Confissão

CONFISSÃO

Quero confessar um ato do qual muito me envergonho. Em primeiro lugar digo que sou um cidadão de bem, responsável e cumpridor de meus deveres; trabalho oito horas por dia para dar à minha família condições de vida dignas. Mas, como estava dizendo, cometi um crime.

Aconteceu de forma casual e sem intenção; não estou querendo com isso dizer que há desculpa; e como é comum nesses casos foi motivado pelo desejo a um objeto que não me pertencia e ao qual não possuo poder monetário para adquirir. A primeira vez que vi o objeto foi em uma conversa entre vizinhos, isso mesmo a vítima era um vizinho meu, estávamos tratando de assuntos sobre a conservação de nossa rua quando esse vizinho tirou do bolso um celular que era a última palavra em tecnologia, teclado estendível, conexão de alta velocidade, envio de vídeos e imagens e todas essas coisas que somente os melhores celulares oferecem; me encantei com aquela maravilha de aparelho. Depois de terminada a conversa procurei saber o modelo e assim pesquisei o preço, quase cai pra trás ao ouvir a soma, teria de trabalhar meses sem gastar nada pra comprar um daqueles, fiquei inconformado e durante certo tempo amuado comigo mesmo por não poder comprar um celular daquele.

Mas, um “mas” que mudou minha vida, sempre há um “jeitinho brasileiro” para tudo e como um bom exemplo de brasileiro que sou logo descobri que ali nas imediações do bairro qualquer um poderia ter um aparelho daquele pagando uma soma irrisória pelo mesmo; era preciso apenas conhecer o “fornecedor” correto.Como disse antes sou um cidadão de bem, mas vivo em uma sociedade podre que finge não ver as diferenças abismais entre as classes sociais e por isso mesmo conhecer pessoas que “não tiveram as mesmas oportunidades” que tive não era nada difícil, logo essas me levaram até alguém que poderia arrumar um aparelho para mim por muito menos da metade do preço. Chegando ao local não fui apresentado ao “cara” ele se limitou a ouvir meu pedido e responder que em quatro dias o aparelho estaria disponível.

Rápido e fácil, passado o tempo estipulado recebi o aparelho; todo contente por ser “esperto” e ter conseguido algo tão bom por um valor muito baixo, retornei ao lar. Lembro bem daquele dia, era um domingo, estava sozinho em casa e talvez seja por isso que não soube de nada.

Durante a noite enquanto mexia no aparelho e me familiarizava com seu funcionamento me deparei com a seguinte mensagem “Dedego, não demore no supermercado que já está muito tarde, Te amo”. Era a única mensagem, fora enviada as onze e trinta da noite do sábado, não me senti muito bem ao ver aquela mensagem; era como se alguém estivesse gritando com um megafone:___Esse celular não é seu! Mesmo assim me fiz de surdo, se alguém foi descuidado como o aparelho a culpa não era minha.

Como disse antes sou trabalhador e muitas vezes o trabalho consome até os fins de semana, por isso estava sozinho no fim de semana; minha esposa e filhos estavam na casa de minha sogra e voltariam apenas na segunda. Quando chego minha mulher recebe-me com um rosto marcado pela tristeza, ao perguntar o que havia descubro que meu vizinho, aquele do celular, fora assaltado e morto na noite de sábado, foi um choque. Apesar de não sermos grandes amigos ainda assim era uma pessoa próxima com quem todos tinham boas relações. Tomei um banho rápido e depois de me arrumar acompanhei minha esposa até a casa da viúva, lá chegando encontramos conhecidos e amigos ainda confortando a mulher; fiquei na cozinha conversando e ouvindo como se deu o ocorrido assim fiquei sabendo que ele fora morto com três tiros no peito dados à queima roupa por um homem que depois lhe tirou as jóias, carteira, dinheiro, celular e depois saiu andando como se tivesse feito a coisa mais natural do mundo. Quando tomei coragem de ir até a sala, alguma coisa me incomodava naquilo tudo, ouvi a gritos de desespero vindos da sala: ___Diego! Diego! Porquê meu Deus!? Ai! Ai! Eu não posso acreditar nisso!

Não consegui conter as lágrimas, mas não foi o lamento da mulher que me fez chorar, ao chegar na sala deparei-me com um grande cartão desses de namorados com a foto do falecido; nele estava escrito assim: “Dedego, você é a pessoa mais especial desse mundo para mim! TE AMO!”.

Pense bem antes de comprar alguma coisa roubada, ela pode ter custado um preço muito maior do que você imagina.

Petrus Stone
Enviado por Petrus Stone em 11/06/2008
Reeditado em 12/06/2008
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