BIOGRAFIA DE UM ANTICRISTO: NIETZSCHE (NOVO) 1° CAPÍTULO DA MONOGRAFIA

Ecce Homo (2005, p.31):

Na previsão de que dentro de pouco tempo me veja obrigado a impor à humanidade a mais dura exigência que até agora se lhe impôs, creio indispensável dizer-lhe antes QUEM SOU. Na realidade pouca falta faria esta explicação, porque tenho dado testemunhos de sobejo acerca de minha personalidade. Entretanto, a desproporção entre a grandeza de minha alma e a PEQUENEZ dos meus contemporâneos se evidenciou no fato de que não fui ouvido, nem sequer compreendido.

Vivo de mim mesmo, de minha própria crença, apesar da afirmação de que vivo não ser, talvez, senão um mero preconceito. Basta que eu fale com um homem “cultivado” qualquer, que tenha vindo venerar na Alta Engadina, para convencer-me de que não vivo. Assim, pois, há um dever imperioso contra o qual se revolta até no íntimo o hábito e, mais ainda, o orgulho dos meus instintos. Consiste este dever em proclamar:

- OUVI-ME! EU SOU ALGUÉM E, SOBRETUDO, NÃO ME CONFUNDAIS COM OS OUTROS.

CAPÍTULO I

NIETZSCHE (1844-1900)

O NASCIMENTO DE UM ERRANTE:

Nietzsche é complexo, polêmico e extemporâneo. Considerado por muitos o pai do irracionalismo. Anti-idealista e ateu confesso. O homem que antes de tudo não queria ser confundido com outra pessoa. Friedrich Nietzsche foi um dos filósofos mais críticos da tradição filosófica racionalista e iluminista, sendo que sua crítica está na raiz daquilo que Marcondes (2005, p. 139), chama de “crise da modernidade”. Tendo assim influenciado filósofos contemporâneos como Heidegger, Foucault e outros. Não só no campo filosófico merece destaque, mas, também entre aqueles que iriam com os seus escritos colaborar para a construção de uma nova concepção da história para a vida e de uma nova perspectiva quanto à valorização desta mesma história no homem do presente.

Nietzsche nasceu em Roecken, na Prúsia, a 15 de outubro de 1844 que por uma

“feliz” coincidência era o dia de aniversário do rei prussiano que ocupava o trono: Frederico Guilherme IV. Seu pai, que havia sido tutor de vários membros da família real, rejubilou-se diante daquela patriótica coincidência e batizou o filho com o nome do rei. Houve de qualquer modo uma vantagem na escolha desse dia para o seu nascimento; o dia do seu aniversário, durante toda a infância, foi um dia de muitas festividades públicas. É preciso antes de qualquer coisa compreendê-lo, assim, como um saxão da Turíngia: revolta intelectual e cólera religiosa parecem caracterizar muitos grandes homens dessa região da Alemanha, que entre outros produziu Lutero e Fichte.

Nasce em uma casa pastoral, sendo filho primogênito do pastor Karl Ludwig Nietzsche e de Franciska Oehler. Batizado e consagrado no templo pelo próprio pai, sendo isto registrado até o dia de hoje na Igreja, em Rocken. Outros dois filhos foram pelo pastor religiosamente recebidos: Elizabeth, a quem devemos a mais pormenorizada biografia do filósofo, bem como a conservação e publicação póstuma de seus escritos e um menino, morto prematuramente, vítima de meningite.

Sua mãe era uma senhora piedosa e puritana, do mesmo tipo que havia estimulado Immanuel Kant; e com talvez uma desastrosa exceção, Nietzsche ficou piedoso e puritano, casto como uma estátua, até o fim: daí o seu ataque ao puritanismo e a piedade. Seu pai, Karl Ludwing Nietzsche, fora pastor protestante luterano e havia uma longa linha de clérigos por trás de cada um de seus genitores; e ele próprio continuou sendo um pregador até o fim. Atacava o cristianismo porque ele próprio tinha muito de seu espírito moral; sua filosofia era uma tentativa de equilibrar e corrigir, por meio de uma violenta contradição uma irresistível tendência à delicadeza e paz, conforme nos relata Durant (2000, p. 373) “não teria sido um insulto final o fato de a boa gente de Gênova chamá-lo de IL Santo!”.

Em 1848 caiu o pastor do alto duma escadaria, batendo violentamente nas pedras da calçada; não se restabeleceu dessa queda, vindo a morrer um ano depois, imerso em sofrimentos e perdido na loucura. A morte precoce do pai deixou-o vítima das “santas” mulheres da casa, que o mimaram até quase incutirem nele a delicadeza e a sensibilidade feminina. Meses após morreria (como já relatado antes), também o seu irmão mais moço. Nietzsche com sua mãe e o resto de sua família, mudou-se para Naumburg, pois tiveram de deixar o presbitério onde moravam.

Com a morte do pai, do irmão e o abandono da terra natal, o caloroso mundo da primeira infância, desabou deixando marcas profundas. As experiências da doença e da morte foram para o jovem Nietzsche experiências cruciais das quais não poderia permanecer indiferente.

