Parte da minha infância

Estava pensando como seria de conseguisse ter a intuição de como posso ter tudo que quero, vivo hoje tudo que sempre quis, uma esposa linda, um filho lindo, esse meu desejo começou muito cedo, tinha apenas 12/13 anos de idade quando conversava com meu melhor amigo “Leandro”

A diferença de idade era de 13 dias, ambos nascidos em novembro, com as mesmas perspectivas, o que não era comum, pois nossas famílias eram totalmente diferentes, mas sempre fomos criados juntos, conversávamos assuntos de adultos, e hoje vejo que tudo que ele queria, conseguira por ele. Eramos humildes nos desejos, almejávamos a felicidade, essa felicidade era pouco menos que casa, família e um lindo cachorro.

O que hoje tenho, só não soube o que poderia vir depois disso, soube como ter tudo, inclusive o desejo de que meu filho fosse lindo, alto e de dentes perfeitos, não sabia como fazer ele ser da forma correta que se precisa para ter a condição intuitiva de sobreviver no mundo de hoje, ainda sofro muito com isso, na verdade sofro isso agora, pois agora vejo a escolha de suas amizades, vejo a perspectiva de seus amigos como uma ameaça, ameaça que fiz minha mãe sentir à mais de 20 anos, que apenas hoje entendo.

A vida não é surpresa para quem escuta os pais, tudo se repetia novamente, defendia as más amizades para minha mãe, e os que ela recomendava eu criticava e ainda inventava coisas para que ela não persistisse em ter tais amizades, sofrerá as consequências de não ouvi-la bem antes que imaginava, ela tinha e tem o Dom de ainda me fazer sentir a culpa de não escuta-la.

Minha mãe, Maria Aparecida da Silva Cortes, esse nome descende de pessoas de integridade, lealdade, humildade, qualidade e sabedoria, filha de João Araújo, homem de pele escura, trabalhou no ramo da construção criando 6 filhos fortes, dentre eles, minha mãe.

Ela sempre teve muito orgulho dos seus pais, também filha de Maria Edileuza, a força, amor, integridade, carinho e muito engraçada Avó que todo homem quer ter, criou seus filhos em bases rígidas de respeito e corretivos extremos, bom, foi dai que tive a mesma educação e criação.

De fato me coloco em duvida, desde o momento que comecei essa edição, também posso dizer que saber onde quero chegar é algo inconclusivo, sei que tenho essa vontade de escrever algo com mais de 100 paginas à mais de 30 anos, o que me leva a uma das minhas primeiras palavras que me deram a possibilidade de aparecer em um jornal, não sei ao certo se há crédito, pois o jornal é de um tio, por parte de pai, de qualquer forma ele o fez, já se aproveitando de todos meu erros já corrigidos pela professora, inclusive todas as dissertações e verbos colocados de forma incerta, reescrevi para que ele pudesse usar da forma que achasse melhor, o título era “Quero ser o presidente do Brasil”, lembro do orgulho que minha mãe sentiu, acho que sequer apanhei naquela semana, mas ainda sim tive que lavar o banheiro e varrer o quintal, que era minha obrigação semanal.

Hoje ao me deparar com a qualidade do caráter se formando naquela época, com a falta de qualidade de vida hoje, com tantos utensílios que afastam a família formando o caráter do meu filho hoje, me pergunto, como usar o que tenho a meu favor, confio na personalidade do meu filho e em seu caráter, mas ainda sim, mesmo eu tendo tudo aquilo, falhei e decepcionei tantas vezes minha mãe, meu filho, tanto que converso, explico e mostro as consequências, como evitar o inevitável, como escolher suas amizades, eu ainda me dava o trabalho de esconder e inventar qualidades, hoje nem isso acontece.

