia:

- O senhor é muito bondoso, senador (ele já tinha sido senador da Re-pública). Eu não mereço tanto.

Arthur Virgilio Filho era nascido no sertão do nordeste, veio para Manaus ainda jovem com André Vidal de Araújo e em Manaus constitu-iu família e fez brilhante carreira na área do Direito.

carlos da costa
Enviado por carlos da costa em 07/03/2010
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