Nietzsche começou a sua aprendizagem em casa, com sua mãe, que esperava ver em Nietzsche, a continuação da obra e da tradição evangelizadora da família. Entre 1850 e 1858, freqüentou várias escolas e era visto pelos seus colegas como um menino introvertido e estranho. Não gostava dos meninos travessos de sua época, que roubavam ninhos de passarinhos, atacavam pomares, brincavam de soldado e contavam mentiras. Seus colegas de escola, segundo Bacelar (2006, p. 6), o chamavam de “o pequeno ministro”, se referindo e o descrevendo como “Jesus no templo”. Deliciava-se em isolar-se e ler a Bíblia, ou lê-la para outros, com tanto sentimento que chegava a trazer-lhes lágrimas aos olhos. Havia também em Nietzsche um estoicismo nervoso e um sentimento de orgulho oculto. Aconteceram vários incidentes na sua adolescência e na sua juventude que iria acompanhá-lo por toda a sua vida. Ele iria procurar meios físicos e intelectuais para endurecer-se numa idealizada masculinidade.

Deliciava-se em compor músicas e poesias ao som do piano que ganhara de sua mãe. Nesta época apesar de se sentir inseguro, viveu momentos alegres e emocionantes. Até que o ambiente familiar, eminentemente feminino, voltou-se a se desestruturar com a morte de sua tia Auguste e da avó paterna, Erdmuthe. E além das mortes dos familiares, Nietzsche foi tocado pela doença no verão de 1856, quando sofreu as primeiras crises de dor de cabeça e nos olhos, afastando-se da escola.

Aos 14 anos, Nietzsche recebeu uma bolsa de estudos para freqüentar o Colégio Real de Pforta, internato de elite onde estudaram Klopstock, Schlegel, Novalis, Ranke, Fichte entre outros.

Distante da família enfrentou a solidão compondo música sacra, escrevendo poemas, redigindo um diário e várias autobiografias, as quais obedeciam a uma necessidade constante de clarificar-se sobre si mesmo e sobre seus pontos de vista em cada um dos pontos e momentos cruciais de sua vida. (ibid., p. 8)

Redigia em um diário várias anotações autobiográficas, as quais obedeciam a uma necessidade constante de clarificar-se sobre si mesmo e sobre seus pontos e momentos cruciais de sua vida. Quando escreve sobre si mesmo, segue, portanto vários objetivos, ao mesmo tempo e um após o outro. Primeiro quer obter do tempo que foge imagens e memórias que se possam segurar e que dêem apoio. Seus amigos e parentes devem participar desse trabalho de memórias, quer dividi-lo com eles especialmente quando se ligam de uma forma com as cenas lembradas. Ele escreve para esses leitores, mas, sobretudo escreve para si próprio, como futuro leitor de seus escritos e anotações. Quer fornecer material para o futuro olhar em retrospectiva, que arredonde epicamente a consciência de si mesmo. Era também uma forma encontrada por ele, para repelir a solidão e compensar a falta de seus familiares distantes.

O JOVEM NIETZSCHE:

Na década de 1860, leu “A Essência do Cristianismo”, do filósofo Ludwig Feuerbach. A partir daí se manifestam suas primeiras reações contrárias ao cristianismo, que o afastarão da vocação familiar para a teologia. Se a biografia de 1859 terminara com a fórmula cheia de unção: “mas em tudo Deus me guiou”, em Maio de 1861 esse Deus familiar que guia é submetido a uma minuciosa análise, exame e investigação.

Conheceu então Feuerbach, e outros autores que seriam decisivos para a sua formação, como: Emerson, Sterne, Byron, Strauss, Schiller e outros. Neste momento, recebeu sólida formação humanista: conheceu os autores fundamentais da antiguidade; adquiriu disciplina e autodomínio no trabalho científico mais rigoroso; conheceu a grande literatura; fez amizade com Paul Deussen e Carl Von Gersdorff. Mas conheceu também as aflições cada vez maiores que o acompanhariam, a vida inteira. As congestões na cabeça, o reumatismo, os distúrbios oculares, estavam se tornando cada vez mais constantes.

Em 1864, matriculou-se em Teologia e Filologia na Universidade de Bonn, onde assistiu às aulas de Ritschl, helenista eminente que alta precisão aos seus estudos e abriu-lhe novo caminho para a Filologia Clássica. Nessa mesma época, aconteceu a famosa cena do bordel. Onde ele rejeita a companhia de algumas moças para se deliciar em acordes musicais de um piano. Pois achava que só este tinha o poder de compreendê-lo. Para muitos dos médicos-biógrafos, escritores, psiquiatras e psicólogos, esta cena seria o apoio para demonstrar ou refutar a origem sifilítica da doença mental do filósofo.

Descobriu-se então como filólogo, contrariando as expectativas familiares, em especial sua mãe, que queria vê-lo pastor como fora seu pai. Isto ocorre apenas depois do primeiro semestre em Bonn. Haviam se passado somente seis meses desde a sua partida como um bom e fiel “crente”, para estudar teologia. Quando as férias do final de semestre chegam, recusa-se a ir à comunhão com sua mãe. Seria então as primeiras reações contra o cristianismo.

