Imigrantes vieram para o Brasil para substituir a mão-de-obra escrava negra, tanto quanto o trabalho escravo negro teve por objetivo substituir a mão-de-obra indígena: os indígenas secularmente preferiam a morte a serem escravos dos portugueses.

Transplantados para o Brasil, as grandes levas de imigrantes não vieram como gente superior: ao contrário, aqui foram recebidos como meros trabalhadores braçais, pobres, falidos, fugitivos de guerras.

Em primeiro lugar despejados nas lavouras de café e, posteriormente, nas minas, incontáveis imigrantes nada mais foram que escravos brancos assujeitados por lusitanos e, depois, por brasileiros (todos inquestionavelmente mestiços).

Para o território indígena do Brasil, "depois de portugueses e africanos, foram os italianos aqueles que chegaram em maior número ao Brasil: 1,6 milhões em mais de cem anos (921 mil apenas entre 1886 e 1900)". Em resumo, estas são as informações registradas na obra de Eduardo Bueno, "Brasil: uma História".

Aos imigrantes italianos, em quantidade somaram-se os espanhois, os alemães (a partir de 1824), os japoneses (a partir de 1908); entre os outros povos transplantados para o Brasil, aqui chegaram mascates turcos, comerciantes judeus, lavradores poloneses (entre 1870 e 1920), camponeses russos, camponeses ucranianos, camponeses letões, chineses cultivadores de chá, norteamericanos fugidos da Guerra de Secessão (a partir de 1866), ambulantes sírio-libaneses.

Quanto aos italianos, inicialmente e a partir de 1875 vieram para recolonizar o sul do Brasil: para isso, receberam terras devolutas que antes pertenciam a várias etnias indígenas – particularmente os Kaingang. Esses recolonizadores italianos eram pequenos agricultores vindos, em sua maior parte, do Tirol e do Vêneto: a eles foram dados o que fora negado aos negros, ou seja, terra para o cultivo.

Depois, camponeses empobrecidos da Lombardia, da Calábria, das zonas rurais do sul da Itália desembarcavam em Santos e eram levados para São Paulo; contratados por fazendeiros debandavam os cafezais do Oeste Paulista a fim de serem as bestas de carga por 14 horas diárias de trabalho. Muitos desses fazendeiros os denominavam escravos brancos.

Entre os contingentes de italianos, trazidos para escravos brancos do café ou das minas, estão vários sobrenomes que, posteriormente, originaram famílias brasileiras: tais famílias brasileiras, pela ignorância da mente colonialista e cognitivamente subalterna, são as que se ufanam em ser descendentes de europeus.

O território milenar e majoritariamente indígena da cidade mineira com o nome Tupi de Uberaba é uma das regiões do Triângulo Mineiro: todo este triângulo, de 1720 a 1748, pertencia à capitania de São Paulo e de 1748 a 1816 à capitania de Goiás; a partir de 1816 tornou-se capitania das Minas Gerais.

Mineiros do Triângulo Mineiro, incluindo as levas de imigrantes, são racial indígenas-paulistas-goianos.

Entre os sobrenomes de italianos braçais para Uberaba estão os Vitali; entre os espanhois estão os Fernandes; entre os portugueses estão os Pereira e os Sousa. Pela miscigenação e vários novos troncos familiares, aquelas famílias compuseram vários outros troncos e muitos desses, ao longo das décadas, passaram a não se reconhecerem uns aos outros.

Dos troncos desenraizados e que, depois, não se reconheceram estão provavelmente os ancestrais não muito longínquos de Falstaff Vitali (filho de Luiz Vitali, já nascido no Brasil) e Manoel Fernandes de Souza (filho de Manoel Fernandes de Souza, igualmente já nascido no Brasil): os dois foram os esposos de Geraldina Pereira Fernandes, respectivamente entre 1930 a 1938 ou 1939 e entre 1940 e 1991.

Aos 24 dias do mês de maio de 1930, um homem com 20 anos de idade e uma mulher com 17 anos de idade compareciam ao Cartório de Registro Civil da cidade mineira de Uberaba para oficializarem a sua união civil: Falstaff Vitali e Geraldina Pereira.

Os nubentes Falstaff e Geraldina tinham por testemunhas Sérgio de Sá, Anna Pereira de Mello, Ramon Blanco Luiz, Trindade Gutierrez.

Falstaff Vitali e Geraldina Pereira casavam-se perante o Juiz dos Casamentos, doutor João Lopes Ferreira: o jovem Falstaff, descendente de avós italianos, nasceu na cidade mineira de Uberaba (onde residia) aos 31 dias do mês de janeiro de 1910 e era filho de Luiz Vitali e Zebina de Sá Vitali.

A família Vitali era amante da música: um talento de tradição familiar, encarnado em uma das quatro filhas de Jeanette Vitali Foroni– a cantora e compositora Mara Foroni.

A jovem Geraldina Pereira nasceu na cidade mineira de Dores de Santa Juliana aos 23 dias de junho de 1913; órfã de pai e de mãe aos quatro anos de idade, residia em Uberaba, sob a tutoria de seus padrinhos. Seus pais já falecidos eram José Pereira e Maria Bárbara (Pereira): em homenagem a mãe de minha mãe, minha segunda filha com Eliana Pereira Finholdt recebeu o nome por mim escolhido de Bárbara Finholdt Fernandes.

