Bambuzal

Era minha casa conhecida pelo bambuzal, pés de bambu-taquara tão altos e verdes que se podiam ver ao longe. Meninos eram atraídos por eles e vira e mexe escutávamos o “clic” de um que era arrancado na surdina afim de ser transformado em armações para lindos pipas, que cruzariam o céu azul em verdadeiros duelos em dias ensolarados, guerra de meninos dos anos 70 e 80.

A casa pequenina de cor azul era a atração da garotada, pois era artesanalmente protegida por uma cerca de bambus. Cerca que ficava aos poucos desfalcada, transformando-se também em quadrados, raias e papagaios, hoje tão somente chamados de pipas.

Meninos faziam verdadeiras disputas, suas pipas eram levadas pelo vento, voavam tão alto que mal podiam ser vistas. Era um tempo de simplicidade, sem brinquedos caros, vídeo games, computadores ou celulares. Telefones quase não existiam pela vizinhança e o telefone público mais próximo, também chamado “orelhão”, ficava a meio quilômetro de nossa casa.

As brincadeiras se passavam no bambuzal, subíamos em um bambu pisando em seus ramos e galhos até envergá-lo, o bambu ia descendo devagar com meus poucos quilos, até chegar ao solo, quando pulava e estava a salvo. Quantas vezes fiz isso! Era o lugar onde me escondia também. Entre os pés de bambu sonhei e chorei minhas mágoas de criança. Todos, irmãos, primos e amigos nos reuníamos, brincávamos dias, tardes, noites e ficávamos protegidos pelas sombras dos muitos bambus-taquara. Brincávamos de amarelinha, de cabra-cega, de duro-mole, de esconde-esconde, de cantigas de roda, de casinha, de cabaninha, de bola, de bicicleta... e fugíamos, desesperados, de uns besouros pretos, os “mangangás”, os quais se escondiam no oco dos bambus. Muitas vezes, arrancávamos o “olho” do bambu, que era o broto que nascia, só para fazer dele um "canetão" e escrever pelas paredes. Quando a gosma que saía do “canetão” secava as paredes ficavam marcadas pelos rabiscos e desenhos rupestres que fazíamos. Estragava a pintura das paredes e meu pai ficava louco!

Meu pai fez uma balança grande que ficava no meio do bambuzal. A balança se tornou nossa principal diversão, mas não seria tão mágica se não fossem o verde, as alturas, as folhas secas que se espalhavam pelo quintal. Um dia meu pai cortou um pedaço de bambu e fez uma flauta. Uma flauta perfeita! Com um som perfeito! Eu que já era apaixonada por música e por instrumentos musicais percebi naquele dia que meu pai também era um artista. Foram tempos lindos aqueles onde deixei a minha infância e os visito toda vez que tenho saudades, como agora...

Marisa Corrs
Enviado por Marisa Corrs em 11/04/2011
Reeditado em 11/07/2018
Código do texto: T2902961
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