Perdeu a fé no Deus de seus pais aos 18 anos de idade e passou o resto da vida procurando uma nova divindade; ele pensou tê-la encontrado no super-homem. Esta mudança de “crente” para o “ateísmo” fora feita com muita facilidade, assim como também era fácil a sua arte de enganar a si próprio. Isto sendo um autobiógrafo. Ele havia de se torna um cínico. A religião tinha sido a própria essência de sua vida, e agora a vida parecia vazia e sem significado. Passou repentinamente para um breve período de orgia sensual com seus colegas de faculdade, chegando a vencer o excesso de espírito crítico que fizera com que tivesse muita dificuldade nas artes de fumar e de beber. Mas em pouco tempo o vinho, as mulheres e o fumo despertaram a sua repugnância, e reagia com grande desprezo quem bebesse cerveja ou fumasse perto dele.

Em Leipzig estuda Filologia Clássica e não mais teologia, desfruta nos quatro anos que viveu nesta cidade um certo equilíbrio e felicidade. Quando não está na sala de aula, em geral está em casa, estudando e compondo música. Seu trabalho era profícuo e coroado de êxito, com várias conferências, inúmeras resenhas, leituras de Homero, Hesídio e Demócritom; mas principalmente Schopenhauer(1788-1860): O Mundo como Vontade e Representação (1818). Este foi o seu primeiro contato com a filosofia. Fato que mudaria a sua vida por completo. Encontrou em Schopenhauer um espelho, o mundo, a vida, talvez até um mestre e a sua própria natureza. Levou o livro para casa e leu página por página. Palavra por palavra. O tom sombrio e pessimista do filósofo iria impressionar para sempre os seus pensamentos e escritos. O mundo ordenado pela razão, pelo sentido histórico e pela moral, não era o verdadeiro mundo, lia-se ali em Schopenhauer. Atrás ou por baixo dele pulsa a verdadeira vida, à vontade. Nietzsche obriga-se a ir para cama às duas da madrugada por catorze dias consecutivos, e levantar-se às seis. Impõe-se a uma dieta severa, cria seu próprio manual e mosteiro e nele vive como um verdadeiro asceta. Queria provar o quanto podia suportar sem perder o prazer de viver. Pois para ele a negação schopenhauriana de poder, nada mais era do que uma afirmação enfatizada. Em outras palavras a negação, nada mais era do que uma afirmação: O poder negar. Nietzsche declara claramente que para ele Schopenhauer era mais que um mestre era também um educador. O verdadeiro educador, também é um libertador, pois ensina com martelos. É um processo educativo que em primeiro lugar tem por objetivo à destruição, para logo após uma outra e uma nova construção.

No embalo desse encontro, leu a História do Materialismo, de Friedrich Albert Lange. Foi ai neste momento que ele conheceu a crítica kantiana do conhecimento, o materialismo antigo e moderno, o darwinismo e os fundamentos das mais novas ciências naturais.

Uma pergunta terá de ser feita, para tentarmos compreender um pouco mais sobre vida complexa do jovem Nietzsche. A pergunta seria: Qual era o contexto que Nietzsche vivenciava?

A EUROPA DO SÉCULO XIX:

Vejamos o que nos relata Max Beer, em seu livro História do Socialismo e das lutas sociais (2006, p.457):

Um dos mais graves erros da política da Alemanha foi a participação dos “Estados” alemães, de 1792 a 1815, na guerra contra a Revolução Francesa e contra a França napoleônica. O povo alemão, que só em 1750 começou a se refazer das conseqüências da guerra dos Trinta Anos foi precipitado num oceano de aventuras, no qual verteu ondas de sangue e de riquezas em proveito dos despotismos e da reação indígena, da política industrial e colonial inglesa, do czarismo e da classe feudal, em detrimento dos interesses da classe burguesa, do desenvolvimento econômico da Alemanha e da democratização da Europa. Sem as guerras de coalizão contra a Revolução Francesa, nem o terrorismo jacobino nem o imperialismo napoleônico poderiam ter existido. A maior parte da responsabilidade da derrota, ou pelo menos da degenerescência da Revolução Francesa, cabe ao mesmo tempo aos Estados alemães e a Inglaterra Na verdade pouco faltou para que o povo Francês vencesse a reação européia e assim proporcionasse à burguesia alemã ocasião de desenvolver-se política e economicamente. Sob golpes assestados por Napoleão, o velho Império germânico ruiu.

Alguns países como a Rússia e a Áustria, ficaram completamente impotentes, e a concorrência inglesa sofrera grandes derrotas no continente. Mas para que essa situação viesse a se tornar favorável para a Alemanha, seria necessária uma geração esclarecida. E isto a Alemanha deste momento não tinha. A lealdade sentimental da burguesia alemã, seu nacionalismo estreito e sua inteligência servil, impeliram-na novamente para os braços da miséria econômica. Havia ainda neste exato momento a lembrança de uma promessa. A promessa do Rei da Prússia, Frederico Guilherme III e o czar Alexandre I, que depois da retirada de Napoleão dariam à Alemanha liberdade e independência.

