O período mais significativo na construção da minha estrutura psicológica de hoje, decorreu entre 25 de Abril de 1974 e o tempo actual. Antes desta data, nada do que fiz na minha vida tem, seja o que fôr, a ver com aquilo que eu teria feito se tivesse a consciência que tenho hoje. Contudo, devo salientar que as mudanças que se operaram em mim, não foram imediatas. 35 anos passaram, durante os quais fui acumulando conhecimentos e experiências que conduziram à consciencialização pessoal do que estava mal em mim, parcialmente em consequência de traumas de infância. A minha memória está cheia de recordações. Umas muito boas, outras boas, outras nem por isso e, ainda outras, realmente para tentar esquecer.
 
Depois do episódio que narrei aqui no blogue, com o título “A minha primeira desilusão”, muitas outras desilusões aconteceram, as quais me levaram a tomar atitudes nem sempre aconselháveis, mas eram as possíveis, naquela época. Pouco a pouco, comecei a sentir que a minha vida estava a tornar-se como que um novelo de fios emaranhados uns nos outros, tornando difícil a sua organização. Mas eu habituei-me a refazer novos novelos da melhor forma. Tornei-me perita em resolver situações, embora nem sempre com sucesso, repito, mas quando consigo vencer esses obstáculos, sinto uma sensação enorme de felicidade pela "missão cumprida". Que outra coisa melhor me habituei a fazer, além de desembaraçar-me dos fios que se entrelaçaram na minha vida? Talvez brincar com as crianças, olhar os lírios dos campos, admirar o sol que nos aquece e a água que nos refresca...

QUERO CONTINUAR CRIANÇA

Nasci. Fiz Sorrisos
em rostos que não sorriam,
em bocas que não se abriam.
Fui menina.
Cresci. Vi sofrimento
em quadrados sem luz,
onde a vida era uma cruz.
Fui criança.
 
Sofri. Com outras raparigas,
companheiras maltratadas,
nunca ouvidas, nunca amadas,
Fui jovem.                                             
Amei. Braços caídos,
num corpo vivo, sofri.
dei amor, não recebi.
Fui adulta.
 
Lutei. Cheia de amor,
pelos filhos que quis ter ...
Meu Santo Deus! Que prazer!
Fui mãe.
 
Desajustada,
neste mundo que rejeito,
sentindo um peso no peito,
Fui mulher.
 
Desiludida,
nesta mal cuidada vida,
resta-me, ainda, a esperança
de permanecer mulher,
De continuar Criança.
 
Maria Letra
Imagem da autoria de Miguel Letra
Maria Letra
Enviado por Maria Letra em 16/04/2011
Reeditado em 04/04/2014
Código do texto: T2912323
Classificação de conteúdo: seguro