Lembro que um dia, pouco depois de voltarmos de uma autorizada da TecToy, onde tínhamos levado meu Master System para conserto, meu melhor amigo, Leandro, trouxe alguns novos amigos para jogar na minha casa, cheios de gíria e de palavreado, crianças totalmente malandras, onde me leva à outras questões, de que tudo é o que parece, nada é o que parece, tudo pode mudar, a maçã podre pode apodrecer para virar adubo para outras maças serem ainda melhores, ou ainda que quem com porco se mistura, não come do farelo, faz do farelo um mingau para te deixar mais forte.

Estes amigos fizeram e ainda fazem parte da minha vida, assim como alguns outros, pelo menos ainda fazem parte porque não morrerão. Ter a dor da perda na morte cedo muda demais nossa personalidade, mexe com nosso caráter, influencia à ficar ainda mais apegado com aqueles que ainda estão vivos, o efeito comigo pelo menos foi de ser ainda mais apegado àqueles que me fazem bem, amar com mais intensidade. Essa dor me aconteceu cedo também, pouco tempo depois dessa fantástica redação de querer ser o presidente do Brasil, fiz uma outra redação, que por mais erros que nela continha, tirei um“A”, seu título, “Amizade Eterna”.

Esse titulo feito com base no que acontecerá uma semana antes, meu melhor amigo, Leandro de Castro Raposo, morreu em um acidente, onde ele estava de mobilete na Av. Nordestina, e um carro, com um motorista que fez uma ultrapassagem batendo de frente, atropelando e tirando sua vida, onde também deu-se inicio à uma outra amizade, amigos que já conhecia através do leandro, pois estudávamos em escolas diferentes, na verdade iniciamos os estudos totalmente juntos e na mesma escola, mas....

Na primeira série, tive uma paixão infantil por uma garotinha com cabelos compridos e lindos, na saída da escola, fazendo o mesmo caminho que ela pra casa, fiz o que muitos hoje chamam de assédio, fiquei chamando ela à menos de 5m de distância de meu chuchuzinho, o que me gerou uma advertência, pois a perturbava demais com essa ação e minha mãe foi convidada a me trocar de escola, onde fui transferido da escola Alexandre de Gusmão, para escola Major Cosme de Faria, me separando do Leandro nos períodos de escola, pois nossos horários não batiam, ele ia pra escola as 11:30 e eu saia da escola as 10:40.

O que nos deu novos amigos, os da minha escola se tornara amigos dele, os da escola dele os meus.

O dia de seu acidente fez com que as pessoas que sofreram, que me conheciam como o amigo do Leandro, começassem a me chamar primeiro de Leandro, pra depois me chamar de Danilo, ouve um apego instantâneo, pois todos viram que tinha perdido muito mais que um amigo inseparável, tinha perdido meu irmão gêmeo de pais diferentes, não tinha como explicar e ainda não tem como, eramos muito ligados, sofríamos quando brigávamos e chegávamos a chorar quando reatávamos a amizade, eramos muito amigos.

Esse triste dia, o dia do acontecimento foi estranho, pois tinha começado meus estudos em uma escola particular, “Armando Sales de Oliveira” o “ARSOL”, pegava meu ônibus, e descia sempre em um ponto de atrás da minha casa, nesse dia, desci 3 pontos antes, que me fariam andar cerca de 2k, entre este ponto e o próximo, avistei muitas pessoas em volta de fumaça, pessoas chorando e gritando desesperadas, lembro que alguém olhou pra mim e me deu espaço para ver, e conforme as pessoas iam me olhando iam me dando passagem, então vi a bota da Khelf que tínhamos comprado juntos no shopping, fora de seus pés, a bota estava com manchas de verniz , porque aquela mesma bota envernizada era muito mais cara, então achamos que se nós mesmos envernizássemos pareceria a mais cara, lembro que alguém me puxou, não consegui ver, o que hoje gostaria de agradecer a quem me fez isso, mas também só pudi acreditar no fato em seu enterro.

Sentia no velório que estava sendo mais recebido e acomodado que seus próprios pais, todos estavam tendo muita preocupação comigo, inclusive os pais do Leandro me deram condolências pela perda, mesmo acreditando pouco, tomei forças para vê-lo no caixão, quando tive forças para vê-lo, não consegui, lembro apenas de um clarão e depois já com as pessoas jogando terro no tumulo já aterrado, não consegui me despedir do que representara sua vida.