Com entusiasmo delirante, o povo alemão lançou-se na guerra chamada de “libertação” (1813 – 1815) e venceu os exércitos de Napoleão, devolvendo assim, a Inglaterra, o domínio do mercado mundial e o seu Império colonial, e aos príncipes alemães, suas coroas. Receberam de paga a constituição da Santa Aliança, a opressão de Metternich, o amordaçamento da imprensa, a supressão do direito de associação, a prisão dos patriotas alemães e a continuação do estado de divisão da Alemanha.

Ocorreu que alguns dos mais esclarecidos, intelectuais, poetas e burgueses, protagonizaram algumas manifestações em protesto a esta situação humilhante do povo alemão. Mas tais protestos não passariam de lamentações. E o que se via era que o povo, na sua maior parte havia saído destroçado, debilitado e arruinado das campanhas contra-revolucionárias e das chamadas guerras de libertação. A ocupação francesa custou-lhe muito caro. Cerca de 1.000 milhões de marcos. Os anos de 1816 e 1817 foram anos de péssimas colheitas e de fome. O consumo das massas, apesar dos armazéns e depósitos estarem abarrotados de mercadorias, foi, por assim dizer, reduzido a zero. Armadas com todas as conquistas da técnica moderna, a concorrência inglesa aniquilou a indústria restante do povo alemão.

O empobrecimento da nação impossibilitava a reorganização da indústria baseada no maquinismo. Além disto, os salários extremamente baixos tornavam inútil o emprego das máquinas. Entretanto a situação melhorou depois de 1830. A Revolução de Julho inspirou nova coragem a burguesia alemã. No ducado de Brunswick, no principado de Hesse, na Saxônia, no Hanover, houveram levantes que obrigaram os governos locais a fazer algumas concessões. Nos estados da Alemanha do sul, intensificou-se a vida política. Chegou-se até a falar da convocação de um parlamento alemão. Recomeçou a atividade econômica e as ciências naturais tiveram magnífico impulso.

Na História do Materialismo, Alberto Lange nos dá uma notável descrição da situação econômica e intelectual da época. O que fez populares a monarquia de julho e o constitucionalismo francês nos meios burgueses da época, foi a especial atenção que tiveram para com os interesses materiais das classes possuidoras. Então, já um comerciante, ou um homem de negócios como Hansemann, poderia tornar-se guia da opinião pública. Nos princípios de 1830, as associações profissionais e outras do gênero brotaram como cogumelos depois da chuva. No campo do ensino foram fundados numerosos institutos politécnicos, escolas profissionais e comerciais. Os governos locais preocuparam-se com o desenvolvimento dos transportes.

Em 1830 constituiu-se a União aduaneira alemã, que estabelecia a liberdade de troca no interior do país. Foi exatamente nesta época que surgiram as primeiras estradas de ferro. Igualmente, neste ponto de vista, o ano de 1835 foi de considerável importância. Primeiro caminho de ferro e logo, o aparecimento do livro de Strauss, intitulado: “A Vida de Jesus”. Uma obra totalmente avançada para a época. Outra obra de grande importância para a compreensão do pensamento intelectual deste século, foi o livro de Gutzkov: “Wally, a que Duvidava”.. Este autor haveria de ser condenado a prisão numa fortaleza. As ciências naturais entraram numa fase de grande desenvolvimento; a química, com Liebig, a fisiologia, com Johanes Muller, a geografia com Alexandre Humboldt, as matemáticas e a física com Carlos P. Gauss. Os escritores e poetas afastavam-se cada vez mais do romantismo e do idealismo. A filosofia idealista, que afirmava o predomínio do espírito em relação a matéria, foi substituída pela filosofia realista, materialista que antepôs o ser ao pensar; a coisa à idéia.

Isto também iria abalar o ensino religioso. Até então se dizia que o homem havia sido criado por Deus. Agora pelo contrário, afirmava-se que o homem é quem havia criado o Deus, ou os deuses, deificando assim o seu próprio espírito. Esta nova concepção que negava por completo a existência de Deus foi difundida na Alemanha por Ludwing Feubarch. O livro de Feubarch, “A Essência do Cristianismo”, publicado em 1841, exerceu profunda influência no espírito de seus contemporâneos. As conseqüências desta nova perspectiva foram também importantes na filosofia: até então, dissera-se que o espírito absoluto ou Deus criara o mundo e sempre o dirigira; ou então, como Hegel, afirmava-se que, através da História, trabalhava um espírito absoluto, criando, pouco a pouco, no decorrer do seu desenvolvimento o mundo material que percebemos.

Agora pelo contrário, dizia-se que a matéria sempre existiu e que por si mesma se desenvolveu, de acordo com as suas próprias leis interiores, evolucionando da matéria inorgânica (os minerais) até à matéria orgânica (plantas e animais). Não pode haver espírito sem a matéria.

