O rio São Francisco

O grande sociólogo Gilberto Freyre, de saudosa memória, disse que “a natureza parecia estar bem intencionada ao criar o rio São Francisco”. Isto porque, nascendo na Serra da Canastra, em Minas Gerais, a pouco mais de 200 quilômetros do oceano, forma uma curvatura, muda o seu rumo, e vai desembocar a 2.800 quilômetros, na divisa dos estados de Alagoas e Sergipe, beneficiando a grande região semi-árida do Nordeste, depois de cruzar também os estados da Bahia e Pernambuco. Assim, são cinco os estados banhados por suas águas cristalinas, hoje retidas parcialmente por várias barragens, onde usinas hidroelétricas foram instaladas, não só para gerar energia elétrica para o Nordeste, mas também para outras regiões do país. Como gosto de citar os nossos heróis nordestinos, seja na literatura ou na música, volto a lembrar o nosso “Rei do Baião”, Luiz Gonzaga, que numa de suas músicas, referindo-se à usina hidroelétrica de Paulo Afonso, dizia: “se ligarem mais um fio, você ilumina o Rio, São Paulo e toda a nação”. Graças a essa energia elétrica o nosso Nordeste se desenvolveu. Onde havia aquela agricultura apenas de subsistência, passou-se a produzir em larga escala, abastecendo não só o nosso mercado, mas exportando também para a Europa e os Estados Unidos. Na área da piscicultura, o rio São Francisco já conta também com grandes criadouros de peixe, saindo daquele atraso em que a coleta do peixe dependia do anzol e da tarrafa, onde a sua escassez já se fazia notar, pela mudança do ciclo natural do rio, em razão de suas barragens. Agora, vê-se uma região próspera, com tendência a maior desenvolvimento, graça a este nosso “Velho Chico”, o rio da “Unidade Nacional”, que ameaça ser sangrado com a transposição para beneficiar outros estados do Nordeste. Tecnicamente, não tenho conhecimento para discutir o mérito da questão, mas espero que se o fizerem, não esqueçam a sua revitalização. É isto que temos visto nos longos debates dos prós e contra a transposição. Lembremo-nos, portanto, do velho sociólogo. Se a natureza estava bem intencionada ao criá-lo, não vamos desvirtuá-la. Sou suspeito para emitir a minha opinião, pois sou um autêntico sanfranciscano, popular beradeiro ou ribeirinho, porque nasci em uma de suas margens, a poucos metros do seu leito. Ele é o maior rio genuinamente brasileiro. Graças a ele “o meu nordeste está mudado, publique isto pra ficar documentado”, tal qual lembrou o grande Luiz Gonzaga.

Irineu Gomes
Enviado por Irineu Gomes em 11/01/2008
Reeditado em 15/01/2008
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