O VENTO

Quando ele repousava em meu rosto inclinava minha fronte, minha miragem era o solado dos calçados de vergonha de mim.

O vento era um lembrete de quem eu era, meus cabelos escondiam minha identidade, porém não conseguia esconder o receio que eu tinha de me expor.

Andava nos becos da vida, com minha corcundez de não encarar nenhum rosto por medo de algo ou alguém.

Eu nasci sem uma orelha, e é engraçado exprimir algo que todos já sabem, e que eu queria esconder de mim mesma. Como uma concha no fundo do mar eu me sentia e queria me camuflar. Mas ao auge dos meus cinco anos de idade alguém sempre tinha que me lembrar, em casa, na rua e principalmente na escola, comentários do tipo, nossa coitada ou na maioria das vezes piadinhas maldosas, fui crescendo me sentindo inferior a todos, mal sabia eu que dentro da minha concha havia uma pérola mais preciosa do mundo, meus traços, meu ser. Isso me levou a refletir por várias luas que um pedacinho insignificante de carne não poderia diminuir quem eu sou, que minha vida talvez pudesse ser melhor se eu tivesse enfim dois condutos auditivos. Cheguei enfim a conclusão que não, e no auge dos meus 32 anos de idade, é a primeira foto que tiro mostrando verdadeiramente quem sou e sobretudo feliz de ser quem sou.

O vento é necessário, é refrescante, é essencial para a natureza e é lindo.

Obrigado vento por revelar quem eu sou.

Patrícia Onofre
Enviado por Patrícia Onofre em 13/06/2018
Reeditado em 16/06/2018
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