Não poderemos deixar de analisar o papel importantíssimo de uma classe que estava tomando cada vez mais forma e força na Alemanha do XIX: A Burguesia. Este ataque contra a teologia ou contra o idealismo. Esta ofensiva contra Deus e os seus anjos desenvolveram-se ao lado da campanha contra a realeza absoluta e o Estado burocrático. Não seria a realeza absoluta e nem a polícia que criam e mantêm o Estado, e sim os cidadãos, os produtores. Eis porque são eles que devem constituir o governo, ou pelo menos, nele ter uma participação mais ativa. A posição contra o regime absolutista e contra a divisão da nação em numerosos Estados soberanos foi uma manifestação da necessidade experimentada pela burguesia alemã de concentrar as forças econômicas nacionais e do seu desejo de unidade, baseado no antigo Império germânico.

A partir de 1830, o programa da burguesia e com ela a maior parte da Alemanha, pois como diz Karl Marx no Manifesto Comunista, (2005, p.41) “O que mais prova a História de idéias do que a produção intelectual muda de caráter na proporção em que à produção material muda? As idéias dominantes de cada época sempre foram às idéias da classe dominante.” Encerrava as seguintes reivindicações:

1. Liberdade de consciência, ao invés de dogmas eclesiásticos.

2. Liberdade de pensamento no lugar da escolástica.

3. Liberdade de trabalho, ao invés dos regulamentos policiais.

4. Unidade nacional e não aos Estados soberanos.

Mas excetuados aqueles que emigraram para França, Bélgica, Suíça ou Inglaterra, para não serem presos ou para não serem sufocados pela censura alemã, bem poucos foram os representantes dessa geração que conseguiram desenvolver plenamente suas aptidões e realizarem feitos dignos de notas. O livro de Max Stiner (Gaspar Schmidt) intitulado: “O Único e sua Espécie”, (1845), é a mais extremada expressão dessa tendência essencialmente liberal, nesse livro o autor afirma que todas as noções como Deus, humanidade, coletividade e moralidade, são puras construções do espírito. Na opinião de Stiner, só o indivíduo é real. O que interessa não é Deus, nem a humanidade, nem a verdade, nem a bondade, nem a justiça, nem a liberdade, mas unicamente o meu próprio eu. O que me interessa não é uma coisa geral, mas uma coisa única, como eu mesmo o sou. Sendo assim Stiner é o verdadeiro representante do anarquismo individualista. Boa parte da força de seu livro nasce do fato de se opor ele ao movimento comunista, que aparecia precisamente nesta época.

O século XIX se processa numa marcha para o humanismo e o antropocentrismo, dar-se um extraordinário desenvolvimento no campo das ciências naturais: física, química, biologia, psicologia. Em torno deste desenvolvimento tecem-se as mais arrojadas conjecturas; o domínio da natureza e do próprio homem parece para o alemão desse século, confiante, apenas uma questão de tempo. A supervalorização das ciências naturais e seus métodos enquanto a filosofia e a religião, que jamais haviam trazido, segundo eles, as soluções definitivas aos problemas básicos do homem, são desvalorizadas e postas de lado, como superadas. É o movimento naturalista que nasce em meados do século XIX e se firma em toda a segunda metade desse mesmo século.

Não só a Alemanha, mais em toda Europa a movimentos de superação da antiga idéia de explicar o mundo e o homem através de um simples relato bíblico. Na França, A. Comte funda o positivismo que, com sua célebre lei dos três estados, declara a religião e a metafísica simples expressões de fases evolutivas já superadas pelo homem. Na Inglaterra, o grande evento é a publicação da “Origem das Espécies”, de Darwin, em 1859. O darwinismo, realmente acabou por afastar o homem, das explicações religiosas sobre a sua origem.

O século XIX foi com certeza o mais bem documentado no que diz respeito às idéias reformadoras na história da Europa. Nunca antes, houve tantos duvidantes, que iriam escrever e falar onde podiam ser ouvidos, e muitos mais gente veio ouvi-los. Logo no início deste referido século as pessoas exigiam que se pusesse fim a perseguição religiosa e as injustiças políticas e sociais, que tinham como gênesis a religião. Foi o século da luta pelo fim total da escravidão, pelos direitos das mulheres, pelo direito de expressão e principalmente, este século seria marcado pela luta contra a hegemonia das normas e dos valores cristão.

O fato é que neste século a ousadia da irreligiosidade, do ateísmo e do secularismo iria atingir níveis cada vez mais crescentes nas cidades e nos países de toda a Europa. Livros, artigos, canções, artes, filosofias, todos iriam de alguma forma demonstrar o seu repúdio a idéia de um Deus supremo criador de todas as coisas. A partir de então, a velha esperança de substituir a religião pela ciência ou pela filosofia racional, mas do que nunca ganhavam forças. Seria a hora de começar a construir algo em que se pudesse confiar realmente, num novo mundo feliz, livres de dogmas, normas, valores e da moral cristã.

O século XIX seria o do mundo cosmopolita, e isso, como sempre, leva a secularização e a dúvidas. A Europa iria experimentar rápidas mudanças. O capitalismo, e logo após a industrialização em ascensão desde antes que Adam Smith escrevesse sobre ele em 1776, rompeu um milhão de tradições com o passado e, como o crescimento e a mudança eram uma parte implícita dele, mesmo as novas tradições eram agora deixadas de lado para se vender a algo novo.

