Uma carta de amor

Pra Maria das Dô Perera

No dia que ocê foi daqui, do gerais, eu fiquei ti reparano. Vi qui ocê nem oiô pá trás. Vi qui ocê tava dicidida, ocê tinha qui í. Sei da dureza da vida que ocê levava, era uma vida de pobreza, saiu daqui sem nem dispidi de nós. Ficô pá trás pai, mãe e os irmão. Dexô pá trás uma istóra, eu fiquei pá trás tamém. Fiquei do modo que os ôtros tamém ficaro. Sei qui ocê nunca ficô sabeno do qui eu sintia pur ocê. Do tanto que eu amava ocê. Amava ocê di meu modo, calado. Sei tamém que ocê num tinha ôio pra mim. Purquê se reparassi, ocê via o briio dele quando via o seu. Foi ano e mais ano ti isperano. Nunca eu tive coragi, nem de brincadêra de dexá os ôtros sabê do meu amô pur ocê. Sufrí pur dimais. Quais qui eu murria di tanto ciúme toda vêz qui eu via ocê, cum sua rizada gostosa, quando ocê tava cum seus amigo, sua risada dava de intendê qui ocê tava apaxonada. É, uma paxão filiz faz as pessoa ficá mais bunita, o qui num era meu causo. A minha paxão era triste, sozinha e purquê num dizê covarde. O meu amô pur ocê pudia tê tido ôtro rumo. Si eu tivesse tido corage, eu pudia tê ti pidido pá ficá. Pudia tê ti pidido im casamento. Naqueli tempo eu já tinha um pôco de recuço. Dava pá nós vivê. Mais eu tive medo di qui cum isso eu pudia perdê sua amizade. Prifirí calá e vivê meu amô no silenço. Nesse tempo todo pocurei tê nutíça sua. Fiquei sabeno do seu casamento, di cumo qui ocê casô, tudo isso dueu dimais. Fiquei sabeno que ocê num era filiz. A derradera nutíça qui tive, foi da sua viuvez. Mi faláro tamém qui ocê tava só, foi ai qui tive o sonho de ocê vortá. Tô quereno pur dimais ocê aqui. Criei corage. Num sei da dondi tô tirano corage pá ti iscrevé essa carta. Tomara Deus que quando ela chegá, ocê teja dizimpidida e cuncideri o meu pidido. Si ocê vié eu ia ficá filiz. Tô ti iscreveno essa carta, mais num sei cumo vô fazê pá ela chegá ai inté ocê. Na ora qui ocê lê a carta, e achá qui dá tempo da gente cumeçá, ocê vém logo. Vô tá ti isperano. Aqui as coisa mudô bastanti, só o camin é o mermo. Os rio secaro, as mata fôro levada pelo fogo, a chuva até qui vêi, mais foi pôca, num deu brota qui prestasse. Essas diferença ocê vai vê. Do povo daqui eu num tém muito o que falá, tô bem ritirado do cumérço. É quais treis légua. Fica custoso i inté lá, só na pricisão. Aqui restô pôca gente, os mais véi morrero quais tudo. Seu padrin, ocê alembra? Pois é, eli caiu infermo. Foi o úrtimo qui foi daqui. Era duença ruim. Sabe cumu é, remédio daqui só du mato, quem mió fazia tamém já morreu. Ai a dificulidade só omenta. Achu qui ele num dexô erdero. Mais erdero tamém pá quê? Só tinha um pedacim de terra bem fraca, quais qui só carrasco, a casa tá quais caino. Os mais moço num qué ficá, tá todo mundo ino imbora, tão ino atráz di miora. Dêxa eu ti falá só mais um negoço: quando ocê recebê essa carta, ocê pode vim, viu! Pur essas banda daqui, só tem eu pá contá a istóra. Já tô cansado, tô pricisano di uma cumpanhera, Eu têm mêdo de morrê aqui sozim, mais Deus á di mi protegê. Com ôce vino a minha vida vai inche de aligria e filicidade. Assim qui dé jeito eu mando nutíça. Vem logo, viu! Vô ficá aqui isperano pur ocê. Inté mar logo!

Seu eterno apaxonado!

Tonho de Dona Nem