SEXUALIDADE: PARTE INTEGRANDE DE TODA A VIDA

Desde os 19 anos que leciono ensino religioso na igreja, e por mais de 10 anos trabalhei como professora de Bíblia aos domingos pela manhã e a noite como líder de um grupo, que atualmente saiu de ação na maioria das igrejas batista no Brasil chamado “União de Adultos”, Em sua maioria, homens e mulheres acima dos 50 anos. Aliás, essa é a minha idade hoje. O incrível era que eu tinha apenas 19 anos quando comecei a trabalhar com eles. Sentia-me deslocada no início, com o tipo de questionamento dessa ordem: “meu Deus o que é que eu estou fazendo aqui?” Acho que essa frase já foi dita centenas de vezes pela mesma pessoa, e por todos os indivíduos em todo o planeta. Portanto, nada de novo! Mas, me acostumei. E, logo estava dominando o mitiê.

Durante uns oito anos seguidos, ensinei numa classe de terceira idade, e como meu discurso era diferente, tínhamos umas quatro mulheres da minha idade. Nessa época eu não passava dos trinta anos e continuei nela até 1997. Nessa época estava com 40 anos.

Como a Escola Bíblica Dominical é estruturada em trimestres, e que hoje começa a entrar em voga na educação secular, principalmente em nível de graduação. Acho mais interessante e mais proveitoso para o aluno. Melhor que o sistema semestral com um monte de disciplinas, cujo aproveitamento é, no mínimo, questionável. Pois bem, num desses trimestres, o tema foi à sexualidade no contexto da igreja. Isso era início dos anos 90. Pensei: meu Deus, para que vou trabalhar esse tema com um bando de mulheres que têm idade de serem minhas mães, umas duas tem idade de ser minha avó? Foi curioso! Fui trabalhando os temas, como criação dos filhos, o que ensinar e orientar quando eles são crianças e adolescentes; quando são jovens, quando já estão casados e, pensam que sabem de tudo, etc., namoro, gravidez, aborto, problemas concernentes a gênero, e preconceitos.

No final do trimestre, na última lição, perguntei a classe se tinha valido a pena estudar a sexualidade. Algumas se mexeram, fizeram alguns comentários, mas o comentário mais contundente foi a de uma senhora de nome Lúcia, com a idade de 86 anos, pobre e negra. Esse referencial aqui não tem nada de preconceituoso ou racista. Quero enfatizar a importância disso. Ela disse a mim e a turma: “minha irmãzinha, pra mim isso não adianta de nada. Estou velha, sou viúva há muitos anos, mas eu tenho netos e um bisneto e minha filha e neta moram comigo. As duas trabalham, e eu cuido do bisneto, logo eu preciso aprender para poder educar meu bisneto e outros netos que ainda são jovens”.

Gente, eu quase que choro. Jamais pensei que ela tivesse essa visão! E ai, ela aproveitou e contou sua história. Falou que tinha tido seis filhos, tinha sete trouxas de roupa para lavar na beira do rio, sem o mínimo de conforto, além de um marido que o que ganhava, gastava com farras e ainda tinha que aturar os seus efeitos, pois ele era alcoólatra. Contou-nos ainda, que as muitas vezes em que ele chegou bêbado, agredindo a todos dentro de casa, algumas vezes batendo nela e nos filhos. E que tinha dado graças a Deus, quando ele havia morrido. Ela agora era “livre”.

A irmã Lúcia morreu há pouco mais de dois anos, uma vida farta em anos, mas cheia de muita luta e muita dureza. Uma pergunta não foi feita, por que não tive coragem de fazer. Lúcia, você foi feliz, em algum momento de sua vida? Você é feliz? Podemos analisar a nossa vida hoje, fazer um balanço, e ousar dizer com firmeza: fui feliz, sou feliz, busco melhor compreender os meus dias para ser e dar felicidade ao outro que está ao meu lado? A resposta a essas perguntas, talvez jamais ousemos dize-la em público, talvez jamais tenhamos coragem de dizer para nós mesmos. Somos felizes?

A importância da educação sexual ultrapassa os bancos da escola, precisa estar inserida dentro de casa, na família, ela é a maior responsável pelos desajustes sociais, seja por falta de recursos que dêem possibilidade de uma moradia de qualidade, educação, inserção dos jovens no mercado de trabalho, conforto, lazer, etc. A igreja, naquele momento, cumpriu o seu papel, pois na prática mostrou através do depoimento daquela velha senhora, as jovens e as não tão jovens a necessidade de aprender sempre, buscar estar sempre informada, para poder ensinar aos seus filhos, netos, etc., uma vida de qualidade e saudável perpassa por uma sexualidade sem traumas, sem medos, num processo constante e salutar.

Ontem, mais de 10 anos após essa data, contei essa mesma história a outro grupo de senhoras da terceira idade na minha atual igreja. E foi curioso notar quão lúcidas e prontas para mudar o sem entorno, e dizer aos que estão a sua volta, que elas estão vivas, que são pessoas visíveis e, que ainda podem fazer muito por si mesmas, e pelos outros, mesmo com as suas limitações. Algumas falaram das suas bengalas, das suas dificuldades em fazer amizade, em como os jovens as acham descartáveis. Puxa, senti uma vontade enorme de voltar a trabalhar com elas. Quero no futuro, se tiver oportunidade de envelhecer, receber o devido valor, que é ser humano, e que na velhice, o melhor mesmo não é morrer, mas viver com respeito e dignidade, com qualidade de vida e amor. Eu acredito nisso. No final das contas, sai de lá me sentindo viva. Preciso voltar para agradecer!