Todas essas idéias materialistas e naturalistas que surgem em dimensões assustadoras, logo iriam refletir em todos os campos do saber e da atividade humana como: pedagogia, direito, história e a literatura. É impressionante verificar como a maioria das obras publicadas na segunda metade do século XIX exprime essa visão do mundo, quer se denomine positivismo, cientificismo, naturalismo, empirismo ou mesmo realismo. É uma visão unilateral do universo que se projeta em todos os campos, até mesmo a arte da época. E é nesse clima histórico-cultural que nasce, cresce, estuda, se desenvolve, viaja e se perturba Friedrich Nietzsche.

Para exemplificar o pensamento, e mesmo aquilo que estava sendo escrito por muitos homens europeus do século XIX, separei aqui um trecho do livro O Futuro de uma Ilusão de Sigmund Freud (1856-1939):

Em que reside o valor das idéias religiosas? Já falamos, da hostilidade para com a civilização, produzida pela pressão que esta exerce, pelas renúncias do instinto que exige. Se se imaginarem suspensas as suas proibições – se, então, se pudesse tomar uma mulher que se quisesse como objeto sexual; se fosse possível matar sem hesitação o rival ao amor dela ou qualquer pessoa que se colocasse no caminho, e se, também, se pudesse levar consigo qualquer dos pertences de outro homem sem pedir licença – quão esplendida, que sucessão de satisfações seria a vida. (2001, p. 25)

Influenciado por tais idéias, Nietzsche formularia suas ofensivas contra a religião e em especial contra o cristianismo. Religião que ele próprio chama de “platonismo para o povo”. Desfere suas terríveis críticas contra Paulo, o “apóstolo”, do Novo Testamento. Não há dúvidas de que foi culpado, como declara Durant (2000, p. 408), de um pequeno exagero quando predisse que o futuro iria dividir o passado em “antes de Nietzsche” e “depois de Nietzsche” E que só haveria um destino para o futuro do cristianismo: O fim, o fracasso, a destruição. Ele acreditava mesmo nisto. Não seria só a religião cristã o alvo de suas pesadas críticas. O Budismo também seria vítima de sua “língua ferina”. Mas existia uma grande diferença entre o Cristianismo e o Budismo. O primeiro requer do homem o esquecimento da vida presente em prol daquela vida futura extraterrena. O Cristianismo promete o além. O Budismo apesar de também ser uma religião que tem por centro a moral-de-rebanho. Seria mais humano e mais terreno.

OS PRÓXIMOS ANOS: SERVIÇO MILITAR, DOR, VIAGENS E MORTE:

Neste momento começa os seus primeiros trabalhos em forma de aforismos. E porque aforismos? Seu estilo poético e fragmentário sob a forma de aforismos é parte integrantes de sua concepção filosófica antiteórica e assistemática, buscando criar um novo filosofar de caráter libertário e visando superar as formas limitadoras da tradição filosófica, cultural e religiosa. Isto é o que nos declara Marcondes (2005, p.139):

Nietzsche inicia sua revisão de conceitos tradicionais da filosofia. Seu objetivo é desmistificar a “verdade”, revelando-a como um conceito fabricado, isto é, criado histórica e socialmente. Entretanto, tal conceito tem sua origem ocultada, aparecendo como objetivo, definitivo, científico. Por meio da consideração da linguagem, através de quais conceitos como o de verdade, são criados e entram em circulação, pode-se revelar a origem e o caráter metafórico desses conceitos.

No ano de 1867, foi convocado para o serviço militar. Assim sendo interrompe seus estudos. Começou a servir na seção de cavalaria como Praça em Naumburg, onde aprende a cavalgar e a disparar canhão. No entanto uma queda do cavalo, em Março de 1868, feriu-o gravemente no peito fraturando a costela, pondo fim a carreira militar. Nietzsche nunca iria se recuperar daquela contusão, passou por uma longa e difícil convalescença, suportando dores intensas. Sua experiência militar foi tão curta que ele saiu do exército com quase tantas ilusões sobre os soldados quanto tivera ao entrar. Passou a venerar o soldado porque a sua saúde não lhe permitira que se tornasse um deles.

Segundo Kleverton Bacelar (2006, p. 9) “em meados de Outubro, Nietzsche deixou o serviço militar e regressou a Leipzig”. Da vida militar, ele passou para sua antípoda: a vida acadêmica de um filólogo. Em vez de se tornar um guerreiro, tornou-se um Ph.D, sendo nomeado para a cadeira de filologia clássica na Universidade de Basiléia. Contava com 24 anos quando se formou professor de filologia clássica. Entregou-se ao trabalho. Dava cursos regulares, fazia palestras e dedicava-se a escrever. Sua aula inaugural, sobre a personalidade de Homero, foi bastante aplaudida pelos ouvintes. Teve um grande arrependimento ao assumir aquele trabalho anti-heroicamente sedentário. Queria uma profissão mais ativa e prática, como a medicina, mas tinha uma forte atração pela música. Tornou-se um pianista razoável e escrevia algumas sonatas. “Sem a música” dizia ele, “a vida seria um erro”.

