Uma última carta de amor

Para uma ex-namorada

Já havia passado por isso antes mas de um prisma diferente. Tive outra visão pois minha posição na época era outra.

Apesar de antes ter doído mais, sinto-me pior neste momento. Não tenho lágrimas para chorar. Sinto-me incapaz e rejeitado. Não tenho pena de mim e não gostaria que muitas pessoas soubessem do que aconteceu, pelo menos não dos detalhes.

Quando duas pessoas não se entendem mas se amam, elas tendem sempre a reconsiderar. Tentarão, mesmo que em vão, ficar juntas. Poderão até separar-se por um tempo, mas depois algo a trará a vida juntas novamente.

Ao sentir que só eu amava, na primeira vez, percebi que era a hora de dar um fim a uma coisa que nunca deveria ter começado. Não houve resistência, e, por isso, concluí que a hipótese de um monófilo era a correta, verdadeira. Isso aliviou minha consciência. "Se ela me amasse, ou se pelo menos quisesse, faria algo para evitar a separação." - Pensei.

Todo esse fato torna a dor de hoje ainda maior. Eu não lutei ao ser rejeitado, embora essa fosse minha maior vontade. Talvez não naquele momento, mas minutos depois e minutos depois já eram tempo demais.

Teria esse mesmo pensamento ocorrido a ela naquela primeira ocasião? Provavelmente nunca saberei. Sei que sempre fomos muito parecidos. Poderíamos, sem sombras de dúvidas, pensar e agir da mesma forma.

Ao tentar ligar para ela, concluí que seu número havia mudado, para meu semi-desespero. Calando meu orgulho, creio que pela primeira vez em quatro anos, tive um motivo real para chorar.

Você me fez ver que rejeitei alguém que realmente amava. Na época achei que não fosse amado simplesmente por não ver luta. Posso não tê-la visto, mas não quer dizer que não tenha havido.

Platão disse: " - Apenas os mortos conhecem o fim da guerra." A maior guerra é a interna. Aquela que ninguém pode ver. Aquela que só pode sentir. Aquela que só nós mesmos podemos sentir, a nossa. E cada um tem a sua. Quando começamos a sentir a guerra do outro, quando realmente nos incomodamos como desconforto alheio, ao sentirmos nosso pé enquanto a outra pessoa pisa em um prego, ou quando fechamos os olhos ao vermos o sol bater na janela do quarto dela. Por sorrir ao vê-la abraçar seus pais. Por se arrepiar ao vê-la derramar uma lágrima. Enfim, quando a guerra interna de outra pessoa passa a ser a nossa também, nos contagia e nos domina: isso é amor.

Foi só por isso que não relutei em dizer não. Por isso concordei em sofrer com meu orgulho ferido, não apenas a perda de um amor, mas a perda de uma amiga.

Minha vontade era gritar, esperniar, dizer basta e recomeçar. Eu tinha esse direito. Não sei até que ponto iria sua certeza e determinação, mas garanto que, com minha insistência, acabaria cedendo em algo, mesmo contra a sua vontade. Mas não o fiz. Poderia ter lembrado nosso primeiro beijo, nosso primeiro afago ou do dia que me disse que estava feliz por estar comigo. Eu teria perguntado: " - Lembra-se do que sentia naquela ocasião?" Teria recordado já ter sido a melhor parte do seu dia. Poderia ter confessado cada gota de suor que derramei ao falar com seus pais, cada vez que engoli seco quando ouvi sua mãe falando que não ia dar certo. Cada beliscão de sua sobrinha. E poderia ter cantada a canção que compus enquanto estávamos distantes. Mas não o fiz.

Foi só por isso que relutei em dizer não, por amá-la.

Onde fica minha gratidão?

Sou-lhe grato por abrir minha mente para o fato de ser um estúpido. Não pude ver quais peças faltavam para montar meu quebra-cabeça. O quebra-cabeça da minha vida, até o momento que me fez vê-las.

Não estou dizendo que vou procurar meu antigo amor. Ela não é uma peça assim como você nunca foi. Eu estou emburacado. Não montei minha vida ainda, jamais poderia montar uma vida junto a alguém. Com quem quer que fosse. Deixo claro que, por ser rejeitado, pude concluir que talvez tivesse sido muito amado no passado. E para mim, isso basta.

Essa é a peça. Posso não ter sido a pessoa perfeita para você, mas não quer dizer que não seja a pessoa perfeita para outrem. E vice-e-versa.

Você me fez mudar. Mudei ao tê-la bem forte em meus braços, enquanto sentia seu calor, este ia derretendo o gelo sólido que cobria minha auto-estima. Mudei ao ver seu sorriso várias vezes ao me avistar. Sorriso este que não contemplei da última vez. Mudei depois que comecei a escrever esta carta.

Continuo sentindo-me rejeitado, mas não sou incapaz. "Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos." - (Albert Einstein). Eu fui escolhido para algo grandioso, mas precisava ser refinado. Estou sendo. Quanto mais dura a pedra, mais duros os golpes. Está doendo muito, mais uma vez de muitas e de outras que certamente virão.

Tenho tido muitas pedras em meu caminho, não me refiro a ti, e tenho guardado todas elas.

Tenho tido diversar flores, me refiro a ti, e, como toda flor, elas me felicitam, embelezam minha vida por um tempo, depois murcham.

Carregarei as pedras e me lembrarei das flores. "Com elas construirei meu castelo." - (Charles Chaplin).

Faço também minhas as palavras de Voltaire: " - Não posso concordar com cada palavra que disseres, mas defendo até a morte o teu direito de dizê-las."

"...somos derrubados, mas não destruídos...Por isso não desistimos; porém, embora o homem que somos por fora se definhe, certamente o homem que somos por dentro está sendo renovado de dia em dia. " - Apóstolo Paulo, 1 Coríntios 4:9, 16.

Citei filósofos, cientistas, artistas de um modo geral e escritores da Bíblia. Agora vou falar do fundo do meu coração:

"Choro, não pela tristeza de termos rompido, mas pela alegria ao lembrar-me dos momentos felizes que me proporcionaste. Muito obrigado, sempre te amarei."

Adeus,

Carinhosamente,

Douglas...

Prima
Enviado por Prima em 17/03/2009
Reeditado em 10/01/2011
Código do texto: T1491496
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