Conselho

Não chores, mulher, que este por quem choras ainda há de pedir-te perdão por cada uma destas lágrimas que derramas, ainda que não haja razão para tanto.

Não por tua beleza mais que evidente: tuas curvas sensuais, teus olhos cor de mar, de límpido céu azul, tua pele aveludada por mil cuidados, primeiramente dos céus, que a privilegiaram com a maciez perene, como se nunca tivesse deixado de ser bebê, e conservada por sua vaidade, seus cremes hidratantes, óleos, essências. Não seria por tua beleza, mulher.

Não será ainda por tuas posses: tua mansão, teu jardim rico das flores mais variadas e belas, pelos quadros pendurados nas paredes, os supercarros na garagem, a grande mesa com os castiçais de prata, na qual planejavas o jantar que ele recusou. A grande soma em dinheiro que herdaste de teus pais e que soubeste bem administrar, o exército de empregados que lhe guardam de dispensar qualquer minuto do teu precioso tempo no cuidado de problemas insignificantes... Não, também não serão tuas posses.

Não conheces ainda a natureza do ser pelo qual teu coração se rendeu ao amor que tanto desgosto já lhe deu e do qual conseguiu fugir por tanto tempo? Parece que só agora, com o gosto do sal que escorre pela tua face, que inunda o teu paladar, a tua noite, a tua existência vazia de sentimentos verdadeiros é que percebes o que agora te afirmo: é o amor que se alojou em teu peito, mulher. E te ressentes do moço ter-lhe recusado os presentes e, recentemente os convites... Não vês que mal fizeste? Encontraste alguém a quem amar e quiseste comprá-lo, como fizeste com as coisas às quais dás mais importância na tua vida de pessoa importante. E tens sorte – ou o azar, talvez – de ter encontrado alguém que não se tenha deixado comprar pela tua beleza, pelo teu dinheiro. Parece-me um sinal de pureza ética, de rigidez de princípios desse rapaz. E um sinal de amor verdadeiro e, se realmente verdadeiro, ferido pela sua incompreensão.

Porque acho que ele te ama?

Ah, isso concluí quando me apresentaste o objeto do seu desejo. Não se ofenda pela palavra objeto, querida, pois é assim que você o tratou, como um objeto. Está bem, paro. Então, naquele dia, no meio das nossas férias quando vieste toda sorriso me apresentar aquele novo amigo, já vi um brilho diferente nos olhos de ambos. Já vi que o destino os havia colocado frente a frente com um objetivo claro, mesmo que dependa de vocês seguir os planos dele ou negá-los. Senti que havia atração entre seus corpos, que a presença de um era motivo suficiente para o outro abrir um sorriso, mesmo que vocês achassem pretextos na nossa conversa para tal. Apenas isso bastaria para eu saber no que ia dar este encontro. Você mesmo deixou escapar algumas vezes, distraída, a sua admiração por ele. Logo vi no que ia dar.

O que fazer? Ele se apaixonou quando não sabia o que você era. Deve ter visto algo no seu sorriso, na sua voz, no seu jeito de ser quando estava perto dele. Já demonstrou que não quer presentes, viagens, jantares ou passeios em seu conversível. Então, amiga, se a minha opinião vale alguma coisa para você, digo-lhe que vá ao encontro dele apenas você mesma, sem acessórios; leve somente o que ainda há de puramente humano em você que é o que o fez se apaixonar por você e o que sustenta a nossa amizade de longos anos.

Tente, mulher!

Não custa nada...