O encontro com o Músico Richard Wagner aconteceu em 1869. Nietzsche havia sido convidado para passar o natal em Tribschen, onde o músico morava com a mulher de outro homem. Nietzsche passou a visitar Wagner em Tribschen, que não ficava longe da Basiléia. Caracterizou o lugar como seu lar e seu refúgio. Wagner era profundo conhecedor da filosofia de Schopenhauer. Em 1872, Nietzsche freqüenta assiduamente a casa de Wagner. A mulher do músico, Cosima, tratam-no com muito respeito. Nietzsche tem uma paixão contida por ela. Sobre o fascínio do grande músico, Nietzsche começa a escrever o seu primeiro livro, que deveria começar com o drama grego e terminar com o Anel dos Nibelungos, divulgando assim Wagner ao mundo. Depois de manter uma relação afetuosa com o casal Wagner, Nietzsche se afasta decepcionado com o festival em Bayreuth, com Parsifal e seus convidados. Também pela falta de atenção que Wagner lhe dispensara.

Em 1870, pede licença do magistério para participar da guerra franco-alemã. Com uma visão deficiente que o desqualificava pára a vida ativa de um soldado ele teve que se contentar em agir como enfermeiro. Recolhia cadáveres e feridos num campo de batalha. Sente-se mal, com vômitos e diarréias. Durante um transporte de feridos ele adoece com disenteria e difteria. A saúde do filósofo será sempre um bem frágil, ora perdido, ora conquistado. Sua vida transcorrerá neste período entre a cátedra e a cama. Com crises constantes de cefaléia, problemas de visão e dificuldade para se expressar, foi obrigado a interromper a sua carreira universitária por um ano, mas não deixou de escrever. Quando tentou retornar às atividades acadêmicas, enfrentou sérios problemas em suas cordas vocais que tornaram a sua fala quase inaudível. Começa então uma vida errante em busca de um clima favorável tanto para sua saúde como para seu pensamento (Veneza, Gênova, Turim, Nice, Sils-Maria...). Entre uma crise e outra, era o momento de maior inspiração.

Nietzsche formulou uma filosofia que busca ser “afirmativa da vida” e valorizadora da vontade. Foi isto que relatou Will Durant (2000, p. 372).

[...] homens que pensavam com clareza perceberam logo aquilo que as mentes mais profundas de cada era tinham sabido: que, nesta batalha que chamamos de vida, precisamos não de bondade, mas de força, não de humildade, mas de orgulho, não de altruísmo, mas de inteligência resoluta; que igualdade e democracia são contrárias à natureza da seleção e da sobrevivência; que os gênios, e não as massas, são o objetivo da evolução, que o poder, e não a justiça, é o árbitro de todas as diferenças e de todos os destinos.

Era isto que Nietzsche pensava.

Em Humano, Demasiadamente Humano escreveria: “deves tornar-te senhor de ti mesmo, senhor também das tuas próprias virtudes. Antes elas eram teus senhores; mas devem ser apenas teus instrumentos junto com outros instrumentos”. Nietzsche se manterá fiel a esse método, de dar uma forma à vida. Não irá se contentar em produzir frases que possam ser somente citadas. Mas organizará a sua vida de modo a se tornar fundamento a ser citado para o seu pensar. Nietzsche quer viver a sua vida de modo a ter o que pensar. A vida como arranjo experimental para o pensamento, o ensaísmo como forma de vida. Não um ensaio para outra vida, e, sim para esta mesma. Procurará subverter com muita freqüência, a imagem tradicional que o mundo tem em relação à filosofia, surgindo na passagem do pensamento mítico para o lógico-racional-científico.

Procurou neste momento falar e escrever sobre os dois deuses que a arte grega havia adorado: o primeiro, Dionísio, o deus do vinho e da folia, da vida superior, do prazer na ação, da emoção arrebatadora do instinto. Da aventura e do sofrimento. O deus da canção, da música, da dança e do drama. O segundo, Apolo, o deus da paz, do lazer e do repouso, da emoção estética e da contemplação intelectual. Da ordem lógica e da calma filosófica. A mais alta arte grega era a união dos dois ideais: a masculinidade de Dionísio e a tranqüilidade feminina de Apolo. Isto é: harmonia. Mas com Sócrates, a filosofia dionisíaca perdeu seu valor. E Apolo triunfa. A ciência substituiu a arte, o intelecto substituiu o instinto e a dialética os jogos. Sobre a influência de Sócrates, Platão, o atleta se tornou um esteta lógico e racional.

Do período arcaico para o clássico. Procura mostrar que algo de essencial se perdeu nesta passagem. A filosofia que segundo ele, representada por Sócrates, (o homem de uma visão só), inaugura o predomínio da razão, da racionalidade argumentativa, da lógica, do conhecimento científico e da demonstração. Que é chamado por Nietzsche de “espírito apolíneo”. Com isto o homem perde sua proximidade com a natureza e com seus instintos, que na época anterior encontrava sua expressão nos rituais dionisíacos. Na dança, na tragédia e na embriaguez. Seu objetivo é claro e duplo: revelar e criticar esse processo e restaurar os valores primitivos perdidos.