Na certidão de casamento sob a minha atenção, cópia lavrada em 16 de maio de 1950, não consta o regime dos bens do casamento nem o nome da contraente depois de casada: a rigor deveria ser Geraldina Pereira Vitali.

Pelos relatos de minha irmã Jeanette, a madrinha de minha mãe não aprovava o namoro entre Geraldina e Falstaff por causa da vida de amante de música do mesmo; apesar da reprovaão, começaram a namorar e, nessa época, minha mãe e seus padrinhos moravam na rua Padre Zeferino.

A não aprovação do namoro entre Geraldina e Falstaff estendeu-se ao casamento de ambos: a profissão registrada do noivo era marceneiro; a profissão registrada da noiva era dona de casa.

Falstaff Vitali e Geraldina Pereira (Vitali) tiveram duas filhas:

-Maria de Lourdes Vitali, nasceu em Uberaba aos cinco dias de outubro de 1931 e faleceu aos dezenove dias do mês de abril de 2006; casada com Labibe Abrahão Cherin, foram pais de Sandra Cherin, Samir Abrahão Cherin, Antônio Sérgio Cherin, Sônia Cherin e Edson Abrahão Cherin (*31.Maio.1948 + 23.Setembro.2011).

-Jeanette Vitali, nasceu em Uberaba aos vinte e sete dias do mês de janeiro de 1937: casada com Edson Foroni, foram pais de Edna Marta Foroni, Lúcia Helena Foroni, Mara Cristina Foroni, Rosana Vitali Foroni.

Falstaff Vitali, pelo que posso inferir, era igualmente amante do carnaval: diz minha irmã ter sido ele um dos fundadores de um famoso bloco carnavalesco de Uberaba. Aliás, por este amor, o nome da segunda filha do casal pode ter sido uma homenagem à música Jeanette, composta por Lamartine Babo e Assis Valente – uma das cem músicas mais tocadas no ano de 1936.

No final dos anos da década de 1930, Geraldina Pereira (Vitali) havia se separado do esposo. O motivo da separação: Falstaff, amante da boemia, entregara-se ao vício da bebida e comprometera a entrega dos serviços pagos anteriores por seus clientes para a confecção de móveis e de instrumentos musicais; provavelmente, a situação financeira da mulher e das duas filhas estava seriamente comprometida até tornar-se insustentável, desencadeando a separação do casal.

Tanto minha mãe quanto minha irmã Jeanette falavam-me do veredito da madrinha: "eu disse, Geraldina, que esse casamento não ia dar certo."

Pelo vício da bebida, Falstaff Vitali faleceu no ano de 1943 com cirrose hepática: estes fatos foram relatados tanto pela minha irmã Jeanette quanto por minha mãe Geraldina.

Minha irmã Jeanette, na época com seis anos de idade, lembra-se do pai morto e diz tê-lo visto ainda no caixão: este fato mostra que, apesar da separação, minha mãe mantinha as filhas próximas à órbita do pai.

Ainda por relatos de minha mãe, ela e as filhas Jeanette e Maria de Lourdes, após a separação do esposo, voltaram a residir com a mesma madrinha que a criara até o casamento com Falstaff: a essa época, os padrinhos de minha mãe residiam na rua atualmente denominada dr. José Maria dos Reis. A casa era uma ampla e confortável residência de esquina, sendo que o padrinho possuía um armazém: a rua, hoje avenida, consta pertencer ao bairro Quinta da Boa Esperança – mesmo local onde, à época, situava-se a famosa Chácara dos Eucaliptos da família Reis.

Minha irmã Jeanette assim se lembra de Falstaff, seu pai: homem meigo, carismático, branco, alto, cabelos lisos e castanhos claros sempre penteados para trás, lábios grossos, bonito, esbelto, não usava chapéu.

Minha mãe Geraldina, de acordo com uma fotografia do ano de 1950, era uma mulher de beleza apreciável: rosto fino, cabelos longos um pouco cacheados e castanho-escuros, olhos pequenos e de expressão serena quase indevassáveis, lábios e nariz esculturalmente belos, queixo afilado, pescoço longilíneo, sombrancelhas curtas, mãos delicadas, cintura fina e quadris medianamente largos, pele de cor branca.

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Não sendo um nome comum, no Cemitério São João Batista de Uberaba – Minas Gerais, registra-se o falecimento e o sepultamento de Luiz Vitali aos dois dias do mês de maio de 1952: seus restos mortais estão na Quadra B e na sepultura de número 1235; por não constar o sepultamento de sua esposa Zebina de Sá nem do filho Falstaff Vitali, provavelmente os restos mortais dos três estão sepultados no mesmo local.

No mesmo cemitério, na Quadra D, sepultura 265 estão sepultados os restos mortais de Geraldina Pereira Fernandes (falecida em 23 de julho de 2002) e de seu segundo esposo Manoel Fernandes de Souza; entretanto, esta é a dimensão histórica de outro momento.

 

Carlos Fernandes
Enviado por Carlos Fernandes em 23/06/2011
Reeditado em 25/09/2011
Código do texto: T3052748
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