Deste de então, tenho vivido à mais de 20 anos pensando como seria nossas vidas se ele não tivesse morrido..

Uma semana após a tragédia, foi dada uma redação de tema livre, meu tema, sem pensar muito, “Amizade Eterna”, foi considerado o melhor da sala, a professora pediu para eu ler, não tive coragem, pois já estava engasgado com o choro, e nas primeiras palavras que foram proferidas cai em um choro profundo, pedi para sair da sala e assim que acabou a leitura, minha professora, Marcia, foi até onde estava, na quadra da escola, conversou comigo e voltamos para sala de aula, quando cheguei na porta, vi todos aqueles olhos na minha direção, a maioria das meninas enxugando as lagrimas, a maioria com choro profundo, que me fizeram sentar e continuar a chorar cada vez mais profundo conforme todos chorávamos senti muito carinho por todos ali e a compreensão, isso talvez tenha me tornado uma das pessoas mais conhecidas da escola naquela época, era sondado constantemente por pessoas querendo ser meu amigo.

Leandro de Castro Raposo, nossa vida de muita malandragem, moleques que realmente sabiam se divertir, andávamos de bicicleta, tentávamos manobras, nos machucávamos muito caindo, levantando e tentando novamente, empinávamos pipa de forma tão intensa que acordávamos as 7h da manhã para aproveitar o máximo de tempo do dia, parávamos de empinar as 19h, jogávamos bolinha de gude onde ele era ruim, e quando perdia muito colocava o pai dele para recuperar o que tinha perdido, rs, apelão, rodávamos pião, ele era bom no pião, ainda sim seu pai era muito melhor, jogávamos bola na rua, principalmente altinha gol, mesmo em escolas diferentes, cabulamos juntos uma única vez, para ir na balada escondido, kkkkkkkk, esse dia voltando pra casa, acho que estávamos nem 10mn atrasados, quando vimos aquele monte de gente nos procurando, voltamos correndo, quando um olhou pro outro, paramos e ele disse, do que a gente tá correndo, ai voltamos, ele contou uma mentira, contei a verdade, ai confirmei a mentira dele e ele confirmou minha verdade, apanhei da minha mãe e ele apanhou do pai dele. :(

Guardo um boletim de ocorrências de quando fomos roubados no SESC de Itaquera, levaram todas as nossas roupas, não tenho nenhuma foto dele, nenhum dos desenho que ele fazia, ele desenhava muito bem, de fato toda recordação que tenho estão na minha memória e nas palavras que aqui surgem, gostaria muito de saber como seria se ele estivesse aqui, sempre vejo pessoas que lembram alguns detalhes do rosto dele, tinha muitas manias e caquetes que ele fazia de graça, era muito bagunceiro e muito arteiro.

Lembro da voz dele, do rosto e das palhaçadas, eramos apaixonados por pizza, juntávamos dinheiro pra comprar e comíamos na laje da minha casa, rs, era muito bom, em uma dessas vezes na laje, tivemos uma ideia, fomos pra casa dele, só que sem abrir o portão, para não fazer barulho, pulamos um murinho que dava acesso ao galinheiro do tio dele, Elias, e fomos até o ninho das codornas e das galinhas, roubamos todos os ovos que tinham …

Voltamos pra minha casa, subimos na laje, e tacávamos ovos nas pessoas que passavam e nos carros, kkkkkkkkk, eramos uns pestes, hoje com 37, me recordo dessas coisas de 25 anos atrás como se fosse ontem, nossos planos eram os melhores, depois de sua morte a vida continuou, continuei arteiro por nós dois, menos de um ano depois sofri um acidente de carro, bati a Kombi do meu pai no poste, estava com 15 anos de idade, me deixou com algumas marcas, inclusive um dente escuro que ainda não arrumei, =(