Em plena flor da idade, em 1879, ele teve um colapso, tanto físico como mental, ficando a beira da morte. Pensando que iria morrer com a mesma idade de seu falecido pai, pedi então demissão da Universidade de Basiléia e abandona definitivamente a profissão de filólogo. Preparou-se para o fim com um ar desafiador. Ele mesmo registra este episódio nas páginas do Ecce Homo (2005, p.37):

Meu pai morreu aos trinta e seis anos; ele era tenro, gentil e mórbido, como um ser predestinado a desaparecer; ficou a sua recordação como uma doçura de vida que é a própria vida. Declinou a sua existência pelo mesmo tempo em que deveria declinar a minha. Aos trinta e seis anos desci ao ponto mais débil da minha vitalidade: vivia eu ainda, mas sem enxergar um palmo diante de mim. Então – em 1879 – renunciei à minha cátedra de Basiléia; vivi durante o verão, como uma sombra em Saint-Moritz e o inverno seguinte, o mais pálido de minha existência, em Naumburg.

Nietzsche agora estava aos cuidados de sua irmã Elisabeth. Mas recuperou-se. E seu heróico funeral teve de ser adiado. Entre inúmeros sofrimentos por causa das crises, entre o sofrimento e o triunfo intelectual, ele supera a doença pelo trabalho do pensamento e pelo amor que sente pela vida e ao seu destino. Daí sua alegre aceitação spinoziana das limitações naturais e do destino humano. São nestes momentos que surge a Canção de Zaratustra. Zaratustra se transformará para Nietzsche um evangelho sobre o qual todos os demais livros posteriores serão meramente comentários. Zoroastro um novo deus e o Super-homem, em uma nova religião.

Nem a solidão, nem a enfermidade, nem a vida errante conseguem impedir o trabalho intelectual de Nietzsche. De cidade em cidade, morando em pensões modestas, ele empreende suas investigações. Sua enfermidade ainda produziria uma outra ruptura significativa em sua vida. No fim de 1888 o filósofo apresentou graves sinais de desequilibro mental. A 3 de Janeiro de 1889, Friedrich Nietzsche enlouquecia abruptamente, em uma Rua de Turim, sob o céu da sua querida Itália. Vagava desconhecido entre a multidão indiferente que passava. Uma forte tensão psíquica confinou-o no delírio quando na Praça desta cidade, abraçou um cavalo para protegê-lo dos açoites do cocheiro. Assinava suas cartas, que eram endereçadas a seus amigos mais próximos, como sendo Dionísio. Passava da agressividade a doçura repentina e com seus monólogos em voz alta, seus gritos e com o som de seu piano, agredia os hóspedes da pensão. Em 24 de Março do mesmo ano, pode deixar a clínica e morar com sua mãe Franziska em Naumburg. De 1891 a 1894 as condições de saúde, pioraram rapidamente. Quando em 1892 já não reconhecia nem mesmo os seus amigos que o visitavam e tem repentinos acessos de fúria. Sofre uma paralisia da espinha dorsal que o impede de fazer os seus passeios e o obriga a usar uma cadeira de rodas em casa.

A partir de 1894, já não fala; berra, enquanto seu rosto exprime grande serenidade. O reconhecimento de suas obras chegaria muito tarde. Pois quando chegaram estes pequenos raios de luz, Nietzsche estava quase cego de visão e de alma, e já havia abandonado a sua esperança quanto à cura. Escreve ele: “Minha hora ainda não chegou, só o depois de amanhã me pertence”.

Então em Abril de 1897, morre sua mãe, ficando assim aos cuidados de sua irmã Elizabeth, que regressava do Paraguai. Poderíamos então dividir a vida de Nietzsche em três diferentes momentos: o primeiro instante que vai até os seus dezoito anos, quando ele ainda está a professar e a defender as suas convicções religiosas cristã como um bom teólogo apologeta. O segundo momento seria quando ele decide fazer a passagem do cristianismo para o ateísmo. Momento que ele vai formular as suas principais críticas contra a religião cristã. O terceiro e último momento serão os seus últimos dez anos de vida. Onde ele passara a maior parte de seu tempo tendo variações entre a loucura e instantes de lucidez e muita dor.

Dentre as principais obras do filósofo destacam-se: A origem da tragédia (1872) e O nascimento da filosofia na época trágica dos gregos (1874); Humano, demasiadamente humano (1876-80); Aurora (1881); A Alegre ou Gaia Ciência (1882); Assim falou Zaratustra (1883); A genealogia da moral (1887); Anticristo (1888), Além do bem e do mal (1889); O crepúsculo dos ídolos (1889), A Vontade de Poder, sua última obra, que permaneceu inacabada. Tais obras serão abordadas mais adiante.

A história de sua vida se encerra no primeiro ano do novo século. Em seguida a terrível noite de tempestade. A 25 de Agosto de 1900, após onze anos de quase inconsciência, abandonou Nietzsche este mundo que tanto valorizava e amara, apesar de todos os sofrimentos. Mas o alcance de suas obras começaria a ser compreendida; a história se abriria para novas perspectivas. O maior sonho de F. Nietzsche.

filoliveira
Enviado por filoliveira em 29/12/2007
Reeditado em 03/04/2013
Código do texto: T795772
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