A um amigo

Querido amigo,

Certo dia conversávamos a respeito da nossa amizade e ao refletirmos sobre ela disse-me que não valia a pena investir numa relação na qual somente existia um lado de esforço - o seu - para dar conta de resistir a nossa amizade.

Pois bem, concordo contigo no que se refere ao fato de termos que nos esforçarmos de maneira igual para construirmos juntos aquilo que duas pessoas irão desfrutar, isto é, a amizade. Contudo, antes de mais nada eu pergunto a você o que se entende por amizade e, em particular, qual a sua compreensão dessa palavra. Talvez possa esboçar uma compreensão interpretativa quanto a sua opinião sobre esse assunto. Quando me disse que só havia esforço de sua parte para manter acesa a chama de nossa amizade deixou entrever nessa sua fala a sua compreensão de amizade ou pelo menos, daquela relação que unia a ambos, ou seja, na sua opinião são necessarios esforços igualitários num mesmo sentido e que esse esforço tenha a caracteristica de chama evocando, assim, a condição de afeição ou aquilo que aponta para a mesma. Na minha interpretação da sua opinião vejo um ranço de egoísmo relacional de sua parte no tocante ao exercício de se situar diante de um alguém ou quem sabe até mesmo uma possesão dominante da sua parte sobre a minha pessoa por meio dessa pseudo-amizade que, em sua mente, era algo trabalhado apenas por você.

Segundo alguns autores consagrados pelo uso de suas faculdades intelectivas tal condição de relação entre duas pessoas há que existir uma espécie de transcendência no ir em direção ao outro para que o outro não seja "fagocitado" pelo afã do relacionar-se. Ao passo que isso acontece respeita-se a alteridade mesma do outro. Será que é capaz de compreender esse protegimento da pessoa do outro? Será que é capaz de se colocar na situação do outro, no caso eu, para resguardar a dignidade da minha individualidade assegurada pela minha condição de pessoa e de sujeito na autopossessão originária do meu existir enquanto pessoa? Creio que não!! Aliás, segundo a sua concepção acerca de nossa amizade essa situação já vinha sendo feita por você de modo ímpar a ponto de se julgar autorizado a me recriminar!

Você fala de chama de amizade. Onde está a seraficidade de sua afeição? Não estará ela confinada nos recônditos obscuros de sua alma sedenta, sangrenta e homofágica?! Aquele lugar sombrio para o qual queria me arrastar e ali consumir a chama de minha existência? Sua amizade é de índole tanatológica. Sua afeição de amizade é afeição pavoneana. Queria fazer de mim um escravo de sua afeição! Sarte disse muitas coisas, mas agora me lembro de duas que são próprias da nossa condição de "amigos". Quando ele disse que o homem é condenado a ser livre, uso essa sua idéia para criticá-lo em seu posicionamento de amizade e ao mesmo tempo me libertar de sua cadeia afetiva. Agora, ele também conseguiu defini-lo perfeitamente quando que disse que o homem é uma paixão inútil. Eis o que você é!!

Atenciosamente. Mande notícias!!!

Dranem
Enviado por Dranem em 30/01/2009
Reeditado em 05/04/2009
Código do texto: T1413223